No rescaldo das eleições autárquicas, julgo que cabe aqui o relato de algo que pode ser simples coincidência, ou então, não havendo coincidências, poderá ser uma das justificações para o sucesso do PSD nas câmaras do distrito da Guarda.
Verifiquei que na semana anterior ao inicio das aulas, as escolas do 1.º ciclo do ensino básico de várias câmaras do distrito da Guarda presididas por políticos eleitos e reeleitos em listas do PSD, tinham atempadamente disponibilizado todos os livros para todos os alunos. Ora os alunos filhos de pais abastados não tem qualquer culpa de o serem e por isso tiveram (des)igualmente direito aos livros escolares, pois os seus pais também votam e os políticos, por muito ingénuos que sejam, sabem perfeitamente que com papas e bolos se apanham os tolos.
Sendo um desiderato da nossa Constituição, que o ensino seja tendencialmente gratuito, a medida seria totalmente justa e adequada. Contudo, a Constituição só se cumpre se for aplicada a todos os portugueses e se respeitar o princípio da igualdade. Isto para dizer que na outra realidade em que vivo, em Lisboa, verifico que há colegas das minhas filhas que provam a humilhação de «levarem» com faltas de material por que os pais não têm dinheiro para comer, quanto mais para compararem livros.
Para além da falência das famílias assistimos à falência dos serviços de apoio escolar que não têm dinheiro nem material para suprir as falhas desses alunos, fazendo com que os mesmos rejeitem as idas para a escola e a abandonem. No entanto o (des)governo aumentou os anos de escolaridade obrigatória, medida encapotada, unicamente para tornar ilegais os trabalhadores com menos de 18 anos, expondo-os assim à mercê dos exploradores de mão de obra ilegal. Estes factos sugerem-me três adjectivos: perverso, obsceno e mafioso.
Neste período em que o (des)governo da coligação de malfeitores tem causado tamanhos danos à sociedade portuguesa, encontro poucas explicações racionais para que a uma percentagem significativa, da minoria votante nas forças politicas, possa ter votado em pessoas eleitas em listas do PSD.
Contudo, ao nível da psicologia entende-se que o gesto simpático da dádiva faz com que o ser humano fique sensibilizado com os actores que têm esse dom. Todos somos sensíveis a uma oferta, mais ainda quando ela é enviada pelo senhor presidente e muito mais quando o «presente» é dado aos nossos filhos.
Os pais sabem que o presente dado aos nossos filhos nos sensibiliza muito mais do que o presente que nos é dado.
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«Estádio Original», opinião de Luís Marques Pereira
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