A França viveu as últimas semanas ao «ritmo» da sua Selecção Nacional. Até houve (e continua a haver) outros assuntos que mereciam a mesma, senão ainda maior atenção. Mas não é novidade que o futebol continua a mexer com uma gande parte da sociedade, ricos ou pobres, velhos ou novos.
Nestes momentos desportivos, que pessoalmente também aprecio, todas as atenções vão para as equipas do nossos países, o patriotismo sai à rua, os temas de conversa são os resultados, bons ou maus de certas equipas e outros problemas mais sérios e mais urgentes de resolver ficam para trás ou são resolvidos à pressa, sem discussão, sem oposições, sem debate.
Mas o tema desta crónica é bem a equipa de França e a sua participação neste campeonato do mundo. Talvez muitos dos leitores deste blogue até já estejam fartos de ouvir falar desta equipa e da novela que se vai «produzindo» em volta dela, por aqui também se têm esse sentimento.
Até ao jogo de ontem, ainda alguns responsáveis desta equipa pensava ou esperava num milagre para que esta equipa se qualificasse, mas a grande maioria da população francesa, não só não acreditava como desejava que a equipa fosse derrotada e voltasse para casa o mais rapido possivel. A França não gostou e não aceita a imagem que os seus jogadores deixaram desta nação. Existem petições em linha para castigar os responsaveis desta situação, existem petições para que os jogadores renunciem aos seus prémios de jogo e ofereçam o dinheiro às camadas jovens e à formação desportiva, fazem-se pedidos de explicação.
A imprensa francesa, seja ela especializada no desporto ou de cunho politico ou social, não poupou em nada a equipa, os seus dirigentes e responsaveis. Apenas algumas frases que apareceram nos jornais por toda a França: «Vae Victis. Malheur au vaincu», ou seja, «…afinal tudo tinha começado com uma batota», «a derrota foi o melhor que podia ter acontecido», «nunca deveriam ter posto os pés na Africa do Sul», «um campo em ruínas», «jogadores de uma mediocridade alarmante, podres de dinheiro, educados numa vida por vezes sem leis, sem valores, sem respeito, sem educação», «mais uma vez Parabéns».
A prestação da equipa francesa foi vergonhosa, foi uma calamidade, o fim do mundo. De desgosto público e popular vivido pela população pelos maus resultados desportivos, passou a tema politico pelo comportamento geral desta equipa.
Mas porquê tudo isto? Como se chegou a esta situação?
Os problemas em volta da equipa de França, há muito se conheciam, há vários anos, que se falava dos problemas internos de balneário entre staff e jogadores. Poucos foram aqueles que perceberam e aceitaram a continuidade do mesmo treinador depois da eliminação (também na primeira fase) no campeonato da Europa em 2008. No entanto, à medida que se aproximou este mundial muitos eram os que acreditavam no sucesso deste equipa e muitos foram os que davam esta equipa como vencedora do campeonato do mundo. E este é uma das chaves do desgosto. A França era campã do mundo já antes do campeonato e sem jogar, a França era campã do mundo porque ganhou em 1998. A França era campã do mundo porque as outras equipas não prestam e pouco valem. Rapidamente o patriotismo deu lugar ao chauvinismo.
Uma outra critica apontada ao comportamento dos «azuis» é o mau exemplo dado às camadas jovens e a todas as crianças que vêm nos jogadores os seus ídolos. Os formadores e responsaveis das camadas jovens falam já de centenas de inscrições a menos no início do ano, os milhares de jovens actualmente nas camadas de formação assimilam rapidamente os gestos e actos menos positivos dos seus ídolos e rapidamente contestam as decisões dos treinadores. E este foi o que me motivou a escrever sobre este assunto, porque nesta maranhada toda, no que diz respeito à formação dos jovens, pouco se ouviu falar dos verdadeiros valores do desporto, da alegria de jogar e fazer parte de uma equipa e que participa em grandes competições.
Os jovens são formados para serem o Zidane ou o Figo, Ronaldo ou Messi. A formação é feita, muito, à base de imagens temporárias de pessoas que tiveram e têem prazer em jogar, que mostravam prazer em defender as cores de um país e pouco à base dos valores humanos do respeito, do trabalho, da sinceridade, do Fair-Play. A maioria dos jovens conhece os jogadores Zidane ou Figo, mas poucos conhecem a pessoa e o homem que são o Zidane e o Figo, poucos conhecem os valores do respeito, da justiça, do trabalho, da disponibilidade para serem o Zidane ou o Figo dos próximos campeonatos do mundo.
Dois pontos, que achei importantes em volta desta novela, que me levaram a esta reflexão: o chauvinismo francês e as fracas bases na formação desportiva actual.
«A selecção gaulesa» – uma novela que vai continuar ainda por alguns (muitos) episódios, que vai fazer correr muita tinta nos jornais pelo menos aqui por França.
E viva Portugal.
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«Um lagarteiro em Paris», crónica de Paulo Adão
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