O Capeia Arraiana elegeu António José Santinho Pacheco para «Personalidade do Ano 2010». O actual Governador Civil do distrito da Guarda soube da escolha durante a entrevista que nos concedeu na semana que antecedeu o Natal e sucede a António Robalo, eleito no ano passado. «Não tenho tempo para as redes sociais na Internet porque privilegio o contacto pessoal», disse-nos confirmando o que já todos pensam da sua personalidade. Pró-activo, irreverente, dinâmico e opinativo nunca recusa um convite mesmo que isso o faça marcar presença em dois ou três concelhos no mesmo dia, em qualquer dos sete dias da semana. Santinho Pacheco entendeu reescrever a partir da cidade mais alta a definição de Governador Civil nos «books» governamentais.
Ao longo de 2010 homenageou as mulheres da Guarda, reuniu entidades para tratar da problemática da sinistralidade rodoviária, apoiou os pedidos de novos quartéis na Guarda para a PSP e GNR, opinou sobre os IC’s na Serra da Estrela, protocolou em conjunto com a secretária de Estado Adjunta e da Reabilitação os apoios às IPSS’s do distrito, apoiou a visita à Guarda durante uma semana dos oficiais do Instituto de Altos Estudos Militares, esteve em Vilar Formoso a receber os emigrantes com o programa «Verão Seguro», liderou o pacto de regime sobre as «desavenças» entre os municípios e a Águas do Zêzere e Côa, criou o dia distrital anual do tratorista reunindo centenas de agricultores em Pinhel, realizou o primeiro governo civil aberto na freguesia dos Fóios… Estas são algumas das muitas iniciativas que protagonizou no primeiro ano de Governador Civil…
– Como reage a algumas críticas que consideram que vai havendo muitas iniciativas mas poucas conclusões?
– Não sou um calculista no exercício do cargo nem exerço as minhas competências com reservas. Normalmente os políticos quando ainda estão numa determinada idade têm medo de cometer erros ou deslizes e são muito politicamente correctos mas eu considero que no distrito da Guarda temos que ir além de dois ou três eventos anuais ou então perdemos visibilidade nacional. Entendo que é necessário levar a cabo um conjunto de acções com toda a franqueza e abertura independentemente de não atingir rapidamente resultados. Vou pegar no exemplo da reunião dos tractoristas em Pinhel. Podíamos ter reunido separadamente em todos os concelhos mas sei que as iniciativas passavam despercebidas aos olhos da comunicação social, do poder, da autoridade nacional de segurança rodoviária, da GNR e ao fim e ao cabo gastávamos muito mais do que concentrar toda a gente em Pinhel. Estiveram presentes 1500 tractoristas que sentiram o reconhecimento das autoridades e do povo anónimo. Foi muito importante reconhecer o contributo dos tractoristas para não deixar morrer a agricultura e até para evitar males maiores com incêndios. Podemos falar, também, sobre o centro de limpeza de neve. Sempre nevou na Guarda. Tem sido típico antes de falar no tema analisar todos os aspectos políticos da questão. É esse «tacticismo» que eu não tenho. Entendo que a Guarda merece um centro de limpeza próprio para não estar sempre a pedir favores às Estradas de Portugal, à Scutvias ou outra qualquer. Foi mais tarde do que as minhas previsões? Foi, sim senhor, mas vai concretizar-se. Outro exemplo. Tomei conhecimento em Salamanca com o Centro Superior de Educação Vial que coordena os cartazes, os sinais e as campanhas rodoviárias para toda a Espanha. Na primeira oportunidade propus ao senhor ministro a criação de um centro idêntico na Guarda com o apoio do IPG. O meu dever é lutar mesmo não sabendo se vou concretizar este desejo. Recentemente, após o grande nevão, entendi falar sobre as correntes para a neve. Há sinalética própria para essas situações. É só colocá-la e responsabilizar os automobilistas que não cumprirem. Sem problema nenhum. Não estou a medir consequências. Apenas estou preocupado em fazer. O único direito que o Governador Civil tem é cumprir o seu dever. Cumprir o dever é inovar, procurar concretizar as ideias e lutar até à exaustão pela sua concretização.
– A «interioridade» do distrito da Guarda é de extremos. O calor seco do Verão e os rigores da neve no Inverno. Acha que o poder central reconhece estas especificidades?
– Na generalidade dos distritos a Protecção Civil está preparada para o grande desafio dos fogos florestais e depois o Inverno é uma época de «pousio», de descanso para os bombeiros. Nós aqui não. Este ano houve fogos até final de Outubro e depois começamos a ter os primeiros nevões e geadas. A área dos nevões até é maior do que a dos incêndios. O concelho do Sabugal teve um dos nevões mais intensos de que há memória. O maciço central da Serra da Estrela, a Guarda, Manteigas, Aguiar da Beira, Trancoso e Seia e Gouveia tiveram neve durante vários dias. A necessidade de combater a desertificação do Interior devia ser estratégica a nível nacional. O país está perigosamente inclinado para o mar. Os problemas sociais que vemos nas áreas metropolitanas de cidades como Paris são muito graves e de um momento para o outro podem acontecer também em Portugal. É importante voltar a indireitar o país. Um distrito como a Guarda que elege apenas quatro deputados faz com que estas terras sejam esquecidas. Os dois partidos já foram herdeiros e já deram heranças e por isso são os dois responsáveis.
– Somos poucos mas temos excelentes recursos naturais como, por exemplo, a água…
– Exacto. Veja a questão da água. Os municípios afirmam que estão a ficar com prejuízos porque estamos a pagar a água muito mais cara. Só há uma maneira de resolver o problema e fazer justiça ao Interior. A Assembleia da República deve tabelar o preço da água como faz com a electricidade ou o cimento. O problema é que há prédios em Lisboa com mais habitantes do que muitas freguesias do distrito da Guarda. No mapa das 20 freguesias mais pequenas de Portugal há 11 no distrito da Guarda. Todos estes problemas do Interior deviam ser encarados quase como de salvação nacional. Devíamos substituir as politiquices. Não devemos ordenhar uma vaca quando esta não tem leite. Estamos a maltratar o animal. Na política é a mesma coisa. Devemos ser justos para distribuir o pouco que temos. Se fossemos verdadeiros a falar e não estivéssemos sempre com um discurso politicamente correcto para agradar aos nossos líderes. Dou-lhe outro exemplo. O meu último desafio aos autarcas foi no sentido de abrir uma oficina de turismo em Salamanca para promover o distrito da Guarda. O Governo Civil patrocina em colaboração com os 14 municípios. Mesmo que não seja possível uma candidatura não chega a dar um mês de renda a cada um. Na Rádio Altitude ouvi espanhóis na Feira Eco-Raia, em Salamanca, dizer que é mais fácil saber pormenores de Óbidos ou da Nazaré do que do nosso território. O distrito da Guarda está dividido em três regiões de turismo e por isso é muito difícil coordenar estas entidades todas. Temos de nos unir e trabalhar em conjunto. Estou a trilhar um caminho do qual já não há retorno e quero exercer o cargo de forma muito presente porque como já afirmei o único direito que o Governador Civil tem é cumprir o seu dever.
(Continua.)
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José Carlos Lages
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