A «Quadrazenha» é uma bonita marcha-hino, em louvor da mulher de Quadrazais, cuja beleza motiva a letra de uma muito bela melodia. O autor da letra e da música foi o etnógrafo e músico José Inácio Franco, que nos ofereceu o original, passado de sua mão.
Esse original encontra-se numa encadernação, juntamente com outras coisas dos costumes quadrazenhos, no Centro de Estudos Jesué Pinharanda Gomes do Sabugal, e foi reproduzida no nosso livro Memórias de Riba Coa e da Beira Serra, 1.º volume, publicado em 1977.
Algumas pessoas me têm perguntado se o autor da marcha era quadrazenho. Não era. Lisboeta de nascimento (1900) veio a falecer também em Lisboa, cerca de 1970. Pouco antes de morrer, e ainda com saúde, e sem nos conhecermos pessoalmente, consegui o seu endereço e aprazámos um encontro em Moscavide. Ele trabalhava então na EDP em Sacavém.
O dr. Abílio Perfeito, que fora Reitor do Liceu da Guarda, e que presidia à Junta Distrital, tinha-me solicitado que procurasse saber do contacto de José Franco em Lisboa e indagasse dele se sabia qual o paradeiro das respostas das freguesias do Distrito da Guarda ao Inquérito Etnográfico que fora levado a efeito em 1940, por causa das festas centenárias da Nação. Dito e feito, encontrámo-nos em Moscavide e dele ouvi o que depois transmiti ao Dr Abílio Perfeito. José Franco não sabia do paradeiro do volumoso material do Inquérito, mas ele tinha em seu poder o original relativo a Quadrazais. E, um ou dois dias mais tarde, encontrámo-nos de novo em Moscavide e ele teve a enorme generosidade de me oferecer o Inquérito, que também se encontra na já citada encadernação do Sabugal, e registado no livro Memórias de Riba Coa e da Beira Serra, juntamente com a marcha «Quadrazenha».
Em 1940, José Franco era funcionário na Guarda, creio que trabalharia então nas Finanças. Sabia composição musical. Não tinha gravadores de som, coisa que na altura era difícil de ter. Ia pelas aldeias, com um banjo, o papel da pauta e um lápis. Punha as moças e as mais velhas a cantar, e ele pela toada, conseguia registar as notas e, desse modo, salvar antigas melodias de que ainda publicou algumas da extinta revista Altitude (Guarda, 1941-1945).
A marcha ainda se canta, como vimos no dia 9 de Junho de 2012, no Sabugal, quando o rancho de senhoras quadrazenhas a cantaram junto do antigo colégio.
José Franco merece uma rua em Quadrazais.
«Quadrazenha»
Sinto-me tão orgulhosa,
Sinto-me mesmo vaidosa
Por vestir desta maneira;
Porque este meu fato encerra
A alma da Beira-Serra,
A alma da própria Beira
O Manel, se assim me vê,
Diz que tenho são sei quê,
Que o deixa tontinho,
Chega-se muito p’ra mim
E começa logo assim
Dizendo muito baixinho:
Quadrazenha,
O teu fato colorido
É lindo por ser garrido:
Quadrazenha,
O trajar com singeleza
Só te realça a beleza.
Quadrazenha
O teu ar, com teu encanto,
Seduz tanto, tanto, tanto!
Quadrazenha,
Tão linda, tão sedutora
Pareces Nossa Senhora.
Tenha a cor verde dum prado
Seja amarelo, encarnado,
Qualquer das cores fica bem;
Quem uma vez o vestir
Sente pena de o despir
Tal o encanto que tem.
Nas lides da nossa aldeia
Quem o «pão nosso» grangeia
Canta sempre este meu fato,
E até o eco dos montes
Repete o cantar das fontes
Assim baixo, com recato…
Quadrazenha,
O teu fato colorido
É lindo por ser garrido:
Quadrazenha,
O trajar com singeleza
Só te realça a beleza.
Quadrazenha
O teu ar, com teu encanto,
Seduz tanto, tanto, tanto!
Quadrazenha,
Tão linda, tão sedutora
Pareces Nossa Senhora.
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«Carta Dominical», por Jesué Pinharanda Gomes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Fevereiro de 2007 a Setembro de 2018)
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Será feita logo que oportuno uma homenagem a José Franco pelas mulheres Quadrazenhas, agradecendo dessa forma a quem tão bem cantou a mulher Quadrazenha.
Em nome das mulheres Quadrazenhas deixo aqui o nosso bem haja a José Franco e também a Pinharanda Gomes que teve a amabilidade de fazer chegar até nós a cantiga e música original da “Quadrazenha”.