Dizem-nos que no 10 de Junho, ainda feriado nacional, se comemora o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas. Pois bem, eu vivi-o com parte da minha comunidade de Aldeia de Joanes, graças aos esforços de Higino da Serra Cruz, que anualmente organiza duas excursões – a primeira no meio do mês de Junho e a segunda para participar na Grande Família Franciscana em Fátima, no primeiro fim-de-semana de Outubro.

Desta vez escolheu-se uma visita cultural ao Jardim da Paz Buddhaeden, na Quinta dos Loridos (Bombarral), com deslocações a Óbidos e Caldas da Rainha. Dia 10 de Junho de manhã, lá fomos nós.
Ao mesmo tempo, na cidade da Guarda, com pompa, circunstância e muita despesa do erário público, celebrava-se o 10 de Junho político. À saída do Fundão a Banda da Força Aérea deixa um hotel e, já na A23, estranhei o número de carros militares e de forças de segurança que se cruzaram connosco. Pensei que talvez fossem derrubar os pórticos das portagens ou proclamar a independência da Cova da Beira.
Parámos na estação de serviço de Abrantes e o primeiro sinal de vivência de comunidade é a partilha das merendas com o lema «traz a tua e serve-te das outras». Uma excursão, da Estremadura de Espanha, admirou uma cesta de cerejas do Fundão. O proprietário distribuiu uma parte aos turistas espanhóis; ao saboreá-las disseram que são as melhores do mundo.
Mais autocarros chegaram com centenas de crianças a caminho de Fátima, para participar na Peregrinação Nacional das Crianças de quase todas as paróquias de Portugal.
Às nove e meia da manhã, estávamos na primeira etapa do nosso passeio comunitário. Durante duas horas, visitámos o Paraíso da Paz, situado numas colinas verdejantes, rodeado de vinhas bem alinhadas, a fazer inveja a um desfile militar, e de muitas árvores de fruto, principalmente pereiras.
Ali observámos inúmeras estátuas, budas, pagodes, setecentos militares chineses, lagos, jardins, um ambiente bucólico que não se esquece com facilidade,
Estava neste cenário de tranquilidade e beleza natural, quando recebi uma mensagem no telemóvel: «Cavaco sente-se mal a meio do discurso do 10 de Junho.» Com mil diabos, o que teria acontecido? Ainda comentei a notícia, mas verifiquei total indiferença para com o caso. Das bandas do Sado, recebi uma chamada telefónica: «O nosso maior desmaiou, mas não chegou a cair da cadeira, como o outro maior. A Nossa Senhora de Fátima está com o Presidente da República.» Como estávamos a festejar o Dia de Camões, lembrei-me dos Lusíadas: «Um fraco rei, faz fraco um povo.»
No seguimento de uma caminhada, saboreámos um tonificante Moscatel de Setúbal. Partilhado o farnel num Parque de Merendas, abençoado pelo Santuário do Senhor Jesus dos Aflitos, partimos para Óbidos, a capital do festival do chocolate, uma das sete maravilhas de Portugal quando se é comedido na boca e se evitam descargas indesejáveis de «ouro preto».
Tem na zona antiga a presença do Gótico, do Renascimento e do Barroco, arte talhada ao longo de muitos séculos.
Escutámos diversos idiomas estrangeiros e tornou-se evidente que estávamos perto do Castelo. Olhámos com tristeza para o interior do monumento, repleto de barracas de madeira com um péssimo gosto. Nada que uma boa ginjinha não tenha logo apagado este triste cenário.
Seguimos para as Caldas da Rainha, onde ainda tivemos tempo para visitar o Museu José Malhoa e ver algumas imagens em vídeo dos intervenientes da Paixão de Cristo, pinturas de grande qualidade da Procissão, do Julgamento do Marquês de Pombal e tantos outros episódios nossos conhecidos. Numa sala ao lado, encontrámos uma exposição, muito específica, sobre a simbologia da natureza na arte cristã dos séculos XVII-XVIII. Estas obras de «corpos celestes, fauna e flora» em suportes de madeira, metal, tecido ou papel são documentos curiosos da nossa identidade cultural, artística e religiosa.
Preparámos o regresso à beira, mas não se pode sair das Caldas da Rainha sem a aquisição de uma peça de porcelana, com uma apresentação bem vernácula. Quanto a doces, levas sempre cavacas e beijinhos.
Seguimos o caminho ascendente e voltámos ao ponto de saída. Quando entrámos na A1 e A23, nunca vimos tantos carros oficiais de alta gama – Mercedes, BMW, Audi – quase todos de cor preta, «perseguidos» por carros da polícia, seus lampiões e motards. Entre um Carnaval de eminências pardas e um filme de gangsters, escolha o meu amigo leitor.
«Nunca tanto ovo dourado entrou no ninho da cotovia», disse um amigo perto da Lardosa.
Por indicações das normas da União Europeia, às 20 horas os motoristas destas excursões já não têm autorização para conduzir. Assim se cumpriu, chegámos felizes e deitámo-nos todos cedinho.
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«Aldeia de Joanes», crónica de António Alves Fernandes
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