Numa altura em que se debatem soluções para o nosso concelho é importante ter uma leitura real e não romanceada da nossa realidade. Há coisas que não se podem esconder. Não são obras do ocaso. Semearam-se ventos e agora quem colhe as tempestades?
Nesta semana, o Gabinete de Estratégia e Estudos apresentou uma atualização dos indicadores sociais e de economia. O concelho do Sabugal apresenta uma população residente de 11.914 pessoas. No período de tempo de 1995 a 2013, o nosso concelho apresentou uma taxa negativa de crescimento médio anual da população de 1,6 por cento. Isto equivale dizer que estamos a perder população. Com um território de oitocentos e vinte e três quilómetros quadrados, a nossa densidade populacional aproxima-se a quinze habitantes por quilómetro quadrado. A população com mais de sessenta e cinco anos representa já quarenta por cento da população residente. Ou seja, por cada dez residentes, quatro têm mais de sessenta e cinco anos. Isto é preocupante, sabendo que por cada mil residentes nascem apenas quatro crianças. E falando de juventude, a percentagem dos alunos matriculados no secundário, face à população em idade normal de frequência desse ciclo é de apenas sessenta porcento, apresentando uma gritante disparidade para com os valores da nossa região e com os valores nacionais. Algo se está a fazer. Algo se está a fazer muito mal no combate ao abandono escolar no nosso concelho. É certo que são números. Mas estes números são pessoas, e estas estão a ser esquecidas por terras de cá.
O nosso município gastou em cultura e desporto uma média de sessenta e um euros por habitante, quando a média distrital duplica esses valores. Mal vai a nossa cultura. Enquanto em Portugal existiam em média quatro médicos por cada mil habitantes, no nosso concelho existia apenas um. Mas não pensemos que esta situação faz parte da nossa condição de interioridade. Na verdade as nossas médias concelhias apresentam deficit mesmo em relação a municípios que sofrem com a mesma interioridade.
De dois mil a dois mil e doze houve um significativo aumento de trabalhadores por conta de outrem a trabalhar no sector agrário. Esse aumento também é notório no sector dos serviços. O mais afetado foi o sector industrial, que diminuiu para metade a sua representatividade na contratação de trabalhadores. Isto revela a fragilização do papel da indústria do nosso concelho. Estamos perante uma tendência de trabalhadores de serviços e de agricultura. A indústria está esquecida e desprotegida das políticas nacionais e locais. A faixa etária dos quarenta aos cinquenta e quatro anos é a que mais sofre com o desemprego, sendo seguida, muito de perto, pela geração mais nova, dos vinte e cinco aos trinta e nove anos. A solução é mesmo seguir as pisadas dos que transpuseram um dia as fronteiras. E o silêncio continua nas nossas políticas nacionais e locais.
Mas as desigualdades não se ficam por aqui. Enquanto o ganho médio mensal de um empregado nestas terras é de setecentos e sessenta euros, o ganho médio no distrito é de mais de oitocentos euros e o nacional passa os mil euros.
A atividade de apoio social para pessoas idosas, com alojamento é a maior empregadora do concelho, sendo secundada pela construção, a confeção, a atividade de apoio social para pessoas idosas sem alojamento e em quinto lugar pela indústria do leite e derivados. A lista dos maiores empregadores do concelho engloba ainda a importância da escola e dos transportes.
Temos de salientar o papel determinante que a economia social solidária possui para a empregabilidade do nosso concelho e para a geração de riqueza. Sem as Misericórdias e demais IPSS, o nosso concelho estaria neste momento numa posição ainda mais difícil e à beira da rutura. Não se vê? Não se quer ver isso?
Para onde vamos? Não sabemos. Mas o nosso retrato é este. Sem artifícios. Onde os números são pessoas.
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«Desassossego», opinião de César Cruz
Desassossego. É o que deveriam ter os nossos representantes para inverter esta tendência. Os nossos eleitos deverão ficar desassossegados com esta excelente análise. Obrigado Dr César. Precisamos de análises palpáveis e isentas para boa reflexão.
Eu sabia algumas coisas, mas nunca julguei que fosse assim tão grave. Tinhamos 40 mil pessoas por volta de 1940! O que nos espera?
Seria muito bom que muitos lessem e compreendessem, este seu aprofundado estudo, César Cruz. Infelizmente isso não vai acontecer. Exactamente por razões de que fala no seu documento. É verdade o que diz! «Semeiam-se ventos, colhem-se tempestades». Pobre concelho, pobres pessoas, que estão entregues a quem não se preocupa com elas, mas apenas com os números que elas representam!…Obrigada pelo esforço!
Esta situação,penso eu,é por demais conhecida por todos aqueles que conhecem a região.O que no seu artigo se me afigura importante é o facto de ficar bem expressa pela força estatística dos números.Penso que a questão pelo menos este nível está definitivamente esclarecida..Sabemos também que não têm sido seguidas as políticas mais consentâneas com a gravidade da situação.
César :
O privado, o Estado, a competência governativa de todos os que chegarem ao poder, tanto da direita como da esquerda, e uma elevadíssima componente ética poderá fazer alguma coisa por nós.
António Emídio