Morreu esta semana o escritor que eu mais admirava e apreciava.

Li «Levantado do Chão» no inicio dos anos 80 e essa leitura levou-me à leitura de todos os livros da obra de Saramago. Alguns, para ai dois, comprei e não terminei a sua leitura. Foi a fase de não conseguir ler Saramago, como já me tinha acontecido, e ainda acontece, com Lobo Antunes.
De todos os seus livros gostaria de destacar aqueles que maior prazer me deram a ler e aqueles que após cada leitura recomendava a todos os amigos.
Em «Levantado do Chão» descobri um povo que luta contra a opressão num ambiente de miséria rural. Da luta dos trabalhadores agrícolas alentejanos contra os latifundiários, as forças da ordem e a igreja descobri um povo antifascista e um autor que não tem medo de revelar as suas opções políticas.
No «Memorial do Convento», com a criação de personagens fantásticas: Baltazar, sete-sóis e Blismunda, sete-luas, o padre Bartolomeu Dias e a sua passarola, o rei e a rainha, o povo anónimo, através da construção do convento de Mafra, Saramago volta a ter na sua acção a História de um Povo.
Nos anos 90 são publicados «O Evangelho segundo Jesus Cristo» e «Ensaio sobre a Cegueira».
Com o Evangelho nasce a primeira polémica. Depois de Abril um governo censura um livro ao proibir a sua participação num prémio europeu de literatura. Saramago parte para as Canárias.
Em o evangelho Cristo é homem. Vive as angústias de um homem, os amores e as paixões, a revolta e a crucifixação, como todos aqueles que sem medos se revoltam num mundo de misérias e injustiças.
As angústias de quem não vê ou não quer ver, na cegueira colectiva de um povo e quase a apontar para a ficção científica foram sentidas no final da leitura do «Ensaio sobre a Cegueira».
«Caim» a última obra lida de Saramago, volta a por em destaque o sagrado e gera novas polémicas, sendo já tema de uma das primeiras crónicas escritas e publicadas aqui por mim.
Deixei para último o livro que por estes dias mais me fez recordar Saramago. «Intermitências da Morte». É o livro que nos deixa sem resposta. Apenas sabemos que na morte e no seu compromisso para com a humanidade reside o medo do desconhecido, do vazio, algures numa hora e num lugar deste planeta.
No escritor descobri o homem, coerente com os seus pensamentos, fiel aos seus valores.
Hoje, no desconhecido da morte, restam os livros.
A todos aqueles que nunca tiveram coragem ou interesse em ler José Saramago desejo que o descubram e retirem da leitura dos seus livros prazer mas também a coragem para que sem medos se afirmem os pensamentos e as ideias, mesmo que incómodas ou não maioritárias na sociedade.
Por tudo, Obrigado José Saramago.
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«Largo de Alcanizes», opinião de José Manuel Monteiro
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