Riqueza é, tal como o dicionário indica, sinónimo de abundância e opulência mas, podendo estar contida noutras fontes, ela poderá ser bastante mais que isso.
Quero, desde já, alertar que não defendo aquela riqueza serôdia fundada na indigência sombreada de virtude. Longe de mim tal ideia.
Conheço, desde a infância, um aldeão, meu sadio amigo, que já ronda os oitenta. A muita idade e a árdua vida vivida não lhe conseguiram apagar do rosto um sorriso espontâneo. É querido e respeitado por todos os nascidos na pacata aldeia onde ambos viemos ao mundo.
Voltei a passar-lhe à porta há escassos dias. É uma casa granítica, tipicamente beirã, simples, bonita e completamente imune a modernices importadas. O meu velho amigo e a sua esposa são, agora, os únicos moradores, guardados a partir do pátio, por um corpulento cão de guarda, também já ancião. No seio deste lar foram nados e criados cinco cachopos e duas cachopas. Todos voaram, a seu tempo, para outras paragens em busca de vida mais satisfatória. Por lá viveram e aumentaram em muito a família.
Dei, de novo, com ele a pouco mais de meio da tarde, com dois cavacos ao colo e tive de enfrentar a sua insistência para entrar, para me aquecer à lareira, para comer uma bucha, para beber um copinho. Não resisti ao convite até porque, assim, matava saudades. Foi como quem mergulhasse no memorando da sua existência.
Entrei, então. Avisei que não poderia demorar nem quereria estorvar ao que me foi respondido que eu nunca incomodava. Transbordava o empenho em que me sentisse bem. Pedi, por favor, que não prosseguissem em pedidos de desculpas por eventuais insuficiências visto que isso me constrangia, quase me magoava.
Era hora da merenda e lá veio a mesa tão farta quanto sem surpresa. Mas, quando falo de farta não refiro qualquer ostentação.
Constatei, uma vez mais, a franqueza afável do velho pai e da velha mãe ainda autónomos apesar da idade. Um casal que criou sete filhos por entre espinhosos labores mas com um amor desmedido. Amor também semeado e expresso no coração dos filhos que, por ora, lhes criam os netos dando continuação a uma verdadeira história de superação.
Este casal possui tudo quanto precisa para ser verdadeiramente rico em qualidades, sentimentos e preceitos de vida. Extraio das suas vivências a essência do que poderá ser uma forma de genuína riqueza liberta de luxos e ostentações e, confesso, reputo de extraordinário este «viver» de forma inesgotável.
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«Terras do Jarmelo», crónica de Fernando Capelo
(Cronista no Capeia Arraiana desde Maio de 2011)
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Tem razão amigo JFernandes. Nas nossas terras sempre se manda entrar independentemente de quem bata. Não há maior prova de hospitalidade e franqueza.
Um abraço
Caro FCapelo:
Revejo, em cada gesto, em cada atitude, em cada palavra, destes dois beirões, com a cara esfriada pelo clima e o coração aquecido pela amor, e certamente a pele enrugada pelo tempo, milhares de outros da mesma zona e que tantas vezes repetiam e outros ainda repetem esta forma de estar.
Nas nossas terras as pessoas são mesmo assim.
Acrescentaria, se por acaso se tivesse batido á porta da casa, que a resposat seria certamente: Entre quem é.