Dívidas velhas não se pagam ou o tempo a tudo traz cura.
Há uma glosa no nosso cancioneiro, que reza assim:
O tempo pediu ao tempo
Que o tempo lhe desse tempo
Respondeu o tempo ao tempo
Tudo com tempo tem tempo
Nós poderemos acrescentar que o tempo tudo influencia. E desse tudo pretendemos, aqui e agora, destacar o que acontece nos domínios do direito, propriedades, posse, dívidas, procedimentos processuais e extinção de penas.
O ladrão ou o usurpador, volvido determinado lapso de tempo torna propriedade sua – e de pleno direito – a coisa furtada, mesmo roubada, ou usurpada.
Todas as dívidas, das menores e corriqueiras às de grande volume e maior engenho, deixam de ser exigíveis, passado que seja o período na lei fixado.
O direito de peticionar, por maior que seja a sua legitimidade, também se extingue com o tempo. Como o direito de queixa, qualquer que seja o grau da ofensa. Ou a obrigação de cumprir pena, ainda que maior e agravada. Tudo isto espanta, mas é assim.
A este propósito, escreveu o ínsigne civilista Cunha Gonçalves, a páginas 628, capítulo 411, do volume III, do seu monumental tratado de Direito Civil:
O instituto da prescrição, embora pareça ser uma arbitrária criação do legislador e tenha sido até apontado como contrário à moral e ao direito natural, tem a sua base na própria natureza humana e é reclamado pela boa organização das sociedades civilizadas.
E acrescenta:
Não admira, por isso, que a prescrição remonte à mais alta antiguidade e tenha sido conhecida e reconhecida por todos os povos que se regeram por leis, tanto na Europa, como no Oriente.
Mas ao passo que na maioria dos povos, a prescrição era uma instituição mal definida, a Roma dos Césares conseguiu imprimir-lhe, mercê do génio e do admirável sensu prático dos seus famosos jurisconsultos, uma perfeição tal que as modernas legislações só tiveram de lhe fazer insignificantes alterações.
Estamos, pois, em face de uma multissecular e benéfica instituição jurídica.
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«Caso da Semana», análise de Manuel Leal Freire
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