O livro «Alfaiates na órbita da Sacaparte» da autoria dos padres Francisco Vaz e António Ambrósio incluiu um importante trabalho de investigação sobre as paróquias (freguesias) do concelho do Sabugal no ano de 1758. Os manuscritos depositados na Torre do Tombo, em Lisboa, são a resposta a um inquérito censório a todo o reino assinado pelo Marquês de Pombal após o terramoto de 1755. O Capeia Arraiana vai, assim, reproduzir algumas passagens desse «imenso trabalho» com as respostas dos «padres curas» das 40 paróquias quando, neste ano da graça de 2013, muitas das freguesias retratadas vão desaparecer para sempre por obra e graça dos senhores mandantes da troika europeia.
(Parte 1 de 41.)
No ano seguinte ao terramoto de 1755 a Secretaria de Estado do Marquês de Pombal ordenou oficialmente um inquérito paroquial acerca da extensão e consequências do mesmo em todo o Portugal.
Com base num primeiro estudo de 1721 elaborado pelo padre Luís Cardoso que vivia no convento das Necessidades de Lisboa (onde está hoje sedeado o Ministério dos Negócios Estrangeiros), foi remetido aos Bispos de cada diocese durante o mês de Março de 1758 e, de seguida, enviados aos párocos das freguesias o inquérito censório sobre «quase tudo» das paróquias/freguesias de Portugal.
«O actual mapa das freguesias do concelho do Sabugal constituiu-se na segunda metade do século XVI, fixou-se definitivamente durante o séc. XVII e esteve no seu auge a meados do séc. XVIII. O requinte desse tempo reflecte-se no campo eclesiástico, no culto das igrejas e até nos cartórios paroquiais, nos assentos e escrituração dos livros», diz-nos na introdução o padre António Ambrósio.
A partir de 1770 as freguesias do actual concelho do Sabugal que nos termos de Vilar Maior, Alfaiates e Sabugal pertenciam a Lamego, e ainda a freguesia da Cerdeira que situada no termo do Castelo Mendo era de Viseu, passaram para a recém-criada diocese de Pinhel.
O novo bispado de Pinhel durou pouco mais de 100 anos tendo sido suprimido pelo papa Leão XIII, em 30 de Setembro de 1881. Os territórios foram incorporados na diocese da Guarda, juntamente com os outros, tomados a Coimbra e Castelo Branco. Em 1882 a diocese da Guarda adquiriu os seus actuais limites e integrou a totalidade das freguesias do actual concelho do Sabugal.
Nas 40 memórias paroquiais do concelho do Sabugal devolvidas pelos respectivos párocos há três que não têm data de assinatura (Aldeia Velha, Seixo do Côa e Malcata), nove foram assinadas em Abril de 1758, 22 em Maio e seis em Junho.
Nas actuais 40 freguesias somente 16 paróquias (incluindo duas na vila do Sabugal) formavam o termo do concelho: Aldeia do Bispo, Aldeia Velha, Foios, Lageosa, Nave, Quadrazais, Rendo, Ruivós, Ruvina, Sabugal (2), Souto, Vale das Éguas, Vale de Espinho, Valongo e Vila Boa.
Formavam o extinto termo da vila de Alfaiates as paróquias de Alfaiates, Aldeia da Ponte, Forcalhos e Rebolosa e o termo de Vilar Maior as de Vilar Maior, Aldeia da Ribeira, Badamalos e Bismula.
No Além-Côa ficaram registadas nove no antigo termo de Sortelha: Águas Belas, Aldeia de Santo António (da Urgueira), Bendada, Casteleiro, Malcata, Mouta, Penalobo, Santo Estévão e Sortelha.
O termo de Vila do Touro incluía as Quintas de São Bartolomeu, Rapoula e Vila do Touro.
Antigamente pertenciam ao termo da cidade da Guarda outras três freguesias que estão actualmente nos limites do Sabugal: Lomba dos Palheiros, Pousafoles do Bispo e Seixo do Côa.
A freguesia da Cerdeira pertencia então ao termo da vila de Castelo Mendo.
