Pus-me a pensar há dias nas refeições habituais que se comiam no Casteleiro quando eu era pequeno. E tiro uma conclusão: era muito mais saudável aquele ritmo do que o de hoje. Isso, para já não falar do carácter biológico dos produtos… Mas havia quem passasse mesmo mal.
Antes de mais uma interessante mas estranha nota: no Casteleiro já se conheciam regras da alimentação que entretanto se perderam e que agora os médicos vêm outra vez recordar.
É verdade.
Hoje os médicos dizem-nos que devemos comer produtos biológicos e cinco a seis vezes ao dia. Melhor ainda, cada duas horas e meia. E que devemos comer sopa.
Pois bem: no Casteleiro de há 50 e tal anos, já era quase assim.
Claro que eram tempos de muita miséria. Havia quem não tivesse sequer um chão para cultivar. Quem passasse mal. Quem levasse umas batatas cozidas no bolso para comer por lá durante o dia.
Quem andava «a trabalhar para outra», comia refeições fornecidas pela pessoa para quem trabalhava.E havia uma regra: eram cinco as refeições certas para quem trabalhava no campo, com determinadas bases alimentares:
– Às seis ou sete da manhã: o almoço. Um caldo e um bocado de pão com conduto.
– Às 10 e meia: o cravelo. Pão com queijo curado e ou com chouriça.
– Ao meio-dia: o jantar. Caldo e carne. Aqui e ali, sardinha, bacalhau – o que houvesse.
– Às 4 da tarde: a merenda. Pão com queijo, chouriça ou presunto.
– Às seis e tal ou sete: a ceia. Caldo, feijão grande ou «feijões pequenos» – eram as bases…
Repare, repito: hoje recomendam: muita sopa, não esqueça a sopa. Nada de novo: naqueles tempos, como refiro aí em cima, no Casteleiro, havia sempre um caldo a cada uma das três principais refeições: de manhã bem cedo, ao meio-dia e à noite.
Havia fome e carência alimentar em bastantes famílias. Isso é certo. Por isso, a fuga massiva para a emigração. Mas havia sempre algo que comer. Para lá das comidas atrás referidas, havia outras opções – não de abundância, que os tempos eram de frugalidade, mas de diversidade.
Algumas famílias matavam porco. E tinham vacas ou cabras com cujo leite faziam queijo. Para essas pessoas, as opções aumentavam.
Antes de mais, o queijo e a carne de porco, incluindo todo o tipo de enchidos (bucheira, chouriça e chouriço, farinheiro) e também a carne, o presunto.
Uma nota desagradável: o sal. Era tudo muito, mas muito salgado.
Depois, os legumes, sem grandes variedades. Por exemplo: não havia cenouras, mas havia basicamente batata e couve
Atenção: os nabos eram para o vivo, não para os humanos.
Ah, e o vinhito. Não havia homem que não acompanhasse a sua refeição de uns copos de vinho.
Cena imperdível: o pão a apeguilhar com queijo: comido de navalha na mão e a cortar aos bocadinhos que se vão acompanhando da bebida… De manhã, à tarde ou à noite.
Mas quando se diz «à noite», atenção, que isso não tem nada a ver com os horários de hoje. Primeiro: a luz solar é que comandava a vida.
Electricidade, só depois de 1955 – e não era em todas as casas. E os hábitos seculares não iam por aí: o sol é que indicava os horários. Isso significava duas coisas principais: primeira – o pessoal deitava-se cedo; segunda – o estômago estava habituado àquele ritmo do levantar bem cedo e ter logo ali um caldo quente à roda do lume, no Inverno, e à fresca cá fora se fosse possível no Verão…
Resta mais uma informação: o serão era pequeno. No inverno, às 9 ou 10, no limite, estava tudo na cama. No Verão, aí pelas 10 e meia. Que de manhã era preciso levantar cedo – e a vida de esforço que o trabalho rural impunha obrigava a descansar mesmo.
Nota
Mais uns termos a conhecer (dispenso-os de lhes trazer aqui a grafia da verdadeira pronúncia e da corruptela populares – que isso, sim, seria um «show» aqui no «Capeia»!):
Chão – courela, pedaço de terra para cultivar;
Conduto – acompanhamento do pão (carne, queijo, enchidos);
Caldo – sopa;
Feijões pequenos – feijão frade;
Apeguilhar – acompanhar o pão com um conduto muito apetitoso (sobretudo o queijo curado apeguilha muito bem com o pão;
Merenda – lanche. Atenção aos nomes e horas das refeições: o pequeno-almoço chamava-se almoço, de manhã bem cedo; o jantar era ao meio-dia: o que hoje chamamos almoço; e a ceia era o que hoje chamamos jantar: à noite… E, a meio da manhã, uma refeiçãozita especial:
O cravelo – refeição intermédia das 10 e tal da manhã, tipo colação, mas da manhã.
