No tempo do Sabugal rural, um senhor feudal chamou dois homens para lhe cavarem um terreno. Dividiu-o em duas partes iguais e em cada uma delas ficou um homem. Na extremidade do terreno, na parte onde terminariam o trabalho, o senhor pôs uma jarra com um litro de vinho que seria dado como recompensa ao primeiro que acabasse o trabalho.
Por meia dúzia de centímetros, um deles foi o vencedor. Como tal, bebeu o vinho e matou a sede que deveria apertar depois de tanto esforço. E como foi o melhor, conseguiu trabalho indo tratar do resto dos terrenos do senhor. O outro? Fez o mesmo esforço, tinha a mesma sede, não provou do vinho, foi mandado embora e perdeu o sustento dele e o da família.
Presentemente em Portugal anda a falar-se muito na «cultura do esforço» e na «cultura do rendimento», juntando-lhes o prémio por desempenho. O que é isto? Não é mais nem menos senão retórica e cinismo para recompensar como uma atitude heróica a exploração de quem trabalha. O objectivo não é o de melhorar as condições de vida do trabalhador, mas sim de multiplicar os lucros do grande empresário, do grande accionista.
«Macroeconomia» – eu faço questão de sublinhar «macro» (grande), porque outro dia uma pessoa que tem um «micro» (pequeno) negócio, perguntou-me se eu tinha alguma coisa contra a iniciativa privada!!! Veja-se o que o sistema e a sua propaganda conseguem fazer às pessoas.
Falam no homem novo, numa nova mentalidade para o trabalhador, mas com este procedimento do prémio por desempenho está a fomentar-se o hiper individualismo e o egoísmo. Deixa de haver solidariedade e amizade, para surgir uma espécie de canibalismo, devorando aquele que está ao lado. Sempre houve bons e maus trabalhadores, e continuará a ser assim, o dinheiro nada modificará. Antes pelo contrário, vai dar lugar a novas e gritantes injustiças. Vai dar-se valor só aquele que tiver capacidade de fazer alguém rico.
E no Estado? Estará onde as injustiças serão maiores, porque o Estado não premeia o talento, mas sim a submissão. E não são estes modernismos que o nosso ilustre primeiro ministro impôs, que irão mudar as coisas. A ele, e aos seus correligionários, diremos que o homem quer coisas tão velhas, como o trabalho, o salário justo e o respeito. E se possível uma gestão pública baseada na honradez e no bem de todos. Há valores eternos que não dependem de modas nem de beatos do modernismo.
«Passeio pelo Côa», opinião de António Emídio
“Com o SIADAP até os “escovinhas” têm de apresentar números. Caso sejam beneficiados sem apresentar números, então é o avaliador que deve ser penalizado por se deixar levar…”
Deixa-me rir, como diria o Jorge Palma.
Na minha modesta opinião queria apenas dizer que não tenho medo de SIADAP’s ou seja lá o que for. Como Aqui já foi dito o que efectivamente deve ser avaliado é o desempenho em detrimento do tempo de serviço, essa sim uma forma injusta de progressão na carreira. O que me mete medo são as injustiças que podem surgir com o SIADAP. Afinal seja qual for a forma, qualquer avaliação corre o risco de ser injusta, e os professores e alunos, que já todos nós fomos, sabem bem disso. Mas ainda assim a actual parece-me ser a menos injusta.
Quanto aos professores, não consigo entender a razão pela qual não querem simplesmente ser avaliados. De certeza que uns são melhores que outros no desempenho das suas funções, como em todas as profissões, e é justo que seja premiado o seu desempenho. Ou não…? E digo que não querem ser simplesmente avaliados porque ouvimos constantemente dizer que esta avaliação é injusta, que deve ser suspensa, etc., mas não nos dizem quais são as alternativas. O que ouço com mais frequência dizer é que têm de preencher muitas papeladas. Porque será que aqueles que dão formação não criticam o preenchimento dessas papeladas? É que nas formações existem Dossiers Técnico-Pedagógicos de complexo preenchimento e com páginas em grande quantidade, e muitas vezes esses DTP’s são para “meia-dúzia” de horas de formação.
Gostaria apenas de dizer que nada é perfeito e tudo está sujeito a melhorias, e o SIADAP não é excepção. E os professores não pensem que são os únicos que têm “trabalhos de casa”. Todos os funcionários públicos ou outros trabalhadores que queiram ser bons profissionais dedicam muito tempo em casa, ou no local de trabalho em período pós-laboral, ao estudo de novas leis, novas regras, etc.. Quantas e quantas horas extras não pagas se fazem sem serem pagas? Temos de nos convencer que quer seja na função pública, quer seja no privado, é o trabalhador que mantém o seu posto de trabalho, ou seja, se alguém não render, então esse posto de trabalho pode perfeitamente ser extinto, e muitos de nós, trabalhadores, esquecem-se deste principio elementar, e depois…
Vamos deixar de pensar que somos vítimas do sistema e vamos enfrentar a realidade, que é como quem diz, lutemos pela justiça no trabalho e não pelo trabalho que temos de fazer e que não queremos fazer. Com o SIADAP até os “escovinhas” têm de apresentar números. Caso sejam beneficiados sem apresentar números, então é o avaliador que deve ser penalizado por se deixar levar…
O facto de gestores de topo terem dado a si próprios prémios chorudos mesmo com maus resultados/mau desempenho, não prova que os prémios de desempenho sejam uma coisa demoníaca, ou que o sistema não funciona. Prova apenas que há pessoas imorais e sem ética em todo o lado, e não preciso de pensar muito para ir buscar exemplos à esquerda.