Nesse tempo pertenciam à Comarca de Castelo Branco os termos do Sabugal, Sortelha e Vila do Touro, à comarca de Pinhel os de Alfaiates, Vilar Maior e Castelo Mendo e à comarca da Guarda as três freguesias situadas no termo da cidade da Guarda. Hoje formam, todas juntas, o concelho do Sabugal e pertencem ao distrito e ao bispado da Guarda.
As «Memórias Paroquiais de 1758», guardadas na Torre do Tombo em 44 volumes manuscritos, não estão à disposição do público em geral no seus verdadeiros originais, mas sim através de um filme, volume por volume, página por página.
Neste primeiro capítulo vamos reproduzir o interrogatório enviado a todos os párocos do Reino pelo bispo da respectiva diocese, em 1758, por ordem do Marquês de Pombal. Assim, os capítulos seguintes desta rubrica devem ter em conta sempre este interrogatório na correspondência às respostas publicadas.
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INTERROGATÓRIOS ENVIADOS AOS PÁROCOS
(que venha tudo em letra legível e sem breves)
I – O que se procura dessa terra é o seguinte:
1 – Em que província fica, a que bispado, comarca, termo e freguesia pertence?
2 – Se é del-rei, ou de donatário, e quem o é ao presente?
3 – Quantos vizinhos tem (e o número de pessoas)?
4 – Se esta situada em campina, vale ou monte, e que povoações se descobrem dela, e quanto distam?
5 – Se tem termo seu, que lugares, ou aldeias compreende, como se chamam, e quantos vizinhos tem?
6 – Se a Paróquia está fora do lugar, ou dentro dele, e quantos lugares, ou aldeias tem a freguesia, todos pelos seus nomes?
7 – Qual é o seu orago, quantos altares tem, e de que santos, quantas naves tem; se tem lrmandades, quantas, e de que santos?
8 – Se o Pároco é cura, vigário, ou reitor, ou prior, ou abade, e de que apresentação é, e que renda tem?
9 – Se tem beneficiados, quantos, e que renda tem, e quem os apresenta?
10 – Se tem conventos, e de que religiosos, ou religiosas, e quem são os seus padroeiros?
11 – Se tem hospital, quem o administra, e que renda tem?
12 – Se tem casa de Misericórdia, e qual foi a sua origem, e que renda tem; e o que houver notável em qualquer destas cousas?
13 – Se tem algumas ermidas, e de que santos, e se estão dentro, ou fora do lugar, e a quem pertencem?
14 – Se acode a elas romagem, sempre, ou em alguns dias do ano e quais são estes?
15 – Quais são os frutos da terra que os moradores recolhem em maior abundância?
16 – Se tem juiz ordinário, etc., câmara, ou se está sujeita ao governo das justiças de outra terra, e qual é esta?
17 – Se é couto, cabeça de concelho, honra, ou behetria?
18 – Se há memória de que florescessem, ou dela saissem alguns homens insignes por virtudes, letras, ou armas?
19 – Se tem feira, e em que dias, e quantos dura, se é franca ou cativa?
20 – Se tem correio, e em que dias da semana chega, e parte; e, se não o tem, de que correio se serve, e quanto dista a terra onde ele chega?
21 – Quanto dista da cidade capital do bispado, e quanto de Lisboa, capital do reino?
22 – Se tem algum privilégio, antiguidades, ou outras cousas dignas de memória?
23 – Se há na terra, ou perto dela alguma fonte, ou lagoa célebre, e se as suas águas tem alguma especial qualidade?
24 – Se for porto de mar, descreva-se o sítio que tem por arte ou por natureza, as embarcações que o frequentam e que pode admitir?
25 – Se a terra tor murada, diga›se a qualidade de seus muros; se for praça de armas, descreva-se a sua fortificaçäo. Se há nela, ou no seu distrito algum castelo, ou torre antiga, e em que estado se acha ao presente?
26 – Se padeceu alguma ruína no terramoto de 1755, e em que, e se está reparado?
27 – E tudo o mais que houver digno de memória, de que não faça menção o presente interrogatório.
II – O que se procura saber dessa terra é o seguinte:
1 – Como se chama?
