Já é suficientemente mau existirem subvenções vitalícias atribuídas nas condições lamentáveis que todos conhecemos e muitos criticamos. Agora os seus valores e titulares serem considerados secretos, parece-me um exagero e uma nítida afronta à generalidade dos cidadãos.
Já por diversas vezes me insurgi contra as leis que permitiram a atribuição das subvenções vitalícias a alguns políticos, apenas por terem sido políticos durante determinado período de tempo, por norma muito curto. Chegou a ser de 8 anos de serviço. Essa lei, a Lei 44/85 de 9 de Abril, abrangia também os juízes do Tribunal Constitucional que não fossem magistrados.
Mesmo aqui, no CA, já por diversas vezes abordei o tema, umas vezes de forma mais leve e outras mais incisiva, conforme o momento (aqui) e (aqui).
Essa lei permitia a atribuição da subvenção a partir dos 55 anos de idade calculada de determinada forma estabelecida no artº. 25º. e, curiosamente estabelecia igualmente que a quando o titular atingia os 60 anos de idade, essa subvenção duplicava.
Como já tive oportunidade de o dizer, essa norma foi revogada pelo Governo de José Sócrates. Mas, os direitos que tinham sido já constituídos mantinham-se intactos, podendo os seus titulares decidir quando os utilizavam. Isto é, a lei não permitia que se adquirissem novos direitos mas garantia os que já existiam, deixando para o agente a decisão sobre qual o momento para esse exercício.
Entretanto, durante o governo de Passos Coelho foi introduzida uma limitação ao valor dessas subvenções, fazendo-as inclusivamente depender da prova de que os beneficiários não possuíam outros recursos, de valor superior a 2000€.
Isto tudo já várias vezes falámos.
Isto tudo já é suficientemente mau para se continuar a falar.
Isto não merece que percamos mais tempo.
Quando a nossa predisposição é para não falar mais neste lamentável assunto, eis que somos brindados com intervenções dos beneficiários ou seus pares no sentido de corrigir situações no seu entender injustas.
Uma dessas situações foi o pedido de verificação da constitucionalidade daquela medida do governo de Passos Coelho que acima falei. E, pelos vistos, o Tribunal Constitucional considerou-a inconstitucional. Acto contínuo os beneficiários das subvenções terão de ser ressarcidos da totalidade dos respectivos valores independentemente de possuírem recursos ou não.
A última de todas, parece saída de um filme de espiões. As subvenções vitalícias não devem ser divulgadas, isto é são secretas. Mais uma vez, ouvida agora a CADA (Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos) pois argumentava-se com a violação de dados pessoais de cada um, aquela comissão entendeu não haver qualquer razão para que os dados não sejam divulgados publicamente.
O secretismo que os diferentes partidos com representação parlamentar têm vindo a defender e garantir numa coligação sui generis que abarca todo o espectro politico com excepção do Bloco de Esquerda é do pior que um regime democrático como o nosso pode ter.
Este entendimento parlamentar terá algo a ver com o facto de existirem beneficiários da subvenção vitalícia em todos os partidos com excepção do Bloco de Esquerda?
Então os nossos deputados, que todos nós elegemos, pretendem esconder de quem os elegeu o resultado da aplicação de uma lei anterior, naturalmente injusta, pois já foi revogada?
Os nossos deputados que formam a chamada casa da democracia, A Assembleia da República, têm comportamentos desta natureza?
Mas afinal qual é problema da divulgação dos titulares, e respectivos valores que recebem subvenções vitalícias? Tudo o que é pago pelo Estado, não pode ser secreto, pois a receita resulta dos impostos cobrados a todos os cidadãos. E se os cidadãos sustentam o Estado com as suas contribuições fiscais, então têm todo o direito de saber onde é gasto o dinheiro que eles pagaram.
É assim com a generalidade dos subsídios e pensões pagos pelo Estado, basta consultar uma vez em cada mês o diário da República para que toda a gente possa saber que pensões de aposentação foram atribuídas no mês anterior e quem são os respectivos titulares.
Não há assim qualquer justificação para que as subvenções não sejam públicas também. Tenham coragem, e deixem-se de rodeios, e mandem publicitar aquilo que por natureza devia desde o início ser público.
Com esta tentativa de secretismo, os nossos deputados só estão a criar a ideia nos cidadãos que afinal existem coisas secretas neste domínio. Pelo menos da suspeição de que algo não estará bem já não se livram e permanentemente será ampliada.
Senhores deputados:
Não nos obriguem a passar por mais esta vergonha de nos sentirmos culpados por vos termos elegido.
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«Do Côa ao Noémi», crónica de José Fernandes (Pailobo)
Obrigado Luis Pereira.
Por vezes, temos mesmo de falar para que os outros nos ouçam. Só que, muitas vezes eles são surdos!…
jf
Caro José Fernandes, parabéns por este acto de verdadeira Democracia. O problema reside na Democracia representativa, pois como refere, os que elegemos, pedras fundamentais do sistema, são os primeiros a mascarar o tema. Que os deputados eleitos pelas listas dos partidos do arco do poder o façam, embora reprovável, poderá ser entendível, agora os do PCP alinharem no embuste é que não se entende, ou será que depois dos financiamentos do BES, para o PCP tudo se resuma a uma questão de $$$.