O Museu do Oriente comemorou este sábado, 9 de Maio, o primeiro aniversário. O Capeia Arraiana esteve à fala com a sua directora, Natália Correia Guedes, doutorada em Museologia e com fortes ligações ao concelho do Sabugal onde passa com a família «os tempos livres possíveis» na sua quinta recuperada, junto ao rio Côa, em Vale das Éguas.
A conversa com Natália Correia Guedes deu pano para mangas, ou para sermos mais rigorosos, para várias exposições. Ouvir falar de cultura a quem sabe e depois escolher o mais importante para escrever faz-nos perceber as dificuldades dos comissários das exposições quando seleccionam obras de arte. Abrindo uma excepção vamos dividir em duas partes a entrevista à directora do Museu do Oriente.
– No dia 9 de Março o Museu do Oriente festeja o seu primeiro aniversário…
– Até agora já visitaram o Museu cerca de 130 mil pessoas. A exposição inaugural «Máscaras da Ásia» foi prolongada em virtude do sucesso estando agora a ser desmontada. Durante este primeiro ano decorreram oficinas, workshops, conferências, cursos… espectáculos e concertos que esgotaram os 360 lugares do auditório, enfim, uma grande actividade paralela e onde se incluem as exposições, permanentes e temporárias, de gravura e fotografia.
– Há uma grande aposta nas escolas e nas crianças…
– Exactamente. É uma aposta prioritária. Há agendamento para visitas de escolas praticamente todos os dias. Os monitores fazem visitas guiadas sobre temáticas como, por exemplo, a presença portuguesa na Ásia ou marfins indo-portugueses. As escolas e os professores podem pedir visitas de estudo sobre temas que estejam a desenvolver nas aulas. Em tempos de contenção ter guias especializados em cada uma das matérias poderia obrigar a custos elevadíssimos mas o Museu do Oriente implementou um esquema inovador, pioneiro, que não implica a permanência do monitor. Há que conciliar os pedidos com a chamada do monitor e ele vem quando é necessário e consoante as disponibilidades sendo a despesa coberta com a receita. Os visitantes sabem que vão ter à sua espera um especialista e não um generalista. Imaginemos que as crianças querem um teatro. O monitor é igualmente actor e pode fazer um pequeno teatro relacionado com sombras chinesas, com marionetas ou teatro tailandês.
– Há muitos especialistas em Portugal sobre a cultura chinesa?
– Alguns. Começa a haver e a maior parte são antigos bolseiros da Fundação Oriente que estiveram em Macau, Timor ou Índia a fazer investigação nas áreas da História ou da Arte. Ou fotógrafos de renome. A próxima exposição temporária «Portulíndia» é uma exposição de fotografia comparativa entre Portugal e a Índia de um antigo bolseiro da Fundação.
– É um retorno do investimento da Fundação Oriente nos seus bolseiros…
– Exactamente. Até agora todas as exposições são da autoria de antigos bolseiros. A exposição «A obra de Edgar Martins» estava no Museu do Oriente quando o autor foi o vencedor do Prémio BES. Foi o máximo. Quando ganhou o prémio tinha aqui a exposição. A próxima exposição, do pintor Fausto Sampaio, vai ser inaugurada no primeiro aniversário. O artista andou pelas antigas colónias do Oriente, Índia, Timor e Macau.
– Ao fim do primeiro ano o Museu já está a seu gosto?
– Um Museu é uma obra em permanente evolução, em permanente actualização. Em matéria temática ainda faltam muitas iniciativas mas o que pretendemos é interessar é a comunidade. O nosso objectivo é interessar os portugueses e os estrangeiros com colecções afins para nos virem visitar e conhecer. Pretendemos promover o Museu nas zonas do Interior. Ainda há muito português que não consegue vir a Lisboa com facilidade.
– Há excursões para visitar o Museu do Oriente?
– Sim. De todo o País. A semana passada, por exemplo, tivemos um autocarro de Castelo Branco.
– E do Sabugal?
– Do Sabugal nunca aconteceu.
