Não há como o ambiente de aldeia para a criação de expressões e modos de falar específicos. Hoje trago-lhes mais algumas expressões que soam ou pelo menos soavam nas ruas da aldeia quando eram mais habitadas.
Recordo novamente alguns modos de conversar das nossas gentes. Algumas destas formas de falar, o leitor já as conhecerá, mas tenho a certeza de que hoje o vou apanhar de surpresa nalgumas esquinas…
Expressões populares
Por acaso, já alguma vez ouviu esta expressão: «Não batas mais no ceguinho»? Pois bem, isso, na minha terra, quer dizer que a pessoa que fala tem razão, mas que já está a exagerar na reclamação dessa razão.
Já ouviu dizer: «Hoje é um dia asselanado»? Sabe de onde vem? De solene. É um dia assolenado ou seja: bastante solene – apenas isso: uma pequena corruptela de pronúncia… mas até parece outra coisa mais distante do vernáculo.
Já ouviu a palavra «pernão»? Sabe o que significa? Aplica-se quando as coisas deviam estar aos pares mas por alguma razão só aparece uma: essa é «pernão».
Já lhe disseram… «para não fazer tanta cerimónia»? Percebeu? Isso quer dizer que alguém quer oferecer-lhe uma coisa, uma fruta, uma fatia de melancia e você a dizer que não, que não. Aí diz-se:
– Vá lá, aceite. Não faça cerimónia.
Ou então quando alguém não se faz rogado e aceita a fatia da melancia (eu sou assim), dizem que a pessoa não faz cerimónia nenhuma.
E quando alguém barafusta muito mas lhe passa logo, diz-se que é de «repentes» mas que lhe dá com força mas lhe passa logo.
E até havia um instrumento chamado «salazar»
Voltemos ao linguajar do dia-a-dia no Casteleiro.
Uma tronga é uma pessoa desarrumada e trapalhona, sem cabeça organizada.
– Aquilo é um bacalhau sueco.
Leia: é uma tronga e mal comportada, de má resposta e tudo.
Labrusco é sujo. Mas o tempo neste inverno tem estado muitas vezes labrusco, também.
Quando um tipo é atado, meio enrascado e fica atrapalhado sempre que é preciso fazer alguma coisa, diz-se assim:
– Aquilo, em tendo qualquer coisa que fazer, é logo uma serra!…
Moranhêro é esta atmosfera meio húmida e pouco chuvosa que tem estado em alguns destes dias:
– Ó rapaz’s, está cá um moranhêro!
Quando uma comida está muito boa, diz-se que está de estalo ou que está de trás da orelha.
Mas se está um daqueles dias maus a sério, com vento e chuva etc., então a frase mais apropriada é outra mais forte:
– Está cá um dia de capar cães…
E esta?
– Isto é que vão aqui uns lavarintos!
Lavarinto é muito que fazer e uma grande azáfama, com muitos pratos e alguidares ou seja lá o que for.
Os preparativos das filhós na noite de Natal são uns lavarintos valentes.
Sabem o que era um «salazar», no meu tempo de jovem adulto, julgo que depois de Salazar ter desaparecido? Era simplesmente o «rapa» que se usa para arrebanhar a farinha já amassada que ia ficando no alguidar, quando se estavam a fazer os bolos.
Dizem-me que se dizia isso por malandrice – e acredito.
Mais uma, só: alguém que quando faz qualquer coisa ou dá algo a uma pessoa nunca mais se cala que fez ou que deu, diz-se assim:
– Aquele, em fazendo alguma coisa, está sempre a arrefartar…
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«A Minha Aldeia», crónica de José Carlos Mendes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Janeiro de 2011)
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