Em 1901, Alberto Bessa publica o «Dicionário da Gíria Portuguesa», sem falar em Quadrazais. Apresenta muitos termos usados na Gíria de Quadrazais que ele considera linguagem de gatunos. Talvez seguisse a campanha contra Quadrazais na imprensa no primeiro quartel do séc. XX, de que nos dá conta Nuno de Montemor.

Muitos dos termos por ele apresentados são do domínio geral, que ele assinala com pop.=popular. Usa as abreviaturas: ant.=antigo, caído em desuso; gat.=calão de gatunos ou de criminosos; desc.=dele desconhecido; fad.=calão de fadistas do Bairro Alto, mas que colheu noutros, como Rafael Bluteau, Frei Monte Carmelo, Salema Garção ou J.M. Queirós Veloso. É o caso de belfo, bilhós, borga, candonga, chastre, chôcho (beijo), chochos (tremoços), gajo(a), justo, justa, laparoto, latim, manducar, mondongo (mandongo), piar, russo (burro), tipo, túrrio.
Iguais ou semelhantes à Gíria Quadrazenha (G. Q.) apresenta os seguintes:
Anaco – pedaço de qualquer coisa (Melgaço – mas carrego de fazenda na G. Q.).
Ancia – água (escrito ânsia na G. Q.).
Arcoso – anel (que ele anota ser linguagem de gatunos).
Arguino – pedreiro (gat. – arguina na G. Q.).
Artife – pão (desc.).
Badalo – língua (pop.).
Branquioso – branco (pop.) – açúcar na G. Q.
Briol – vinho (pop., sobretudo no Norte).
Calcante – pé (gat.).
Calcantes – sapatos.
Calcos – sapatos (gat.).
Cambalacho – conluio ilícito (pop.). Cambalache – negócio na G. Q.
Cantante – galo (gat.).
Cardenho – casa onde se reside (pop.).
Cascosa – castanha (gat.). Na G. Q. – batata, sendo cascosa do ar – castanha.
Casquete – chapéu velho de homem (pop.). Casqueta – boina na G. Q.
Catroio – porco (desc.). =cavalo na G. Q..
Chêta – 5 réis (pop.). Chete – vintém na G. Q..
Chêto – 20 réis (pop.).
Chiante – carro de bois (gat.). Charriante na G. Q..
Choina – noite (fad.).
Chôna – noite (desc. – Queirós).
Cosque – casa de habitação (ant.).
Dropa – pedra (gat.). Drepa na G. Q..
Esgueirar – fugir (gat).
Farpela – fato de vestir (pop. – manta para Salema Garção). =fazenda, roupa na G. Q..
Fusca – polícia (desc.- Salema).
Fusco – agente da polícia (desc.- Salema). =Guarda Fiscal na G.Q..
Gadé – boa fortuna (des. – Queirós). =dinheiro na G. Q..
Galdinas –calças (pop.). Galdrinas na G. Q..
Galrar – falar (pop.).
Gamarra – galinha (gat.). Usada na…
Gâmbias –pernas (pop.).
Gebo(a) – velho(a) (pop.).
Gelfo(a) – gebo(a) (pop.). Gilfo(a) – filho(a) na G. Q..
Gelfos – pai e mãe (desc. – Salema).
Gídio – belo, bom (desc. – Queirós). Gírio na G. Q..
Goivo(a) – noivo(a) (pop.). =velho(a) na G.Q..
Golpe – bolso (gat.).
Gomarra – galinha. Usado na…
Granjola – rapaz crescido (pop.). Granjeiro – grande, maior na G. Q..
Grilo – relógio (pop.).
Grode – caldo de tasca (pop.). Groio – caldo na G. Q..
Grunho – porco (gat.).
Guines – moeda de 5 réis (pop.). Guino – vintém na G. Q..
Lâmpio – azeite (ant.). Alâmpio na G. Q..
Largo – casaco (gat.).
Lísbia – cidade de Lisboa.
Lôdo – ouro (gat.). Adicar – calhar, namorar (ver na G. Q.).
Loira – libra (pop.).
Lupante – olho (gat.). Alipante na G. Q..
Luzio – olho (pop.).
Macalo – cavalo (desc. – Queirós).
Manéga – mulher de campo (ant.).
Maralha – multidão (ant.).
Masquir – comer (pop.). Muquir na G. Q..
Mata Grande – Lisboa (gat.). Mata Granja na G. Q..
Mata Linda – Coimbra (gat.). Mata Líria na G. Q..
Menez – qualquer homem (fad.). Manês na G. Q.
Moienes – eu (gat.).
Moncoso – lenço de assoar (pop.). =nariz na G.Q..
Moquideira – boca (gat.).
Moquir – mosquir – comer (pop.).
Munquir – comer (pop. Trás os Montes).
Naifa – navalha (fad.).
