Sete semanas após a primeira Lua Nova da Primavera, tem lugar no Vale da Senhora da Póvoa, a romaria em louvor da Santa que mais tarde haveria de emprestar seu nome à terra que a acolheu, aquando da sua aparição.
![Senhora da Póvoa - Joaquim Gouveia - Capeia Arraiana](https://i0.wp.com/capeiaarraiana.pt/wp-content/uploads/2014/05/jg_20140530_550x413_01.jpg?resize=550%2C413&ssl=1)
Ai, viva a Senhora da Póvoa,
Ai, viva a velha! Viva a nova!
Nossa Senhora da Póvoa,
Quem te varreu o terreiro,
Foi o rancho do Casteleiro,
Com um raminho de loureiro.
Ai, viva a Senhora da Póvoa,
Ai, viva a velha! Viva a nova!
A manhã ainda vinha longe, mas o alvoroço na aldeia já era grande. Nas ruas, os carros de bois, bem engalanados, recebiam os últimos retoques: arcos enfeitados de flores serviam de suporte às mais bonitas colchas de seda – afinal era de festa, não uma festa qualquer! Sem dúvida que a Senhora da Póvoa era, sem dúvida, aquela que reunia mais devotos das gentes vizinhas da Serra d’Opa.
A criançada, de cabelinho cortado de véspera, exibia os seus melhores trajes: os rapazes, de calça de terylene muito bem vincadas e seguras por umas largas alças ou uns suspensórios elásticos, contracenavam com as raparigas, de vestidinho de chita ou saia à godé.
Enquanto os homens, de chapéu preto, de abas largas, «acomodavam» os animais, as mulheres, uma vez preparados os filhos, ultimavam os cestos com merenda, colocando a melhor toalha sobre os bolos «esquecidos» feitos de véspera, no forno do povo, sobre o olhar atento da Ti Maria Bárbura.
Pelo caminho, a melodia imposta pelas pesadas rodas dos carros de bois, era acompanhada pelos cantares dos romeiros que, serra a cima, faziam chegar as suas preces Àquela a quem, ainda hoje, confiam as suas vidas, os seus animais… as suas produções.
Quando já se avistava o «terreiro da festa» os cantares subiam de tom e as preces, também: «Nossa Senhora da Póvoa/Já cá vamos ao cabeço/É o grupo do Casteleiro/Que quer rezar o terço.»
Uma vez chegados é imperioso ir visitar a imagem da Senhora da Póvoa e cumprir as promessas: pelo filho que está na guerra, pela grave doença que dizimar a vida do familiar querido… pelo vitelinho… e pelo bom ano de colheita, que impediu que a fome entrasse em casa.
De seguida, e depois de uma volta de joelhos à capela, com o terço numa mão e uma vela acesa, da sua altura, a Ti Ana dirigiu-se para a «casa das confissões», onde se preparou para assistir à missa e poder comungar.
Com as cerimónias religiosas a terminar e depois da procissão recolher à capelinha, a garotada só já queria aconchegar o estômago e ir, de fugida, para as diversões: o carrocel, o «homem da banha da cobra», as amêndoas, a santa de açúcar, o rajá, e os brinquedos que lotavam as tendas, constituíam a razão pela qual gostavam tanto da Senhora da Póvoa.
Já no regresso a casa, o Largo de São Francisco era local de paragem obrigatória para os ranchos e carros alegóricos que por ali passavam. Da concertina do Ti Luís Cunha da Quarta Feira saía, por vezes já com algum custo, as melodias populares que faziam a alegria de todos os romeiros.
Com a noite, a festa terminava e, com ela a Senhora da Póvoa despedia-se: «Até para o ano!»
Com o passar dos anos, já não há carros de bois, os trilhos da serra foram invadidos pelo mato selvagem, a criançada é cada vez em menor número e no largo já não se ouve o som a concertina…
Apesar disso, a romaria da Senhora da Póvoa continua a realizar-se sete semanas depois da Páscoa e a chamar a si milhares de forasteiros, agradecendo e pedindo as suas graças.
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«Viver Casteleiro», opinião de Joaquim Luís Gouveia
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