2 – Quantas léguas tem de comprimento, e quantas de largura; onde principia, e onde acaba?
3 – Os nomes dos principais braços dela?
4 – Que rios nascem dentro do seu sitio, e algumas propriedades mais notáveis deles; as partes para onde correm e onde fenecem?
5 – Que vilas e lugares estão assim na serra, como ao longo dela?
6 – Se há no seu distrito algumas fontes de propriedades raras?
7 – Se há na serra minas de metais, ou canteiras de pedra, ou de outros materiais de estimação?
8 – De que plantas, ou ervas medicinais é a serra povoada, e se se cultiva em algumas partes, e de que géneros de frutos é mais abundante?
9 – Se há na serra alguns mosteiros, igrejas de romagem, ou imagens milagrosas?
10 – A qualidade do seu temperamento?
11 – Se há nela criações de gados, ou de outros animais, ou caça?
12 – Se tem alguma lagoa ou fojos notaveis?
13 – E tudo o mais que houver digno de memória.
III – O que se procura saber do rio dessa terra é o seguinte:
1 – Como se chama, assim o rio, como o sitio onde nasce?
2 – Se nasce logo caudaloso, e se corre todo o ano?
3 – Que outros rios entram nele, e em que sitio?
4 – Se é navegável, e de que embarcações é capaz?
5 – Se é de curso arrebatado, ou quieto, em toda a sua distância, ou em alguma parte dela?
6 – Se corre de norte a sul, se de sul a norte, se de poente a nascente, se de nascente a poente?
7 – Se cria peixes, e de que espécie são os que traz em maior abundância?
8 – Se há nele pescarias e em que tempo do ano?
9 – Se as pescarias são livres, ou de algum senhor particular, em todo o
rio ou em alguma parte dele?
10 – Se se cultivam as suas margens, e se tem muito arvoredo de fruto ou silvestre?
11 – Se tem alguma virtude particular as suas águas?
12 – Se conserva sempre o mesmo nome, ou começa a ter diferente em algumas partes, e como se chamam estas, ou se ha memória de que em outro tempo tivesse outro nome?
13 – Se morre no mar, ou em outro rio, e como se chama este, e o sitio em que entre nele?
14 – Se tem alguma cachoeira, represa, levada, ou açudes que lhe embaracem o ser navegável?
15 – Se tem pontes de cantaria, ou de pau, quantas, e em que sitio?
16 – Se tem moinhos, lagares de azeite, pisões, noras, ou outro algum engenho?
17 – Se em algum tempo, ou no presente, se tirou ouro das suas areias?
18 – Se os povos usam livremente das suas águas para a cultura dos campos, ou com alguma pensão?
19 – Quantas léguas tem o rio, e as povoações por onde passa, desde o seu nascimento até onde acaba?
20 – E qualquer outra cousa notável que não vá neste interrogatório.
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1 – Os próximos artigos vão dar conta das respostas dos párocos das 40 freguesias que integram, actualmente, o concelho do Sabugal.
2 – Agradecemos a autorização do detentor dos direitos de autor para publicar os textos e citações retirados do livro «Alfaiates – Na órbita da Sacaparte».
(Continua na quarta-feira com as respostas de Águas Belas.)
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«Censos do Marquês de Pombal em 1758», por José Carlos Lages
Estes censos, ordenados pelo Marquês de Pombal, foram uma revolução estatística e de levantamento geral da população e das terras habitadas de todo o País.
Quem tiver interesse em saber quais as respostas do cura do Casteleiro, pode consultá-las no blog ‘Viver Casteleiro’, aqui:
Memórias Paroquiais do Casteleiro
http://vivercasteleiro.blogspot.pt/search/label/mem%C3%B3rias%20paroquiais
Quanto à infeliz reforma administrativa, altura em que o Casteleiro foi transferido, penso que a minha terra foi com isso muito prejudicada. O tema também já foi tratado anteriormente, mas neste mesmo ‘Capeia’ e pode ser consultada aqui:
Reforma de 1855
https://capeiaarraiana.pt/2012/03/19/casteleiro-sofre-mais-desde-1855/