Jaime Lopes Dias nasceu no então Vale de Lobo (hoje Vale da Senhora da Póvoa), concelho de Penamacor, em 25 de Outubro de 1890. O seu Pai, José Lopes Dias era natural da aldeia vizinha Benquerença e foi colocado como Professor de Instrução Primária no Vale de Lobo e aqui viveu toda a sua vida, tendo inclusive casado na Aldeia com Angélica Mendes. Tiveram cinco Filhos, todos rapazes.

Deveu-se à sua dinâmica a construção da nova Igreja, inaugurada em 1948, e o belo Chafariz em granito no centro da Aldeia.
Um dos filhos, Jaime dos Santos Lopes Dias, foi o que mais demonstrou afeição e grande amor pela Aldeia que o viu nascer. Tirou o Curso de Direito, mas a sua grande obra literária cingiu-se à Etnografia e à recolha metódica de Costumes, Artes e Hábitos, não só do Vale de Lobo como praticamente de toda a Beira Baixa. Por isso publicou, em 1962, a Etnografia das Beiras, uma obra entre dezenas de outras.
Em relação ao Vale de Lobo (assim se chamou até 1957) foi um grande benemérito da Aldeia. Como era Jurista da Câmara Municipal de Lisboa são incontáveis as pessoas da aldeia que tiveram o seu emprego naquele Município através dele. Neste aspecto funcionava em sintonia com o meu Avô, o Tenente Cameira, que se tornou o seu principal interlocutor na Aldeia. Enquanto que o meu Avô financiava os estudos de muitos jovens da aldeia (a grande maioria a fundo perdido), depois desses estudos o Doutor Jaime colocava-os na Câmara de Lisboa e nalguns casos era o outro irmão Médico que o fazia em Castelo Branco, sempre com a interferência desinteressada do meu Avô. Foi assim que houve um grande aumento da qualidade de vida na Aldeia, a par dos reflexos da Emigração para França nos anos 60.
O Doutor Jaime tinha na Aldeia um Lagar. Passava por ele quase toda a azeitona da aldeia e no Dia de Natal oferecia à população uma grande Festa dentro do seu Lagar com uma grande bacalhoada e as inevitáveis tabornas, as delícias de Jovens como eu.
Nas Janeiras o Povo ia saudá-lo na sua casa. Assisti sempre todos os anos. De cabeça descoberta e de capote vestido ouvia com profundo respeito as Mulheres da Aldeia a cantar enquanto algumas tocavam Adufes. Depois fazia distribuir castanhas assadas e jeropiga a todos.
Qual a influência do Doutor Jaime na minha pessoa? Grande. Enorme.
Eu era um jovem que nem 18 anos tinha e já lia as obras de Jorge Amado, guardadas em casa pelo meu tio António, irmão do meu Avô e estudante em Lisboa, apoiado por este.
A par da mensagem política que eu absorvia do Escritor Baiano, levava a segunda demão com o Dr Jaime, quando este convidava o meu Avô para os jantares e eu ia também.
Escutei muitas vezes durante os belos repastos as estórias políticas que o Doutor Jaime trazia de Lisboa, vivia-se então o salazarismo. Eu entendia a linguagem pois ela era parecida com as ideias escritas nos livros de Jorge Amado. O Doutor Jaime era, foi, um anti-salazarista convicto, sou testemunha disso!
Lembro-me perfeitamente de referir muitas vezes uma das maiores emoções da sua Vida – a Visita ao Brasil em 1954, onde fez uma Palestra de Carácter Histórico.
Além destas intervenções, o Dr Jaime fazia questão de falar durante os jantares de assuntos históricos do qual ele era estudioso: História, Arqueologia, Antropologia, Etnografia…
Foi essa outra grande influência sobre a minha pessoa que ainda hoje está refletida!
Num ano reprovei no 4.° ano do Liceu.
Nessas férias, num jantar em Agosto, o Doutor Jaime dedicou-me estes versos:
Estudante Marcante,
Chapéu de Alguidar
Por causa das moças
Não pode estudar!
Faleceu em Lisboa em 1977 e quis ser sepultado no seu já Vale da Senhora da Póvoa.

«Estórias de um filho de Vale de Lobo e da Moita», crónica de José Jorge Cameira
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