Na 66.ª Secção Plenária da Assembleia Geral das Nações Unidas foi decidido que o Ano de 2014 será dedicado à Agricultura Familiar, como um reconhecimento da sua importância na segurança alimentar e na ajuda à erradicação da pobreza.
Não há desenvolvimento rural sem o apoio da agricultura familiar. Com efeito, é importantíssimo contar com uma organização produtiva no sector agrícola- pastoril e florestal sustentada e desenvolvida por uma família.
A ONU pretende promover em todos os países políticas públicas que favoreçam o desenvolvimento sustentável de sistemas de produção agrícola, baseados em unidades familiares; e incentivar a participação de organizações de agricultores, despertando a consciência da sociedade civil para a importância de apoiar a agricultura familiar.
Há dias assisti a uma ampla reunião de agricultores no auditório da Zona Agrária do Fundão, patrocinada pela Associação de Agricultores de Castelo Branco, com dois grandes temas: esclarecimentos sobre as novas regras dos subsídios à agricultura-pedido único 2014; enquadramento legal da actividade agrícola e implicações fiscais.
Na numerosa assistência, podiam contar-se pelos dedos de uma mão os jovens agricultores presentes, a maioria eram idosos e idosas e nos rostos e mãos eram bem visíveis as marcas da dureza do trabalho no campo.
Com a presença de um inspector tributário e de um director de unidade de prestação e contribuição da segurança social, as mensagens transmitidas foram assustadoras e sempre na base de formalismos legais, difíceis de perceber para quem não foi à universidade, do superior técnico, mas tem o curso superior da vida de trabalho, levantam-se todos os dias ainda a manhã lá vem longe, com chuva, ou neve, faça calor ou frio, é necessário caminhar, rasgar e amanhar a terra, é preciso cuidar os animais e das plantas.
Todos os agricultores, mesmo aqueles que não cultivam as suas courelas, têm de se colectar nas finanças e inscrever-se na segurança social, independentemente da área e da quantidade da produção agrícola.
Se um pobre agricultor levar uma alface, um nabo, uma couve, uma cebola, para vender na praça ou para o moribundo comércio local, é obrigatório fazer-se acompanhar de uma guia de transporte e emitir fatura. O retalhista terá também de ter o mesmo procedimentos e se vender uns tomates, umas cenouras, e se tiver muitos clientes tem d esperar para escrevinhar a forma aritmética ou deixá-los a partir sem fazer negócio.
Se receber um subsídio agrícola, tem de o declarar no modelo do IRS e irá ser penalizado na contribuição dos impostos.
Estes, e outros elementos penosos, vão agravar o abandono do cultivo das terras, afastando velhos e novos agricultores, pois torna-se em mais uma profissão perseguida pelo governo, insensível à economia de subsistência que a agricultura garante para muitos.
Ainda há dias o «Jornal do Fundão» alertava: viver no Interior do país é difícil, cada nascimento é um acto de resistência. A mesma teoria se pode aplicar aos pobres agricultores portugueses.
Portugal tem que defender, junto das Nações Unidas mas não só, esta agricultura familiar de sustentabilidade, valorização pessoal, aprendizagem, contacto com a terra e protecção da natureza.
Com estes formalismos legislativos e administrativos, que atingem os agricultores nas suas modestas actividades, muitas delas funcionando também como uma terapia ocupacional, nesta família rural onde nasci e em parte também cresci, lanço o meu grito de revolta e bem alto:
«REQUIEM AETERNAM para a agricultura familiar portuguesa! Entre males maiores e menores, REQUIEM IN PACEM! Ámen.»
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«Aldeia de Joanes», crónica de António Alves Fernandes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Março de 2012)
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