Dois temas hoje: o ícone que o sino era na vida da aldeia há 50-60 anos atrás; e, na primeira parte desta crónica, licença para homenagear, recordando, a personalidade que foi Lucinda Pires, Professora, e sobretudo autarca da Freguesia e do Concelho, infelizmente desaparecida há 10 anos, nova demais para nos deixar.
Começo obviamente por registar os 10 anos de desaparecimento de Lucinda Gouveia Pires.
Quem não sabe quem era, pode ler-me… (Aqui.)
…e actualizar-se… (Aqui.)
De qualquer modo, e dado que a Lucindinha merece, transcrevo o seguinte: «Falar da Doutora Lucinda, ou melhor falar da Lucindinha, pois assim era tratada carinhosamente pelas muitas gentes do Casteleiro, é sempre difícil para mim. É que a Lucinda era uma pessoa acima da maioria dos mortais, era uma pessoa que, dentro da sua simplicidade aparente, tinha uma nobreza e carácter fora do comum. O que eu mais admirava nela era a sua vontade e prontidão em ajudar o próximo sem pedir nada em troca, era a sua luta constante pelo bem-estar dos amigos e pelo progresso da sua terra, o Casteleiro, e do concelho. Era sobretudo uma pessoa humanitária. A Lucinda deixou-nos muitas saudades e faz falta, principalmente às pessoas do Casteleiro e do concelho do Sabugal. Com pessoas como ela o nosso mundo seria muito melhor. Estou certo que ela continua a acompanhar os amigos».
Estas palavras bem justas são de José Freire, ex-Presidente da Câmara Municipal do Sabugal e que tão bem a conheceu.

Outro ícone da minha infância: o sino da aldeia
Chegou agora o momento de trazer aqui mais um ícone da minha meninice… O Sino.
O sino sempre comandou a vida na aldeia.
Todos os dias, de hora a hora, o sino dizia que horas eram. Toda a gente o ouvia em todo o lado: desde o Marneto até ao Chão da Estrada e à Várzea: todos o ouviam e era por ele que se orientavam.
Era o sino que tocava às Ave-Marias ao fim da tarde.
Era o sino que tocava para a missa todos os dias – e sobretudo ao domingo, dia em que tocava a primeia, a do meio e a última…
Todos os dias, todos os anos: dlão-daão, dlão-dlão…
Mas talvez a época mais marcada por esse papel do sino fossem os dias antes da Páscoa e o próprio di de Páscoa.
Ora leia o que há una anos publiquei aui mesmo, no «Capeia»: «A Sexta-Feira era o dia do grande silêncio na aldeia: o sino, que em todos os dias do ano marcava a vida rural dando horas para todo o espaço em volta até mais de um quilómetro ao redor, nesse dia calava-se e havia como que uma tristeza de toda a Natureza em torno do Casteleiro: era o dia em que Jesus morreu na Cruz. Era dia de não se rir nem mostrar satisfação com nada. Portanto, um dia único. Cristo morre às 15 horas. Era a hora de toda a gente estar na igreja a honrar esse momento. E as cerimónias eram feitas em grande sentido de compenetração. As caras andavam tristes nesse dia. Não se comia quase nada e muito menos chouriça ou outras carnes. Queijo e bacalhau ou peixe… e pouco. Era o tal dia em que à abstinência se juntava o jejum.
O sino não voltaria a tocar senão no sábado às 10 da manhã – e aí disparava a tocar sem parar horas e horas a fio. Era o Sábado de Aleluia. Voltava a alegria de ouvir o sino, de se poder comer, de se poder sorrir e rir à vontade.
Domingo era o dia de Páscoa, a Festa de Flores. Escusado será acrescentar que havia flores de toda a espécie por todo o lado. Um dia de alegria» – e o sino sempre a sublinhar a vida nova da aldeia.
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«A Minha Aldeia», crónica de José Carlos Mendes
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