É incerto o lugar onde nos aguarda a morte querido(a) leitor(a), mas nós no entanto espera-mo-la em qualquer sítio.
Falar da morte é mórbido? Tétrico? Não, somos mortais no meio de mortais, a inevitabilidade da morte um dia atinge-nos. Este meu artigo foi inspirado num livro lançado há bem pouco tempo, cujo autor é António Fidalgo, professor da Universidade da Beira Interior.
No índice há uma parte que é – Da morte – e nessa parte do livro li isto: «Pode, é certo, a lembrança da morte ganhar contornos tétricos, enche-nos de temor e terror. Mas pode também e é isso que importa sublinhar, ser uma fonte de tranquilidade e paz. Passear por um cemitério, em particular por aqueles de árvores frondosas, é um bom exercício de vida. Ali jazem lado a lado, todos sem distinção (…) Eles já ali jazem, e nós lá iremos jazer.»
Ao ler esta passagem mais se acentuou em mim esta certeza, não sou um louco! Também passeio de vez em quando pelo cemitério da cidade (Sabugal). E porque passeio? Porque a verdade, a tal verdade que os relativistas dizem não existir, está ali, está ali o fim, vejo sepulturas de ricos e de pobres, de bons e de maus, de crianças e de velhos, de homens e de mulheres, todos igualados pela morte, não há diferença entre o jazigo mais luxuoso e a campa mais humilde, ambos albergam essa Verdade Absoluta, a Morte.
O infinito sossego e as campas silenciosas transportam-me, não para o além, que não sei o que é, mas para um passado sem mácula, ali não há justiça nem injustiça, vinganças nem ódios, sectarismos e crimes, tudo se esquece, tudo se perdoa. Ali, entre aquelas campas e jazigos revivo um passado que me foi querido, lá está muita da minha família, e também muitos amigos. Acontecem-me às vezes casos caricatos, como este: junto à sepultura do meu amigo David do depósito, lembrei-me de uma zanga que os dois tivemos por causa de um golo que eu deixei entrar num dos muitos jogos que fizemos no velho Estádio do Ribeirinho. Culpámo-nos mutuamente do sucedido e andámos uns dias de «candeias às avessas», porquê e para quê?
O que significou o poder a influência e o dinheiro para alguns dos que agora jazem nas suas sepulturas e jazigos? O que aconteceu quando foram confrontados com a morte? O que significou a pobreza, a miséria e a indigência de alguns quando confrontados também com a morte? Para estes talvez uma libertação.
Saio então do cemitério e volto ao ritmo vertiginoso do chamado «Mundo Civilizado».
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«Passeio pelo Côa», opinião de António Emídio
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Junho de 2008)
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