Os republicanos mais convictos consideravam o clero o maior inimigo da República. A Afonso Costa, talvez o mais convicto de todos, atribui-se esta frase, dita na Sede do Grémio Literário em Lisboa (maçonaria), a 21 de Março de 1911: «O povo está admiravelmente preparado para receber essa lei (Lei da Separação entre a Igreja e o Estado), e a acção da medida será tão salutar que em duas gerações Portugal terá eliminado completamente o catolicismo que foi a maior causa da desgraçada situação em que caiu.»

Diz a história que não há nenhuma prova, nem relato da imprensa onde isso viesse, foi uma orquestração dos monárquicos clericais. Fosse como fosse, o ódio a Afonso Costa por parte do clero, vem da separação entre a Igreja e o Estado, decretada a 20 de Abril de 1911 e da qual ele foi o autor.
Essa lei desencadeou uma luta terrível entre a jovem República e a Igreja.
Essa guerra religiosa fez-se sentir em todo o País. O Sabugal e o seu concelho não ficaram alheados dela. Vou contar um episódio passado aqui na então Vila em Junho de 1912. Esta história foi-me contada há uns bons trinta anos, ou mais, por alguém que assistiu a tudo. Posteriormente venho lê-la num livro que versa sobre a Guerra Religiosa na Primeira República.
Junho de 1912, foi autorizada uma procissão na Vila do Sabugal, por parte das autoridades republicanas, a lei passou a obrigar que fosse pedida autorização para a realização de qualquer acto religioso. Mas os republicanos, mais convictos dos seus ideais do que as próprias autoridades, contactaram com o ministro da justiça, contando-lhe o que se estava a passar. O ministro interveio e não autorizou a procissão. A população não quis abandonar as suas crenças e as suas tradições, veio para a rua, foi a casa do então pároco, padre Manuel Nabais, e pediram-lhe, ou obrigaram-no, a fazer a procissão. Algumas pessoas estavam armadas de paus, principalmente as mulheres que os traziam debaixo dos xailes e, com vivas à República e à Liberdade, com morras à maçonaria (vejam a destrinça) realizou-se a procissão. As autoridades retiraram-se para uns moinhos junto ao Côa (já era noite quando a procissão percorreu as ruas da Vila) porque o povo quando se mobiliza, lutando pelo conservadorismo ou pelo progressismo, às vezes excede-se…
Lembrei-me desta história porque outro dia vi num placard colocado numa das paredes da Igreja de São João do Sabugal, o nome do padre Manuel Nabais que paroquiou aqui entre 1911 e 1935, anos nada recomendáveis para a profissão de padre em Portugal.
A guerra religiosa no concelho não se ficou só pela então Vila , problemas houve na Rebolosa (1912) e Vilar Maior (1915).
Convém também recordar que os professores do concelho do Sabugal, numa reunião realizada em Novembro de 1910, aderiram à República contribuindo cada um com doze mil reis para a amortização da dívida externa do País.
Querido(a) leitor(a), Portugal entra o século XX (1910) com uma Revolução.
Portugal entra o século XXI (2010) com uma Contra-Revolução.
Um exemplo de que os movimentos da história são vaivéns entre o progresso e o retrocesso.
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«Passeio pelo Côa», opinião de António Emídio
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Junho de 2008)
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Sr. Emídio
A História é o melhor que fica e faz parte integrante da vida de um País. Recordamos o bom e o menos bom, mas tudo faz parte do nosso passado. É bom que possamos rebuscar essas páginas que falam de nós e dos antepassados que fizeram o melhor que lhes foi permitido e muitas vezes lutaram contra forças “mais fortes” – passo a redundância. PARABÉNS