O bem não será aquilo que promove o ser humano, um valor universal? A falência da ética socioeconómica revela-se na inversão dos valores.

O imaginário da nossa infância conduz-nos continuamente a lutas fratricidas. Aliás, o bem e o mal não serão irmãos? Opostos que nasceram no mesmo berço, tal como os conceitos básicos do taoismo, o Yin e Yang, que expõem a dualidade de tudo o que existe no universo. Bem e mal são apenas lados de uma mesma balança.
Dizer que um banco novo é bom ou que é mau parece um conceito contranatura. Ouvia há dias, nas notícias, pessoas anónimas. Multidões. Diziam que não estavam preocupadas com a situação destes bancos bons e maus. E porquê? Porque as suas contas estavam cheias de vazios… Quem ganhou com os bancos maus que foram criados hoje e ontem? Quem ganha com aquilo que dizem ser um banco bom? Os anónimos sabem o que seria bom. Bom seria ter um emprego, patrões que respeitassem as leis laborais e acima de tudo a dignidade do trabalhador. Bom seria ter com que alimentar uma família. As assimetrias económicas e sociais tendem a agudizar-se entre nós… a desigualdade de oportunidades é promíscua… o tráfico de influências sectoriza-se… e os bancos são dos mais ricos (os bons) e os pobres lutam por alguns cêntimos (maus).
Parece uma luta desigual entre o bem e o mal. Nesta história de bancos surgiu uma divisão para sanar guerras económicas. Contudo foi esquecido o momento de curar os mutilados de uma guerra que não sendo sua, sofrem diariamente com ela.
Em tempos de crise, mais do que nunca, os conceitos de bem e de mal perderam sua essência universal entre os homens e a sociedade. Nietzsche, na sua obra «Para além de bem e de mal», refere que não há nada que garanta que algo seja uma bondade ou uma maldade em si, sem antes haver um conflito de interesses. Ou seja, o bem e mal não seriam nada de absoluto, de universal. Seriam relativos, a cada pessoa. Daqui surge a crise de identidade, ou daquilo a que se designa, «crise de valores», pois estes perderam a referência universal e passaram a ser subjetivos.
E assim andamos nós… Sem referências… sem valores absolutos, onde a dignidade da pessoa humana deveria ser um valor supremo. E assim vamos designando impunemente de «bom» a bancos maus ou ainda pior, compactuamos com uma economia que dilacera cada vez mais a pessoa humana.
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«Desassossego», opinião de César Cruz
César:
Um comentário completo a este artigo obrigava a que se escrevesse um livro, a profundidade dele, aliás, de todos os seus artigos, a isso levava, fico só por isto :
Valores: este moderno sistema de valores está a transformar o homem numa máquina calculadora e obriga-o a não conhecer outros senão os da rentabilidade e do lucro, do egoísmo e da má ambição. Tudo comandado pelo « business corporation ». É esta inversão de valores que faz com que o homem se sinta profundamente infeliz.
Desigualdade de oportunidades : o actual sistema diz-nos que vivemos num El Dorado em relação à « igualdade de oportunidades » e quem se queixa e está insatisfeito a culpa é dele próprio…
Relativismo : o relativismo nasce como reacção ao dogmatismo religioso e ideológico, mas é uma falsa reacção. Não admitir nenhuma verdade é outro dogmatismo.
César, creio que o senhor segue os ensinamentos desse Grande Guia da Humanidade que foi Cristo, e também os dos outros guias, portanto deixe-me dizer-lhe o seguinte : quem assume o caminho da verdade, da justiça e do bem, corre o risco de ser incompreendido, obrigando a viver na solidão, num exílio interior, S.João da Cruz chamava-lhe « a noite escura da alma ». Este é o preço por ser fiel à própria consciência.