Depois de semanas, em que os casos de justiça se sucederam, é tempo de fazer um balanço. É tempo de voltar à política. Deixando a justiça fazer o seu trabalho. Exigindo-lhe que o faça bem e célere, de preferência. Mesmo que os meios de comunicação social continuem a arrastar o assunto Sócrates.
Aconteceram, em simultâneo, com todos estes casos, manifestações politicas a ter em conta. A Convenção do Bloco de Esquerda (BE), o Congresso do Partido Socialista (PS) e outros, não tão mediáticos, mas relevantes.
O BE procurou, numa reunião magna, encontrar um modelo e um sistema político, que resolvesse o anterior embróglio de uma direcção bicéfala. Digo embróglio porque não funcionou. O BE tem vindo a perder eleitorado e, isso, deve-se muito ao modelo de direcção. As divisões internas, que sempre foram patentes e até lhe dava uma certa diferença em relação aos outros partidos, tornou-se indisfarçável. A saída do movimento, em definitivo, ou de cena, de certas figuras marcantes, está a devolver o BE a uma amálgama de tendências. O modelo encontrado, após a Convenção, mostra a indefinição em que se encontra, a figura de porta-voz, encontrada para Catarina Martins, é, no mínimo, estranha. O BE parece estar a caminhar para o seu desmembramento.
O Congresso do PS veio confirmar duas coisas. Não sendo um congresso electivo, o líder já estava escolhido, este congresso era a oportunidade para o PS mostrar a sua coesão. Era preciso mostrar que a cisão entre Costa e Seguro estava sanada. Para mais, o caso Sócrates acabava de acontecer.
Portanto, era fundamental demonstrar um partido focado no essencial, a política e, concretamente, as legislativas do próximo ano. A outra confirmação era a de que, não ia sair dali nenhum programa eleitoral, nenhum debate substancial de política. António Costa, fez um discurso centrado nessa coesão do partido, na oposição ao governo e em algumas ideias que já se encontravam no documento Agenda para a Década. Alguns analistas acrescentaram que Costa, e o PS, fizeram uma viragem à esquerda. É natural. Não é o PS um partido de esquerda? Não é o PS oposição à actual maioria de direita? Portanto, é a esquerda o espaço natural do PS. É o socialismo, no sentido humanista, democrático, a matriz do PS. Se assim é, não percebi o alarido pelo discurso de Costa. É verdade que não foi aí que Costa desvendou o seu programa, pode ser acusado por isso. Mas a verdade é que se sabia que não o faria. Nem fazia sentido que o fizesse. Alguém vai para um jogo e mostra as cartas antes?
Por estes dias, também Marinho e Pinto, formalizou o seu novo partido, o PRD (Partido Republicano Democrático). O discurso, não sei se o programa, é o do anti-político. Os outros. Contra os partidos. Os outros, claro.
Mas falando de política, uma notícia esta semana, com fonte no INE, revelava que os portugueses casam-se e divorciam-se menos, estão mais pobres, mais velhos e menos, e têm menos filhos. Parecendo uma notícia banal, ela é relevante. É a demonstração da falência das políticas e da política. Se a política é a arte da gestão da «coisa pública», torna-se, no essencial, o bem de todos. Se a tendência da sociedade portuguesa é esta, temos que concluir que, a política e, concretamente, os políticos estão a falhar. Outro factor da falência e a falta de esperança é demonstrado pelos resultados do Barómetro EPIS Educação 2014. Os jovens que pretendem ficar só com o 12.º ano está a aumentar. Reflecte que, a não ida para a universidade, traduz a descrença na possibilidade de uma melhor vida com formação superior. É uma alteração de paradigma. Mas não espanta. Afinal, muitos dos que partem são licenciados e uma grande fatia dos desempregados jovens possuem formação superior.
Se a tudo isto a política não der resposta, então, o sistema político falhou. E este falhanço pode ser traduzido como a falência da própria democracia.
p.s. Interessante. O PSD vê na detenção de Sócrates a salvação para as legislativas do próximo ano. Por aqui se vê como é elevado o debate político e substancial. Esquecem-se é de que, quando se aponta um dedo, os outros dedos ficam apontados para nós!
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«A Quinta Quina», opinião de Fernando Lopes
“Alguns analistas acrescentaram que Costa, e o PS, fizeram uma viragem à esquerda. É natural.”- Pois é, se fosse de esquerda quem tinha que dizer que fez uma viragem à esquerda?O PS tem demonstrado , desde há largos anos, não ser carne , nem peixe, mas tender mais para a direita. Eu, que me considero de esquerda, nunca poderia ser do PS. Discordo com quase tudo o que o PS apresenta. O PS é a favor de tudo o que é da direita (Tratado Orçamental, pagamento da dívida ilegítima, nacionalizou os prejuízos do BPN, já para não falar na Educação onde, tudo o que está agora a acontecer, foi por ele iniciado). Uma ou outra política fracturante , tipo casamentos de homossexuais, nem aquecem , nem arrefecem, para quem (como eu) acha isso uma coisa trivial, que só diz respeito às pessoas que praticam. É preciso ser de esquerda, não basta dizer que se é. Ser de esquerda implica ruptura, coisa que o PS não fez, nem nunca fará. Quanto ao se ser democrático, eu considero-me tão democrático como qualquer um do PS. Nenhum é mais isso do que eu sou.