Percorrer outra vez os locais mais próximos da minha meninice e trazer-lhe esta pasmaceira… a decisão não foi fácil. Comecei por considerar que isto não tinha qualquer interesse para si. Mas depois admiti que se não for eu a escrever isto e a rememorar estas terras ninguém mais o fará – e que talvez seja a única oportunidade de algumas destas palavras ficarem na rede para um dia… talvez… Por isso, e já que aqui chegou, peço-lhe que leia e que ajuíze por si mesmo.

Aviso prévio: Muitas palavras aparecem-lhe aqui com uma grafia esquisita. Estou a procurar imitar a sabedoria do meu Povo quando diz Marneto em vez de Marineto ou Antonho em vez de António, como sabe.
Sinto-me bem a prestar esta homenagem gráfica à pronúncia popular. Nada de artificial em mim: tenho um gosto especial em conseguir transmitir a terceiros os sons da minha meninice.
Assim, vou viajar, que é esse o meu projecto para esta cronicazinha. Porque hoje apeteceu-me ir até à Serra e ao Marneto, à Várzea ou à Azenha. São as «terras da minha família» em três sentidos:
1.º quando eu ia e com quem para os terrenos que a família cultivava – e quais eram esses terrenos (os «tchões» como se diz lá);
2.º as terras à volta da minha aldeia para onde ia e porquê;
3.º as terras onde habitou a minha família e onde portanto eu morei também, ainda que de forma pouco contínua, uma vez que era só nas férias escolares…
Portanto, uma viagem longa e diversificada.

As terras onde morei
Primeiro, as terras onde morei em criança e jovenzito, por arrastamento: as localidades onde a minha família morou. Há que dizer que foi quase sempre no Casteleiro. Mas não só…
Por períodos mais longos ou mais curtos, a verdade é que várias terras nos tiveram lá a morar.
Antes de eu nascer, coisa que tantas vezes ouvi que nem sei se mesmo já depois de ter nascido… «morámos» em Santo Estêvão.
E também, já com uns anitos: no Fundão e no Sabugal, aqui perto. Não tenho muitas referências de qualquer destes casos, que sempre considerei transitórios.
Mas, ali pelos meus 8 a 10 anos, os meus pais moraram lá muito longe: em Alforgemel, anexa da freguesia de Almoster, concelho de Santarém. Aí, pensei que os meus pais iam ficar por lá muito tempo – isso é verdade. Mas não foi assim: apenas uns três anitos, mais ou menos.

As terras onde mais ia em pequeno
Por ter lá família, de vez em quando ia à Azenha. Mas ia muito mais a
Santo Amaro. E mesmo à Serra da Pena, por motivos de turismo rural infantil, claro. Embora nos primeiros tempos lá tenha ido com o meu pai que me contava como tinha sido o primeiro desmantelamento do hotel termal de luxo feito pelo célebre eng.º Elias pois o patrão não lhe tinha pago – e ele pagou-se a sim mesmo.
Ia bastantes vezes à Quarta Feira, sei lá porquê e até me lembro que a aldeia tinha (não sei se ainda terá) um rego de água a correr pela povoação abaixo e que seria para as pessoas regarem os terrenos cada uma de sua vez…
Ia muito ao Terreiro das Bruxas e a Santo Estêvão ou ao Sabugal, claro e pelas mais diversas razões. Mas ia pouco à Moita.
À Catraia, a Sortelha ou a Caria, era muito frequente ir, tal como à Estação de Belmonte e à Vila de Belmonte também.
De caminho, ia-se ao Carvalhal ou por lá se passava – tal como pelas Inguias.
Íamos à Benquerença, ao Vale de Lobo e à Meimoa (estranhamente, Meimão, não ou pouco).

Os tchões onde eu ia
As pessoas do Casteleiro, e quase só essas, vão saber muito bem de que terrenos de cultivo vou falar. Cada família lá tinha os seus bocados que tratava aqui, ali e acolá. Eu vou recordar – digamos que para memória futura, se a houver… – os locais para onde ia em matéria de acompanhamento da família, quando eles iam tratar os seus terrenos (os tchões), e eu, para não ficar só na vadiagem a fazer canais no Olival atrás da minha casa e atrás da casa do Sr. Zé Mòrinha – no exacto local onde hoje fica o Largo do Emigrante, onde agora se fazem as Festas.
Então onde é que eu ia então com a família?
Ia ao Caramelo e ao Marneto com os meus avós paternos e com o meus tios (não muitas vezes).
Ia com os meus padrinhos-avós (sobretudo o meu padrinho, o Ti Luís Gouveia) ao tchão da R’bêra, à Estrada e a Cantragalo. Passava muitas vezes pelas Cruzes do Ti Antonh’ Jaquim (Cameira) – e, sozinho ou acompanhado ia ter com ele mas sobretudo, depois de ele morrer, ia ter com o Primo Jaquim Àgusto, filho do Ti Antonho Jaquim, à Várzea. Ia de bicicleta. E, com os meus tios maternos, ia muitas vezes ter com a mesma malta a Gralhais, perto do Anascer, e ali meso à beirinha dos Três Povos e da Benquerença.
Às vezes, se não tinha escola, para se poder sair de manhã bem cedo, nem ia dormir a minha casa: dormia ali na palheira, onde havia uma cama comum muito engraçada: era a tarimba. Cheirava a bosta e ao resto quanto bastasse, porque ali era a casa das vacas e era ali mesmo que faziam todas as suas necessidades naturais… Mas era um cheiro agradável, macio, que ainda hoje está gravado nom meu cérebro: não era agressivo nem incomodava muito: acho que a gente se habituava e aquilo tinha até um certo ar de desafio à Natureza… sei lá…
Que tempos mais animados, aqueles!

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Notas
1 – Agradeço as fotos a Roberto Alfaiate Pinheiro, membro do nosso Grupo dos Descendentes e seu Administrador.
2 – Repito o apelo: visite e faça-se membro desse magnífico Grupo do «Facebook» chamado «Descendentes do Concelho do Sabugal». Já somos quase seis mil Membros: descendentes e amigos. É… (Aqui.)
3 – Como costumo aconselhar, volto a sugerir que consulte todos os dias ‘o’ «Serra d’Opa», gazeta regional, no Facebook… (Aqui.)
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«A Minha Aldeia», crónica de José Carlos Mendes
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