A cerveja é agora uma bebida de alta implantação popular e com níveis de aceitação que há muito ultrapassaram os do vinho. Mas nem sempre foi assim.
Há meia dúzia de décadas a cerveja inexistia nas nossas aldeias e era produto muito raro nas vilas e cidades do interior do País. A bebida comum era o vinho, que se bebia em abundância.
O vinho da altura era, na sua mor parte, de colheita local. A pinga, como o povo lhe chamava, era excelente retemperador de forças, se bebida a contento, o que nem sempre sucedia. Em casa, no trabalho agrícola, nas tabernas ou nos arraiais, o vinho corria abundante pela goela.
O hábito de beber vinho estava tão enraizado que quando a cerveja chegou à taberna aldeã foi recebida com muita desconfiança e passaram-se anos até ter aceitação. Eram excepção os que saíram das localidades de nascimento e foram conhecer mundo, sobretudo os militares e os estudantes, que trouxeram novos hábitos, sendo o de beber cerveja um deles.
Recordo o caso de um cavador que frequentava a nossa casa, de nome Maximino, que era um arreigado bebedor de vinho. O meu irmão, que chegara de véspera de Coimbra, onde cumpria o serviço militar, trouxera meia dúzia de cervejas e, num acto de carinho para com o jornaleiro, meteu-lhe uma garrafa nas mãos. O Maximino, que já ouvira falar naquela bebida, mas que nunca a havia provado, meteu o gargalo da garrafa na boca e embalou um golo. Mas mal provou a cerveja, achando-a amarga e gaseificada, cuspiu-a de imediato:
– Tome lá isto, Menino. Não é bebida a que esteja afeito! – disse enquanto se limpava com a cota da mão.
Foi uma risada!
Soube depois que o Maximino seguiu de nossa casa para a taberna, onde pediu um copo de meio quartilho e disse para os presentes:
– Isto é que é bebida que agrada a um home! Inda agora me fizeram dar um golo de cerveja na casa do Ti Chico. Aquilo é bebida do damonho, que manda uma espuma branca e sabe a giesta negral.
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«Tornadoiro», crónica de Ventura Reis
Ó tempo volta p’ra trás!! Bem dizia o Salazar que “beber vinho é dar de comer a um milhão de portugueses”. Aquilo é que era bom, nesse tempo de regime autoritário (não ditatorial, claro).
Sabe-se bem que , hoje, a cerveja é mais consumida que o vinho.
Mas, ainda se bebe muito vinho.
Os maiores consumidores de cerveja (os jovens), quando atingem uma certa idade (digamos, quando entram nos “entas”) já passam a gostar de vinho.
É a vida….