Naifada – navalhada (fad.).
Nentes – nada, cautela (gat.).
Nhúrrio – mau (desc. – Queirós).
Nhurro – falso (desc.- Queirós). =casmurro na G. Q..
Paivante – cigarro (pop.). =fumador na G. Q..
Paivo – cigarro.
Penante – chapéu (pop.). Pinante na G. Q.
Penar – namorar (fam.). Penhar na G. Q..
Penosa – galinha (pop.).
Pescar – ver (pop.).
Pildra – cama (fad.).
Respo – excremento (pop.). =cão na G. Q..
Reta – Terra (gat.).
Soquir – comer (gat.).
Tefe – tefe – com medo (pop.).
Tiras – tesouras (gat.). =calças na G.Q..
Toiene – tu (gat.).
Vagarosa – cadeia (gat.).
Xôna – noite (gat.).
Será que Rafael Bluteau, Monte Carmelo, Queirós Veloso e Alberto Bessa conheciam a Gíria Quadrazenha?
Sendo a castanha o alimento principal de Quadrazais durante séculos, depois substituído pela batata, é peculiar o facto de na Gíria Quadrazenha se usar cascosa para batata e cascosa do ar para castanha, quando em Alberto Bessa encontramos o termo cascosa para designar castanha.
O facto de Alberto Bessa já conhecer em 1901 o termo macalo, que também é registado por Albino Lapa em 1974, indica que já existia na G. Q. antes de 1901.
A expressão nentes e bórios da G. Q. não será: nentes, ibórios!? Ou seja: nentes (cautela!) ibórios! (vêm aí fulanos, pessoas).
Em 1926, José Leite de Vasconcelos recolheu termos de garotos do Porto, entre eles: grilo – relógio e penosa – galinha, que são iguais aos da G. Q..
Em 1938, Ary dos Santos publica o livro «Como Nascem, Como Vivem e Como Morrem os Criminosos» onde apresenta a sua gíria, que anotou desde 1926. Eis os termos iguais ou semelhantes aos da Gíria Quadrazenha:
Adicar – ver, observar.
Ancia – água, África.
Andantes – pés, pernas.
Arcoso, arcos – anel.
Ardosa – aguardente de figo.
Arguino – pedreiro.
Badalo – língua.
Baril – bom.
Briol – vinho.
Canga, cangra – igreja.
Cantante – galo, relógio.
Cardanho – casa.
Chantra – meretriz.
Charéu – um quartilho.
Cheta – antiga moeda de vintém.
Choina – cama, noite.
Cosque – casa.
Dropa – pedra (drepa na G.Q.).
Fanôa – peça de fazenda.
Francisco Paivo – cigarro.
Fujanta – espingarda (fuganta na G.Q.).
Fujante, fugante – revólver.
Gadé – dinheiro.
Galdrinas, galdras – calças, pernas.
Galrar – falar.
Gamarra, gomarra – galinha.
Gâmbias – pernas.
Gilfa – ladra de profissão.
Granje – grande.
Grepes – uvas.
Grilo – relógio de bolso.
Grode – caldo.
Grunho – porco.
Ibau, ébau – apoiado! calão comum.
Justo – colete.
Largo – casaco.
Larica – fome.
Limosa – camisa.
Lôdo – ouro.
Lupante – olho (alipante na G. Q.).
Luzio – olho, dia.
Manêgo(a) – homem, mulher.
Manez – homem.
Mata – cidade.
Mata Grande – Lisboa.
Mata Linda – Coimbra.
Moienes – eu.
Mois – eu.
Moquideira – boca.
Naifa – navalha.
Naifada – navalhada.
Nejos – não, nem.
Nentes – nada, cautela!
Paivante – cigarro.
Penante – chapéu.
Penosa – galinha.
Piar – beber.
Pildra – cama.
Saltante – cabra (coelho na G.Q.)..
Sarruca – medalha de corrente (corrente na G.Q.).
Soquir, suquir – comer.
Suquideiro – boca (no femin. na G. Q.)..
Tefe – medo.
Tefe-tefe – medo.
Terrosas – batatas.
Tiras – calças, tesouras.
Toiene – tu
Vagarosa – cadeia.
Xandra, chantra – meretriz.
A maioria dos termos usados no mundo do crime repete-se nos diversos autores que os recolheram. Como o contrabando era considerado crime, podem estes autores ter recolhido muitos desses termos na G. Q., a que chamaram termos do mundo do crime. Qual o papel do quadrazenho nestes termos do mundo do crime?
Muitos quadrazenhos passaram pelas prisões, a maioria por contrabandearem, mas outros por crimes de homicídio ou roubo. Nas prisões tiveram ocasião de divulgar os termos da sua gíria e receber outros. O problema é saber quais os originários da G. Q. e quais os que ela recebeu.
Leave a Reply