– A estratégia e a programação incluem levar as exposições do Museu do Oriente a locais que reúnam condições de preservação e segurança…
– A vereadora da cultura da Câmara de Leiria veio visitar o Museu e mostrou interesse em receber exposições nossas. Eles têm umas excelentes instalações num edifício que foi do Banco de Portugal e que vai receber a nossa exposição das máscaras em Agosto o período alto do turismo na região. Temos exposições programadas para Loures e para a Malaposta em Odivelas uma exposição de pintura muito interessante de Xavier Trindade. O espólio foi oferecido à Fundação pelos descendentes para ficar em Goa mas como a colecção estava nos Estados Unidos, houve um acordo que durante a viagem pudesse ser apresentada no Porto, em Leiria e Lisboa. O espaço físico do Museu começa a ser curto. Uma das exposições semi-permanentes intitulada «Deuses da Ásia» é constituída por exemplares que fazem parte de um espólio enorme, a colecção Kwok On (apelido de um coleccionador chinês) que durante uma vida juntou arte efémera oriental relacionada com o teatro e a vida quotidiana tendo organizado um pequeno museu em Paris. A determinada altura propôs à Câmara de Paris que recebesse a colecção mas esta não aceitou. Através de um amigo, que é professor na Universidade da Sorbonne, ofereceu a colecção ao doutor Monjardino e assim a Fundação recebeu, de uma só vez, 13 mil objectos. Neste momento temos expostos cerca de mil objectos ou que significa que durante 13 anos temos matéria para o piso 2 das exposições semi-permanentes. São objectos muito sensíveis e é necessário haver uma certa rotatividade. A actual exposição vai ser desmontada e vai ficar no seu lugar a colecção Ram Navami, um grande acontecimento festivo hindu e apresentada ao público como colecção Kwok On.
– Isso implica um tratamento muito grande de inventário?
– Temos uma senhora francesa Sylvie Gonfond, funcionária da Fundação, que orienta todos os inventários e que é comissária das exposições. O armazém no piso 3 está completamente ocupado de objectos com reserva que podem ser analisados, por exemplo, por investigadores respeitando determinadas condições pelo Museu.
(Continua.)
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Natália Correia Guedes, neta do escritor sabugalense Joaquim Manuel Correia (natural da Ruvina), já desempenhou vários cargos públicos, designadamente subscretária de Estado da Cultura (1990 e 91), catedrática da Universidade Católica, fundadora e directora do Museu Nacional do Traje (1975 a 79), directora-geral do Património Cultural, presidente do Instituto Português do Património Cultural (1980 a 84), directora do Museu Nacional dos Coches (1985 a 90), coordenadora do projecto «Inventário do Património Cultural (1997 a 2000), autora de diversos catálogos de exposições e monografias e comissária de exposições de arte em Portugal e no estrangeiro e mais recentemente comissária geral das Comemorações do V Centenário do Nascimento de S. Franciso Xavier.
jcl
“Aproveitei para deixar um catálogo, com um cartão pessoal, aos responsáveis do Museu do Sabugal dando conta da importância da relação que os dois museus podiam ter mas até agora ainda não recebi qualquer resposta.”
Para se compreender a cultura é necessário possui-la.
Como pode alguém ser sensível a algo que não conhece?
A falta de sensibilidade para as questões culturais tem sido uma constante no Sabugal, veja-se como tem sido tratados o património, os costumes, o turismo e os que cá estão a contribuir para o desenvolvimento do Sabugal.
Quando alguém com o seu empenho e muito trabalho faz algo para preservar, valorizar e promover o património do Sabugal é tratado com desprezo, difamado, desvalorizado, boicotado em vez de ser apoiado, reconhecido, acarinhado.
E se reclama por não concordar com este modus operandi, passa a ser o alvo a abater.
O reflexo sente-se no património desbaratado, destruído, desvalorizado.
Sente-se no autismo com que tratam quem quer contribuir para esta terra.
Sente-se nas pessoas que tem que partir porque aqui não conseguem viver.
Sente-se nas ruínas desta cultura que a todo o custo uns tentam preservar sem apoios e que outros destroem em proveito próprio.
Na guerra pelo desenvolvimento do Sabugal há dois lados, os que estão contra o Sabugal e os que estão a favor do seu desenvolvimento.
De que lado estão os responsáveis por estas atitudes?
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P.S. – Tenho a plena consciência que ao escrever estas linhas estou a lançar mais um grito a favor do Sabugal e que por isso, serei como tenho sido, o alvo da ira dos que apenas estão interessados em encher os bolsos à conta do erário público, enquanto o Sabugal vai morrendo pelos seus actos e omissões. Mas sou incapaz de fazer como outros que se calam por medo das represálias. Não me assustam as ameaças, ao fazê-lo apenas evidenciam a sua postura contra esta terra.