Franklim Costa Braga publica neste espaço, dedicado à sua terra natal, galramentos entre códrazenhos (conversas entre quadrazenhos), textos em Gíria Quadrazenha. Depois da publicação de diálogos entre conterrâneos, expõe agora algumas histórias em gíria da aldeia de Quadrazais.

6 – Lúzio d’alegrosa
– Zé, já t’carsiu o tocante à donena. No tardarse qu’o mercho se ponha à divinê na cangra. Tunhimos de maquinar pa êla porqu’hõinje é lúzio de Sant’Ófêmia.
– Os mandantes ‘stão de parabéns. Os dobrados penham muto gírios e a santerna penha muto baro infeiteda. Há-dem tunhir gasto baril galhal! O que valunhe é qu’havunhe muta genterna pa darsir doada e vão tirarsir gadé suficiente p’às custosas.
– Indê havunhe de sobrarsir.
– Tó Manel, atisquê qu’as custosas são mutês! Pó mercho de cá, pó mercho apregador, pá sonante, pós estoirantes, p’ás cheirosas e infeiturses, p’ás cunsartinês… Atisquê que no sobrarsirá muto!
– O pessoal é muto e darse baris doadas. Vraremos se sobrurse ó nentes.
– Vá, maquinemos!
(No lúzio segumpinte.)
– Atão, Zé, que me galras d’alegrosa?
– Tó Manel, g’starsi muto do apregador. Aquilo é que apregarsir cum’é dado!
– Mas o qu’é qu’acharsiste do que galrou?
– Lá o que galrou já moi esqueçunhiu. Agora que foi um sarmão de trás d’abano, isso foi!
– Atão e do resto?
– A sonante t’carsiu muto baro. Os estoirantes eram de estalo. O runfo presunhido d’onti à choinê pareçunhe que deitarsia tútio abaixo. Foi una pena tunhir deitarsido runfo ao coime do Calote. Foi um corropio de genterna com latosos d’ânsia p’apagarsir o runfo. Desalegremente ardunhiu tútio e a culmieirê vunhiu abaixo e co’êla o coberto.
O balho à choina penhou muto concorrunhido. Até indê balhei desagarrado.
– Já te pesarsiam as gâmbias!
– Oh! Indê darso baro ó pedal!
– Moi óvumpi a alvorada. A sonante t’carsiu muto baro e o runfo muto valente. Os estoirantes de reposta nunca mai pararsiam. S’os morteiros tunhissem monte roncos, deitarsiam tútio abaixo.
– Vamos atiscar amatriz a tourada! O Zé Marrão prometunhe brôcos baris.
– Esperarso que no havunha contras cum’ó qu’ aconteçunhiu havunhe rodas co’acabada do Manal.
– No havunhe de sunhir nejo, qu’a santerna havunhe de protegunhir noienes!
– É a alegrosa mai granjeirê daquêsta reta.
– Baro, só podunhimos compararsi-la co’a militarosa, im certa maneirê.
– Icho, mas aquêssa é mai pós manêgos solteiros, imbora seja tamém alegrosa pa tútios.
– Havunhe una defrença. Incanto na Sant’Ófêmia nenhuno trabuca, por sunhir pa tótios como lúzio santo, na militarosa só os quintos no trabucam.
– Tamém, com oitenos lúzios d’alegrosa, se nulo trabucasse, era um arrombo nos golpes de tútios. Havrariê ambre nos atros lúzios.
– Tamém podunhimos galrar qu’alegrosa do Esprito Santo se le podunhe compararsir!
– Natros reloijos, talvez. Mas hõinje já nentes. Q’antos soitenhos, malcatenhos ó valdespinheiros atisquês cá naquesse lúzio? Já muto pôcos. Até já acais no havunhe catroios pa exprumantar.
– Nem amassadores d’amendoernas.
– Aquisto tútio por casa d’ alegrosa da Senhora da Póba, qué no mesmerno lúzio.
– E tamém porqu’havunhe menos genterna im Códrazais. Os ambulantes e atros no vunhem a Códrazais como vunhem à Sant’Ófêmia.
– Vá lá qu’indê se labardeia! Havrará reloijo em que no havrará manêgos com pulso pa tal.
– Icho. É p’ciso baril pulso! É o mesmerno que pegarsir no guião granjeiro da Sant’Ófêmia. Q’ando havunhe Jão da ruê, no sunhem tótios qu’o segurarsissem.
