Entre 1959 e 1960 a minha vida deu uma volta completa… Foram dois anos muito movimentados estes de 1959 e 1960. Até aí a vida corria calma para uma criança, de brincadeira, muitas vezes em casa do Zé Maria (por onde andarão os soldadinhos de chumbo que tanto nos encantavam…), outras vezes na rua.
Com, ainda, 4 anos a minha mãe mandou-me aprender a ler, escrever e fazer contas para casa do T’Zé Celorico, ali por trás da igreja. Éramos meia dúzia de garotos, sentados cada qual em seu banco que levávamos de casa, e a esposa do T’Zé era a nossa professora (um abraço ao ainda hoje meu grande amigo T’Zé Celorico e à sua filha que por lá andava, ainda não muito direita, durante essas aulas).
Para além disso lembro esse grande «Jazz Transcudano», onde o meu pai tocava trompete e cantava. Ia, curiosamente, ver os ensaios para os baixos da casa que fomos habitar em 1960 e ficava deliciado, com as pancadas do Alcino «Palhinhas», o clarinete de meu futuro tio Fausto «Cabrita», o saxofone do Fausto Baltazar, o violino(?) do sr. Carlos, irmão ou cunhado do sr. Martins fotógrafo e que esteve a trabalhar no Grémio da Lavoura uns tempos. Sei que havia mais músicos mas já não me lembro bem de quem eram (espero que alguém me avive a memória…).
Mas lembro, e com que orgulho e saudade, de ver o meu pai e o Jazz em cima de uma camioneta, dentro de uma gaiola amarela, com vistosos casacos azuis a descer a rua Principal num cortejo de oferendas.
Foi também em 1959 que entrei para a Escola, tendo como professora a D. Glória.
Na altura a D. Glória tinha na mesma sala do 1.º andar a 1.ª e a 2.ª classes, o que fez que, como eu já sabia quase tudo o que se ensinava na 1.ª, tenha integrado o grupo da 2.ª
Lembro a D. Glória e o seu filho deficiente com saudade, pois a essa grande senhora devo parte do que sou.
A entrada para a escola, para além de um marco na vida, trouxe-me também novos amigos.
Não podendo, como é natural, enumerar todos os que ainda hoje continuam amigos, identifico dois, corporizando neles todos esses companheiros de uma vida.
Falo do Zé Cipriano que me acompanhou e acompanho até hoje, numa amizade indestrutível.
Falo do Manel Nabais, outro dos amigos de sempre e para sempre (mesmo com a história saborosa que ele conta sobre escalfetas…).
1960 começa com a nossa mudança para a «nova» casa na «Vila», onde fomos ocupar o antigo Clube (seria bom que quem ainda conheceu o Clube nos trouxesse alguma dessa memória, pois era muito pequeno para me lembrar…).
Não podia falar de um mundo totalmente novo, pois aquela zona era-me familiar por ali viverem os meus avós e, portanto, ali ir desde muito cedo.
Os meus avós viveram primeiro mais à frente, nas escadas que estão ao fundo da rua D. Manuel I, tendo como vizinha a grande «Gé Bogas» (uma tia avó do coração), e a filha Celeste, outra amiga do coração, hoje casada com o Quim (que espero esteja a recuperar bem) e mãe da Júlia.
Quando mudei para a «Vila» já os meus avós viviam na casa ao lado e portanto foi uma integração fácil. Mais tarde voltarei a este «mundo» que era o pequeno largo que a rua D. Dinis ali faz.
Mas por estes anos, ou pouco depois, (pelo menos é assim que os lembro), duas coisas, cuja importância só mais tarde percebo, aconteceram no Sabugal.
A abertura do café Alto-Bar, que constituiu uma verdadeira revolução numa terra onde predominavam as tabernas e onde o único café, o do Sr. Abílio, tinha uma freguesia muito selecionada.
E, e esta ainda mais importante para mim, a chegada ao Sabugal da Biblioteca Itinerante da Gulbenkian, que me vai tornar num leitor compulsivo.
Data de 1960 a minha primeira paixão. Não me lembro do nome dela, pois saiu do Sabugal logo a seguir, mas a sua figura vestida de branco, cabelos loiros, ainda hoje é a única coisa que lembro da minha primeira comunhão!
Onde estiveres sabe que ainda me resta um pouco dessa paixão…
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ps. Se a vida mo permitir, espero ir amanhã, dia 20, dar um abraço ao «filho» do Sabugal, o cineasta e professor Joaquim Sapinho que apresenta no Centro de Arte Moderna da Gulbenkian «uma leitura pessoal sobre as coleções do Museu Gulbenkian».
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«Sabugal Melhor», opinião de Ramiro Matos
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Setembro de 2007)
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