O ataque a Wiriyamu, uma localidade da Província de Tete, em Moçambique, foi uma ação militar das forças portuguesas, perpetrada no dia 16 de dezembro de 1972, com o nome de código Operação Marosca, tendo morrido um número significativo de civis. Este episódio marcou a política externa da época, com a publicação da notícia no Jornal Britânico «The Times», na edição de 10 de julho de 1973, tendo, provocado alguma tensão no exterior mas também no interior do país. Para alguns, foi considerado o ato mais violento que tropas portuguesas terão efetuado no período da guerra de libertação das antigas províncias ultramarinas, designada em Portugal por «Guerra Colonial».
![](https://i0.wp.com/capeiaarraiana.pt/wp-content/uploads/2018/07/ajalcada_20180720_590x413_01.jpg?w=768&ssl=1)
Ao saber desta notícia não deixei de ficar perplexo. Todos sabemos que os conflitos armados não são complacentes, mas um ataque a populações civis, e ao que parece indefesas, levou-ma a investigar a notícia e procurar entender o que, na realidade, se terá passado naquele dia.
O principal aspeto que apurei é que não existe uma versão consensual sobre os acontecimentos, mantendo ainda hoje Portugal uma posição de não reconhecimento das atrocidades denunciadas pelo «The Times». No entanto, algo de grave se deve ter passado, ao ponto de ter sido discutido no Conselho de Ministros, de 18 de Agosto de 1974, após a Revolução dos Cravos, com base num relatório elaborado pelo Eng.º Jorge Jardim, personagem muito influente em Moçambique que defendia, desde o início dos anos 70, a autodeterminação dessa Província Ultramarina relativamente a Lisboa.
O relatório, muito bem fundamentado e com fotos, apontava atrocidades do Exercito Português, com a execução de população civil das povoações de Wiriyamu, Djemusse, Riachu, Juawu e Chaworha, confirmando desta forma a denúncia do sacerdote católico Adrian Hastings, missionário que residia no Uganda, que forneceu os dados para a publicação da notícia no «The Times».
O que parece ser certo é que toda a operação foi preparada pela PIDE com o objetivo de matar um influente resistente moçambicano que militava na FRELIMO e que, supostamente, estaria escondido na aldeia de Wiriyamo. Decorriam as obras da Barragem de Cahora Bassa e a atividade militar da FRELIMO crescia como intuito de dificultar a presença portuguesa naqueles territórios do interior moçambicano.
A notícia do «The Times» igualmente evidenciava os factos, descrevendo pormenorizadamente a violência cometida e indicando nomes de vítimas, referindo ainda que «…não há conhecimento de um episódio comparável na história do colonialismo em África no Sec.XX…». Refere igualmente que a violência surgiu quando se terá descoberto que as informações do paredeiro do suposto militante seriam falsas, não se tendo evidenciado a presença da resistência da FRELIMO naquela aldeia.
![Monumento de memória em Wiriamu - António José Alçada - Capeia Arraiana](https://i0.wp.com/capeiaarraiana.pt/wp-content/uploads/2018/07/ajalcada_20180720_590x413_02.jpg?resize=590%2C413&ssl=1)
Refere ainda a noticia que por incitação dos agentes da PIDE, o Exercito Português terá promovido um ataque generalizado a civis no designado Triângulo de Wiriyamu, que abrangia estas cinco povoações, levando a um elevado número de mortes.
Foi ainda levantada uma investigação pelo anterior regime, tendo inclusivamente o Presidente do Conselho Marcelo Caetano se deslocado a Londres, mas, na realidade consta que a PIDE tudo terá feito para a abortar a elaboração desse relatório, não existindo documentação acessível e validada.
Este episódio tem sido estudado e investigado por historiadores e jornalistas, não havendo um consenso sobre o que efetivamente se terá passado. Por exemplo, o Arcebispo de Dar-es-Salaam, o Cardeal Laurean Rugambwa, denunciou a falsidade desta operação militar, acusando que a FRELIMO terá promovido o massacre com o intuito de denegrir a imagem de Portugal junto da opinião pública internacional, o que na realidade aconteceu. A notícia foi publicada meses antes do 25 de Abril.
De facto os movimentos de libertação, tanto em Angola, Moçambique ou até Guiné, usaram a imprensa internacional como «arma de arremesso» contra o anterior regime. E muito provavelmente o recurso da comunicação social deveria ser mais eficaz que a própria luta armada no terreno.
Passados todos estes anos julgo que se deveria dar a conhecer o que na realidade se terá passado. A maioria das publicações e estudos são muito acusatórios e ainda «acalorados» e o facto de o nosso governo não reconhecer esta atrocidade seguramente é porque terá motivos fortes para não o fazer.
Como povo diz: «Não há fumo sem fogo.» Mas sinceramente gostaria de saber quem o ateou!
Covilhã, 10 de julho de 2018
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«No trilho das minhas memórias», ficção por António José Alçada
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Junho de 2017)
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A Guerra não tem explicações…tem implicações.
Caro Irmão Escuteiro.
Abrir…ainda mais feridas de Guerra, de um lado e do outro. Caro Alçada, sabes que estive na Guiné e havia crimes dos dois lados…
Tens razão meu irmão. Mas não achas que devemos marcar a história do passado? Saber se aconteceram estas atrocidades? E se sim porquê? Enfim, sem dúvida um assunto ainda polémico, mesmo a caminho dos 50! Abraço grande