No dia 5 deste mês, o cancelamento da venda em leilão da Christie’s de 85 quadros de Juan Miró, que custaram bem caros ao povo português, foi notícia dos principais jornais de Espanha, Reino Unido, Irlanda, Alemanha, EUA, Canadá, China e até da Colômbia e da Tailândia.

Mas nos dias imediatos foram raros os media, da comunicação dependente, que se atreveram a abordar a questão. Entretanto, ouvimos Passos falar da inevitabilidade da venda dos quadros. Importaria que ele soubesse que está em causa matéria legislada por lei, a qual prevê e pune como crime a saída do país de património cultural sem a autorização do membro do governo responsável pela área da cultura. Por outro lado, foi interessante descobrir os dotes pluripotenciais do Secretário de Estado da Cultura, quando em vez de zelar pelo património cultural foi dizendo que os procedimentos administrativos estavam cumpridos e que o dinheiro da venda faz falta para a Educação e Saúde.
A Lei submete os cidadãos ao seu cumprimento, no entanto existem uns rapazes no (des)governo que têm pautado a sua actuação por inconstitucionalidades e por constantes decisões à margem da Lei da República. Para tal, basta ver a leviandade assumida pelo chefe do gang, que desconhecedor da obrigatória decisão da Direcção-Geral do Património Cultural (que pode inviabilizar esta venda), dava a venda como adiada mas inevitável. Será que para pagar a divida vale tudo, até cometer crimes? Sendo assim, o Ministro da Administração Interna poderá encomendar ao Grupo de Operações Especiais um assalto ao Banco de Espanha. Há luz do que temos assistido não passaria de mais um crime para o cumprimento do memorando da Troika.
Mas, voltando a seriedade que a questão merece, importa também dizer que mesmo que a venda estivesse legalizada não deixaria de ser um negócio ruinoso para o Estado. Todo o cidadão minimamente responsável já ouviu falar das curvas da oferta e da procura, por isso não será difícil concluir que o produto da venda em leilão de 85 peças do mesmo autor, será inferior ao valor obtido se as peças forem leiloadas isoladamente ou em pequenos lotes. Como é evidente, com a venda em massa perde-se o efeito da escassez do produto no mercado.
Quanto ao embuste muito referido pelos rapazes da seita, o da necessidade de dinheiro para a Educação e Saúde, recordo que está em causa o activo e o passivo de uma empresa. Caso a questão implicasse um agente económico com necessidade urgente de liquidez, entendia-se a venda dos quadros.
Contudo, estamos em presença de um negócio de uma empresa detida na totalidade pelo Estado Português. Como tal, há obrigação de actuar com sentido de Estado e não como os apressados vendedores de banha da cobra. Sabe-se que os quadros podem valer muito mais do que o valor contabilizado no activo da empresa, mas há que ter calma e alma, porque os quadros são um activo e quanto melhor vendidos mais diminuirá o passivo.
É evidente que os quadros não têm pernas por isso não fogem, mas o previsível é que se esfume a oportunidade dos agiotas proporcionarem o desaparecimento dos Miró por meia dúzia de patacas.
Ficamos a aguardar desenvolvimentos que desvendem os contornos de mais um crime contra o Estado e também para saber se mais uma vez será o colectivo a pagar pela irresponsabilidade de uns rapazotes, que de fato e gravata se divertem a brincar aos governos.
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«Estádio Original», opinião de Luís Marques Pereira
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