Como a grande maioria dos quadrazenhos sem grandes terras que mantivessem uma família e ocupasse os seus membros no amanho daquelas, o Augusto, após ter acabado a escola, começa a calcorrear as veredas para Espanha, donde trazia a sua lata de azeite, uma boina, um frasco de Ceregumil, um saquito de pimentão e um ou dois pães de trigo, senão ainda algum corte de pana para umas calças ou casaco e um outro véu, se lho encomendassem.

Mais velho, aí pelos seus dezassete anos, já com corpo de homem, ensaia o carrego de café para lá e umas colchas, uns cortes de pana, sedas ou roupa interior de mulher para cá. Chegado aos vinte anos, vai à inspecção militar e fica apurado, pois aleijado não era ele, a Deus graças. No ano seguinte é incorporado numa unidade militar, não sei bem onde.
Que fosse quando estava num quartel em Lisboa ou que, saído da tropa, fosse procurar trabalho em Lisboa, certo dia o Augusto recebe uma carta da mãe, contando-lhe o que se havia passado na terra, cujas notícias eram sempre apreciadas pelos quadrazenhos, mesmo as mais correntes:
– A vaca da nossa Cucição já pariu! Cá me mandou os crostos. Mas no fez favor nenhum. Lá lhe mandei a massa do farrenheiro.
Regressado por uns dias à terra, a mãe do Agusto, ao ver o filho, desata a bradar em alta voz:
– Ai! Mê filho, mê Guto, mê caratle! Tens fome, filho? Tens fome?
– Na senhora, mãe! Inda trago vinte e cinco tostões! – respondeu-lhe o filho.
Pobre Guto! Haveria de falecer em França num desastre. Terra de ganha-pão a França, mas também terra de sepultura de muitos que sonharam em voltar ricos à terra. Destes, muitos regressaram ainda, mas de caixão. Paz às suas almas!
Notas:
Agusto – Augusto.
Caratle – carácter.
Cucição – Conceição.
Farrenheiro – farinheira.
Guto – diminutivo de Augusto.
Mê – meu.
Na senhora – não, senhora.
No – não.
Gosto muito das histórias que o senhor Franklin Costa Braga escreveu