Está patente ao público, na Galeria de Arte do Paço da Cultura, na Guarda, uma exposição denominada «Morcela da Guarda – Tradição, Saber e Sabor». A mostra, cujo catálogo (bilingue) contém um texto da autoria do sabugalense Paulo Leitão Batista, é uma iniciativa da Câmara Municipal da Guarda e da Pró-Raia.

A exposição denominada «Morcela da Guarda – Tradição, Saber e Sabor» é uma iniciativa da Câmara Municipal da Guarda, contando com o apoio da Pró-Raia, e tem por objectivo enaltecer um dos mais genuínos e característicos produtos gastronómicos da região. Através de registos fotográficos e videográficos percorrem-se os caminhos da memória para se reviver a tradição das matanças do porco, que ainda há uns anos aconteciam nas aldeias, onde todas as famílias cevavam e matavam um «marrano» para dele retirarem alimento para todo o ano.
O porco era a mantença da casa, na medida em que fornecia carne e enchidos, que todos a apreciavam, confeccionados segundo os saberes que foram transmitidos em gerações sucessivas.
A partir do sangue retirado no momento da matança confeccionava-se um dos mais genuínos enchidos portugueses: a morcela. A da Guarda há muito que adquiriu nome e estatuto, sendo uma das mais apreciadas do país.
O catálogo da exposição contém textos de dois estudiosos das tradições regionais: Paulo Leitão Batista e Norberto Gonçalves. O primeiro, que também é chanceler da Confraria do Bucho Raiano, do Sabugal, escreve sobre a morcela enquanto primeiro enchido da matança, e aborda temáticas como «a ceva do marrano», «o tempo das matanças», e a própria «confecção das morcelas». Já Norberto Gonçalves apresenta um texto intitulado «De faca e alguidar», através do qual descreve o antigo ritual da matança.
O catálogo é de edição bilingue (português e inglês), e os textos são enquadrados por um conjunto de fotografias colhidas numa matança à antiga feita numa aldeia do concelho da Guarda. O vistoso e bem concebido catálogo contém ainda um conjunto de receitas modernas em que a morcela é o ingrediente principal.
No acto de inauguração da mostra, o presidente do Município da Guarda, Joaquim Valente, assumiu que uma das formas pelas quais a edilidade egitaniense irá defender o seu produto gastronómico de excelência será através da criação da Confraria da Morcela, que a Câmara irá apoiar.
Porém o primeiro passo para o lançamento da futura Confraria da Morcela da Guarda está dado e, para isso, nada melhor do que ter chamado a escrever o catálogo da exposição o chanceler da Confraria do Bucho Raiano.
A exposição, inaugurada no dia 12 de Julho, pode ser visitada até ao dia 15 de Setembro, de terça a sábado, das 14 às 20 horas.
Reportagem da LocalVisão Guarda. Aqui.
E porque sempre achei ridículas as falsas humildades aqui deixo um público louvor à enorme qualidade do texto do catálogo da exposição da autoria do Paulo. E só ficou por fazer a tradução para castelhano…
jcl
Boa tarde
Ando com um enorme apetite de comer uma morcela como deve ser.
Já comprei aqui em Coimbra toda a morcela à venda (Corte Inglês, Continente, Jumbo, Pingo Doce, mercado, lojas) só que nenhuma me faz lembrar a morcela que comprava ou me compravam no mercado na Guarda.
Assim, venho tentar saber como arranjar uma morcela à antiga, com aquele gosto, sabor tão característico.
Como posso encomendar?
Cumprimentos
Carlos Canelas
Boa Paulo! Quem escreve bem e escreve sobre as coisas simples, merece estar e ficar na memória da nossa gente!
Parabéns!
Caro José Carlos Mendes
Obrigado pelas palavras amigas. Confesso que foi para mim uma honra ver o meu texto figurar no catálogo da exposição, tanto mais que o restante trabalho, grafismo, fotos, legendas, e sobretudo o outro texto (de Norberto Gonçalves), é de altíssima qualidade – sobre o mérito do meu texto não me pronuncio, pois deixo a apreciação para os outros.
De facto a Câmara da Guarda definiu uma estratégia para afirmar a morcela enquanto produto de excelência, realizando inciativas com dignidade, que poderão levar o barco a bom porto.
A morcela é de facto um enchido de excelente paladar e um óptimo cartaz turístico para uma região que precisa de apostar em algo que lhe traga futuro.
Agradeço também ao José Carlos Lages as palavras que colocou no texto com a notícia e à simpática notinha de rodapé.
Quanto a Elvira Rebelo, que também comenta, confesso que não sei se a percebi, mas acho que o facebook é um bom instrumento de comunicação: tenho uma página pessoal nessa rede social e o blogue Capeia Arraiana também.
Na «mouche», Paulo.
Estas coisas meio ancestrais deliciam-me. Dá-me muito mais gozo pensar que vêm do profundo dos tempos estas coisas do que coisas como aquela coisa do touro e do forcão e arredores. A matança tem muito mais de sagrado e mítico.
Prefiro. Basta referir que há religiões em que é proibido comer carne de porco. Por que será, ou por que é ou terá sido?
Por tudo isso, quando li as referências que José Carlos Lages honestamente faz ao texto do Catálogo, tomei logo a liberdade de pedir esse texto. E li-o agora mesmo, sofregamente, meus amigos.
É que… de facto, do porquinho, comia-se tudo, tudo, pedaço a pedaço: carne gorda, febras, entremeada, ossos, presunto. E os enchidos: chouriça, farinheira, bucheira, chouriço de ossos, paio (palaio). E, claro, logo para abrir, a inconfundível morcela. Na minha terra (o Casteleiro), temperada com cominhos – para obter cambiantes de sabor únicos.
É assim que, na aldeia, em cada casa se obtém um paladar diferente. E sempre irresistível. Mas diferente de casa para casa. Quanto mais de aldeia para aldeia… e, mais ainda, se comermos morcela (ou chouriço mouro – seja lá o que lhe chamam nos vários pontos do País) feita noutras zonas do país…
E isto é válido para cada um dos tipos de enchidos.
Estão a ver a variedade de sabores, aromas, aspectos, cores, formas…?
Compreendam, pois: não resisto a transcrever, abusando da abertura do autor: «A morcela era (…) o primeiro enchido a sair da matança e aquele que se comia com maior vontade. Podia consumir-se torrada, como atrás se indicou, ou cozida, acompanhando batatas também cozidas, ou pão, servindo como conduto.
«(…) o porco guarda (…) um conjunto de sabores riquíssimos e de óptimo paladar, mas teremos de considerar, que entre esses sabores, um dos melhores, se não o primordial, é o da morcela».
Bem dito.
Venham mais descrições do género.
E nós que possamos ter acesso.
Nota
Uma sugestão aos editores: podia ser criado um arquivo (outro portal, género Capeia 2) onde se armazenassem textos de maior volume e densidade (como este que refiro em cima) mas a que todos os interessados pudessem aceder.
É um método utilizado por muitos de nós, utilizadores de blogs como meios de comunicar.
Para uns o caminho faz-se caminhando. Para outros faz-se resistindo no Facebook.