O problema é que sempre houve graxas que estragaram a vida a muita gente.
Por outro lado e replicando ao Mono refiro que essa treta dos desempenhos está bem à vista , agora.
Os do topo do Banco de Portugal que deviam supervisionar, não supervisionaram nada e tiveram prémios de desempenho (e dos grandes).
O mesmo nos Bancos por esse mundo que foram às falência e arrastaram desemprego com eles. Grandes produtividades, grandes desempenhos e foi o que se viu. Essa cambada devia estar toda presa pelo que fez e ainda tem prémios de desempenho. E viva o neo- liberalismo (ou neuro-liberalismo como alguns lhe chamam) onde ninguém é explorado.
Governar por decreto, tem qualquer coisa de burocrático e contraditório, decretar para acabar com a burocracia usando mecanismos burocráticos de vigilância piramidal é como usar o fogo contra o próprio fogo, claro que funciona, de uma forma primária porque queimamos tudo. As pessoas também serão queimadas, por vezes naquelas qualidades que as tornam humanas e cujas características neste momento são desvalorizadas e no momento seguinte endeusadas. As pessoas sofrerão mais de ansiedade e doenças do foro psiquiátrico, e isso é já muito presente nalgumas profissões.
As pessoas trabalham demais para ganhar dinheiro, ficam doentes e depois gastam-no em tratamentos.
Vi há uns anos atrás, um desenho animado que representava numa primeira imagem através das janelas de uma fábrica, um homem cujas condições de laboração lhe provocavam uma terrível tosse. Numa segunda imagem, vemos que ali se produz um conhecido antitússico, que na imagem seguinte reconhecemos ser aviado ao dito trabalhador numa farmácia qualquer.
Esta é a consequência de um mundo mal regulamentado à escala planetária, que as multinacionais agradecem.
Mas poderá ser também um mal necessário ao surgimento de um novo equilíbrio.
O SIADAP é o sistema usado para avaliar o desempenho dos funcionários públicos. Ao lê-lo ficamos com a saber as inumeras papeladas que é necessário preencher, a começar pela auto-avaliação. O grande problema é que poucos serão os serviços que cumprem o que lá se pede e começa logo pelos prazos. Depois, alguns avaliadores sabem menos do que os avaliados e acabam por avaliar tudo por igual, independentemente do desempenho pessoal de cada funcionário. O SIADAP se não for para levar a sério, apenas vai servir para uns poucos ( os muito Bons ) subirem nas suas carreiras e os “escovinhas” continuam a marcar pontos, estes estão incluidos naquele grupo dos submissos e esquecem-se os talentosos.
A situação retratada no artigo é real, isto é, só chega longe quem consegue melhores performances para quem lhe paga o ordenado, o que não acontece na grande maioria da função pública onde o que se premiava era apenas o tempo de serviço… Ainda bem que isso mudou e se colocaram objectivos como em qualquer função numa empresa privada, pois estes que trabalham para objectivos tem o seu ordenado em risco quando a crise aperta, enquanto os funcionários do estado estão tranquilamente no seu posto que apenas por muito desleixo ou irregularidade poderá perder.
Se existem duas pessoas a fazer uma determinada função, onde apenas existe necessidade de uma, então que fique a que faz melhor!
Bom artigo, mas julgo que não se adapta a esta triste luta que os sindicatos da função pública travam com os governantes!
Sou obrigado a discordar.
Penso que os incentivos e os prémios de desempenho ajudam a aumentar a produtividade e, sendo a meu ver a baixa produtividade da maioria dos portugueses a razão pela qual estamos como estamos, não vejo nada que se oponha a esses mesmos incentivos.
E como disse o mono, tal não implica estar a prejudicar ninguém!
Pelo texto, presumo que não tem um prémio de desempenho. Eu tenho e não vejo nenhum “hiper individualismo e o egoísmo”, até porque a ideia do prémio de desempenho não implica que eu tenha de fazer melhor e mais depressa que o meu colega do lado, nem que tenha de lhe cortar os pulsos para conseguir os meus objectivos, muito pelo contrário, é tudo feito à base de partilha de conhecimentos e ajuda mútua.
E assim de repente, parece-me que é assim no geral e ninguém se sente explorado e tal.
Mas se calhar foi o sistema e a sua propaganda que me fizeram alguma.
Parabéns pelos seus comentários.
Parabéns pelos seus artigos de opinião.