Escrever na pedra? Uma coisa destas em crónica de férias? Parece coisa séria e muito pesada, cientificamente. E tudo isso no Casteleiro? No fim de Agosto estar a falar de matérias pesadas? Isso é indigesto, meu caro… Parece. Mas, não. Não é. Não se engane: não se trata de qualquer descoberta de rochas com inscrições antigas – que as deve haver ali pelos montes, quase de certeza… Continue a ler e… tenha um bom dia também.

Até é capaz de haver essas tais inscrições em línguas alatinadas de épocas recuadas, sim. Um dia, se calhar, falarei disso: como é que se fazem escavações por todo o lado à procura e aqui, onde temos a certeza (até lhe chamaram Sortelha Velha, inapropriadamente) aqui onde, de certeza, houve essas coisas antigas, ninguém promove umas escavaçõezinhas para se saber o que foi, o que houve, o que restou??
Haverá nesta nossa zona inscrições na pedra, sim. Mas quem as procuraria? Quem investigaria? Quem faria as escavações arqueológicas?
Mas esta crónica não é sobre isso. Não. Não é nada disso. Hoje apenas vou escrever umas frases para recordar a minha escola, a escola do meu tempo e alguns dos nossos materiais escolares. Calha bem em termos de calendário: é a altura de comprar o material para os miúdos levarem para a escola. Não há é miúdos, é verdade… Coisas leves – tempo de calor, de férias para muitos, de preguicite aguda para todos… Tenha um bom dia.
A pedra da escola
No tempo em que eu andei na escola, livros era um para cada classe, mais a tabuada de sempre, mais um cadernito. E a eterna pedra. A ardósia, não sei se está a ver… A pedra era assim uma lasca de ardósia preta. Nem sei se há de outras cores, creio que não. Até podia ir ver à net, mas vou fazer jus ao que escrevi: é tempo de preguicite aguda, não é? Então se tiverem interesse, vão lá vocês e vejam… Não resisti e acabo por colocar a coisa na busca. OK. Mas não leio, leia você… (Aqui.)

Volto à pedra da escola. Era então uma pranchazinha desse material sagrado, rodeado de um aro em madeira de uns dois a três centímetros, muito bem feitinho, muito esbranquiçado-amarelado. Parece que estou a vê-lo. Uma decoração muito característica. Isso, era a pedra. Mas a pedra sem o principal não dava para nada.
Era preciso escrever na pedra. Para isso, havia então a pena. Tal como para escrever no quadro da escola havia o giz.
A pena era do feitio – digamos, para os mais novos poderem imaginar – do feito de um lápis, mas em redondo, cinza muito escuro.
Agora, um pouco de filosofia, de mastigação do pensamento. De repente, no meu cérebro formula-se uma questãozinha que parece de «lana caprina» (gostei desta) mas não é.
Repito: a pedra é preta. A pena é cinzenta escuríssima, quase preta.
E agora o milagre: como é que dois materiais tão escuros permitem que eu escreva e o que escrevo fique legível?
Pois bem, assim era.
A malta escrevia e a escrita não ficava preta. Ficava cinzenta esbranquiçada, quase branca. Deve ser daí que vem aquele ditado que acabo de inventar: preto com preto dá branco.
Se não acredita, faça a experiência: pinte uma parede de preto, depois em cima volte a pintar ou escreva outra vez a preto. Era assim na escola dantes. Mas a escrita ficava muito bem legível. A letra era branca, muito agradável.
Menos agradável era o pó de quando se apagava: ou com pano molhado ou com o dedo com saliva (porcaria!). Assim era, escrevíamos na pedra. Ficou-nos o jeito do século VIII antes de Cristo…
Ah! E acabo de saber que a pena custava um tostão. Vá lá. Mas partiam-se tanto. Seriam feitas na China, já nesse tempo sem ofensa para os bons materiais chineses – mas claro que estou a falar das traficâncias actuais que por aí grassam.

Escrever na pedra – era assim a minha escola
Quem me dera voltar lá… Até há quem ponha a hipótese. Há quem pense que gravuras do Côa eram de escola antiga. Veja… (Aqui.)
Mas isso não me convence. A sério. Isso parece apenas especulação infundada – desculpem os autores do raciocínio. Mas lá que de um ponto de vista apenas cénico é tentador comparar essa montra com o quadro da escola ou com a ardósia onde eu escrevia – lá isso é, sim, senhores. Mas só isso: o cenário. Apenas isso, provavelmente.
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Nota
«Serra d’ Opa», gazeta regional. As notícias de cada dia relativas à nossa zona toda, aqui e ali. Para ter acesso siga este link… (Aqui.)
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«A Minha Aldeia», crónica de José Carlos Mendes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Janeiro de 2011)
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