Temos, em Portugal, uma democracia de quarenta anos. Todavia ela é, ainda, mais formal que participativa. Reflita-se, então, sobre a qualidade da nossa democracia.
Numa primeira análise, ainda que superficial, ressalta que mais de metade dos cidadãos eleitores, certamente desiludidos, se alheiam e se abstêm de votar. É, portanto, notório o declínio da comparência eleitoral sobressaindo uma ampliação da desconfiança dos cidadãos em relação à política e aos políticos cujo desempenho se afigura cada vez mais duvidoso.
Por outro lado, o tempo presente, sendo para alguns de lucros fáceis e imediatos, não facilita nem a distribuição de riqueza nem a irradicação da pobreza. A facilidade e a celeridade com que alguns obtêm proveitos proporcionam, no presente contexto, mais anormalidades e corrupções que qualquer beneficiação social. Quem, se não integre ou não colabore é arredado como se de lixo se tratasse. Engrossam, assim, as fachas de exclusão constituídas pelos mais indefesos.
Ora, todos estes deméritos do presente, acabam por ter a sua quota parte de responsabilização na disseminação da pobreza e na consequente adulteração da democracia. Na verdade a pobreza sempre foi e continua a ser associada ao deficiente conhecimento que, por sua vez, diminui o poder de decisão e, por consequência, traz consigo a perda da liberdade.
Quem, por falta de condições mínimas, não pode educar-se, não sabe eleger e, por isso, não é verdadeiramente livre. Uma sociedade que se diz ou pretende democrática não deveria permitir o calibre de tamanhas desigualdades até porque elas ajudam a concretizar a impossibilidade da democracia participativa. De que vale falar de liberdade de expressão para quem não tenha a noção do que ela possa ser? Para que serve um sistema público de ensino se ele depender do poder económico e marginalizar parte da população? Quando o acesso ao saber e à cultura não é igual para todos estamos perante uma mutilação da democracia.
A crise tem, portanto, vindo a implementar-se favorecendo minorias, aumentando a pobreza, fazendo decrescer a democracia. Em última análise a crise poder-se-à tornar num novo totalitarismo.
Também, por esta ordem de ideias, se a actual estrutura económica europeia se vai propiciando a tão grandes desigualdades pode a Europa, ela própria, tornar-se uma ameaça.
Mas as formas de pobreza não se esgotam na pobreza individual. Há a pobreza dos Estados e os efeitos que ela produz. Tal como os indivíduos também os Estados são uns mais pobres e menos cultos que outros. Os mais ricos e influentes têm vindo a sobrepor-se aos mais pobres subalternando-os.
Ninguém tem dúvidas de que, tal como estão as coisas, há, hoje, políticos que se impõem muito para além das fronteiras dos seus próprios países, na inversa razão dos que, nos seus países, aceitam essa imposição. Merkel não foi eleita, evidentemente, pelos portugueses nem pelos gregos, espanhóis ou italianos mas tem, apesar disso, um enorme poder de decisão sobre eles. E o exercício desse poder (ilegítimo)? Não será, também, uma adulteração da democracia?
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«Terras do Jarmelo», crónica de Fernando Capelo
(Cronista no Capeia Arraiana desde Maio de 2011)
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Claro que o homem não vive só de pão. Mas sem pão não vive!
Quando li este último comentário, lembrei-me da célebre frase atribuida a Maria Antonieta que, perante a observação de um elemento da corte que referia não ter o povo pão para comer, disse: “Então comam brioches”.
jfernandes
Amigo Capêlo :
Vou comentar na pele de um ultraliberal:
1º A Democracia dá pão a alguém ?
2º A Liberdade dá pão a alguém ?
3º A Justiça dá pão a alguém ?
4º A cultura dá pão a alguém ?
Agora :
Faz estas perguntas aos homens e mulheres que dizem que nos governam, e também aos seus lacaios, eles responder-te-ão !
Já o disse várias vezes, melhor dizendo, escrevi, neste Blog que o Neoliberalismo, a vertente triunfante presentemente do Liberalismo, desvinculou-se da dimensão política, social e moral da economia, converteu-se num monstro que destrói tudo o que se opõe ao seu livre desenvolvimento, e entre as várias coisas que se opõem está, a Democracia, a Liberdade, a Justiça e a Cultura.
Adeus amigo Capêlo.
Claro que não dá!!!! Mas nem só de pão vive o homem!!!!