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«A Minha Aldeia», crónica de José Carlos Mendes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Abril de 2012.)
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Reconfortam docemente a minha alma– que comparticipa com o corpo dos deleites deste –a evocação dos seculares hábitos alimentares dos nossos avoengos.
O autor retrata com singular perfeiçao e um conhecimento, por certo mais de
outiva que de vivencia–a adequaçao das horas e dietas alimentares ao desgaste de energias e exigencias climãticas.
Repare-que a merenda se suprimia entre oito de Setembro e identica data de Março.segundo até um bem expressivo ditado,pelo qual, ao caminhar para o Outono LEVA A SENHORA A MERENDA E TRAZ O DIABO OS SERÕES
A má fama destes aliás simpatiquissimos convivios que naqueles seis meses de muito menor exigencia de esforço se desenrolavam, da ceia até alta madrugada em qualquer asseada corte de vacas ,resultava do facto de ali se formarem coros de criticas.
Mas que também por isso serviam de regalo para a alma.
Ao corpo fornecia-se complemento nutritivo sempre que a dispensa e a adega o permitiam e o labor aconselhava.
Repare-se no numero e qualidade das refeiçoes nos dias de malha e gadanha,os mais esgotantes do antigo calendario rural.
Ou inversamente no que se passava nos quarentas dias da QUADRAGESIMA
-n ome que radica exactamente em quarenta
COM A ABSTIINENCIA-proibiçao canonica do consumo de carne–
E O JEJUM-+equenios e oibres repastos como o da PARVA–palavra que em latim significava pequeno
Mas que levava os mais recalcitrantes a dizer que parvo é aquele que se contenta com a parva,
Julgamos que não destoará aqui uma referencia a pao meado–ã base de dois cereais.vg a triga-milha e o pao alveiro,embora este pudesse ser obtido apenas de centeio,moido na mó alveira
~~DE PAO TERÇADO–trigo,centeio,milho.habitualmente miudo,a que tamb ém se chama sorgo..
~DE PAO QUARTADO–aquelas tres especies,mais cevada ou aveia
Penso que também se poderá falar de
ATAFONA–MOIDO MOVIDO A BESTAS
PAO AZIMO–DE SEM FERMENTO NEM SAL
DE SANTO HONORATO-PATRONO DOS PADEIROS
E fechar,dizendo que dieta não significa comer muito ou pouco,nem disto ou daquilo
mas adequaçao do alimento á saude e necessidades de cada qual,que pode nao ser o mesmo que cada um.
Pois. Muitos dos termos usados pelo Dr. Leal Freire não são do meu conhecimento – não eram usados no Casteleiro da minha infância, isso garanto (exemplos: pão meado, terçado, quartado, atafona). Já pão ázimo, esse ouvia falar: era dele que se faziam as hóstias, diziam. E sobre jejum, abstinência, , quaresma, «e tutti quanti», disso o povo do Casteleiro teve a sua dose – seja como for que cada um hoje encare esses tempos de crise e as medidas das troikas da época (Igreja / regime / párocos).
Agradeço a atenção dedicada ao que escrevi – mas preocupa-me que se alargue tanto o âmbito que se descaracterize a minha singela intenção inicial: falar do que conheço e sobretudo da minha terra e seus costumes: o Casteleiro.
A EVOLUÇÃO ROMANESCA DO FORNO
Tudo começou pelo sol.
Assim mesmo.De facto,foi o sol o primeiro combustivel que se usou para cozer o pão,processo usado há milenios um pouco por toda a Asia
Menor.
As pastas de massa eram colocadas sobre pedras expostas em sitio e posiçao adequados para receberem o maximo de calor.
Depois,quando o homem se encontrou já senhor e dono dos segredos do fogo,passou a aproveita-lo para cozer,melhor e mais depressa o seu pão.
Primeiramente,limitou-se o processo a uma plataforma de argila ,aquecida com a devida antecedencia e sobre a qual se colocavam os pães a cozer.
Na fase subsequente,a argucia dos nossos antepassados levou-os a imaginar e criar fornos fechados ,podendo regular assim a intensidade do lume e assegurar maior produção,
Entretanto passaria muito tempo para a descoberta do beneficio de se estabelecer correntes de ar no interior do forno,uniformizando as
temperaturas e alargando a area util.
Depois vieram o forno a vapor,o forno a gás,o forno electrico…
Mais rapidos e sobretudo possibilitando maiores indices e quamtidades de promoçao.
MAS NÃO HÁ PAO COMO O COZIDO A LENHA E SE ESTA FOR DE VIDES JÁ TRAZ A ALEGRIA DOS NOSSOS PALHETOS