– Tunhes certo. Já una vez mois se vunhiu e desejarsiu p’ó mantunhir d’reito. Pensarsi qu’iê caiumpir por ribê do andor. Tunhiram que m’ajudarsir a sigure-lo.
– O mesmerno aconteçunhiu a moienes co’a labarda granjeirê po Sant’Antonho. Caiumpiu no terrunho, que moienes no consegunhiu sigure-la.
– Poi moi nunc’exprumantei!
– Sunhem esquilonas de maquinar p’ó coime.
Tradução para Português corrente
6 – Dia de Festa
– Zé, já tocou o sino à segunda. Não tarda que o padre se ponha à missa na igreja. Temos de ir para ela porque hoje é dia de Santa Eufêmia.
– Os mordomos estão de parabéns. Os arcos estão muito bonitos e a santa está muito bem enfeitada. Hão-de ter gasto bom dinheiro. O que vale é que há muita gente para dar esmola e vão tirar dinheiro suficiente para as despesas.
– Ainda há-de sobrar.
– António Manuel, olha que as despesas são muitas! Para o padre de cá, para o padre pregador, para a banda da música, para os foguetes, para as flores e enfeites, para as concertinas… Olha que não sobrará muito.
– O pessoal é muito e dá boas esmolas. Veremos se sobra ou não…
– Vá, vamos lá.
(No dia seguinte).
– Então, José, que me contas da festa?
– António Manuel, gostei muito do pregador. Aquilo é que é pregar como deve ser!
– Mas, o que é que achaste do que disse?
– Lá o que disse já me esqueceu. Agora que foi um sermão de trás da orelha, isso foi.
– Então e do resto?
– A música tocou muito bem. Os foguetes eram de estalo. O fogo preso de ontem à noite parece que deitava tudo abaixo. Foi uma pena ter deitado fogo à casa do Calote. Foi um corropio de gente com cântaros de água para apagar o fogo. Infelizmente ardeu tudo e a cumeeira veio abaixo e com ela o telhado.
O baile à noite esteve muito concorrido. Até ainda dancei desagarrado.
– Já te pesavam as pernas!
– Oh! Ainda dou bem ao pedal!
– Eu ouvi a alvorada. A música tocou muito bem e o fogo muito forte. Os foguetes de resposta nunca mais paravam. Se os morteiros tivessem tantos tiros, deitavam tudo abaixo.
– Vamos ver amanhã a tourada! O José Marrão promete bons bois.
– Espero que não haja azares como o que aconteceu há anos com a morte do Manal.
– Não há-de ser nada, que a santa há-de proteger-nos.
– É a maior festa desta terra.
– Bem, só podemos compará-la com a Inspecção, em certa maneira.
– É verdade, mas essa é mais para os rapazes solteiros, embora seja também festa para todos.
– Há uma diferença. Enquanto na Santa Eufêmia ninguém trabalha, por ser para todos como dia santo, na Inspecção só os da mesma idade que vão à Inspecção não trabalham.
– Também, com oito dias de festa, se ninguém trabalhasse, era um arrombo nos bolsos de todos. Haveria fome nos outros dias.
– Também podemos dizer que a festa do Espírito Santo se lhe pode comparar!
– Noutros tempos, talvez. Mas hoje, já não. Quantos soitenhos, malcatenhos ou valedespinheiros vês cá nesse dia? Já muito poucos. Quase já não há cavalos para experimentar.
– Nem tabuleiros de amêndoas.
– Tudo isto por causa da festa da Senhora da Póvoa, que é no mesmo dia.
– E também porque há menos gente em Quadrazais. Os ambulantes e outros não vêm a Quadrazais como vêm à Santa Eufêmia.
– Vá lá que ainda se rodopiam as alabardas! Haverá tempo em que não haverá rapazes com pulso para tal.
– É verdade. É preciso bom pulso! É o mesmo que pegar no guião grande da Santa Eufêmia. Quando há vento, não são todos que o seguram.
– Tens razão. Já uma vez eu me vi e desejei para o manter direito. Pensei que ia cair por cima do andor. Tiveram que me ajudar a segurá-lo.
– O mesmo me aconteceu a mim com a alabarda maior pelo Santo António. Caiu no chão, que eu não consegui segurá-la.
– Pois eu nunca experimentei.
– São horas de ir para casa.
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