Conheci Jesué Pinharanda Gomes há 12 anos, quando exercia funções de presidente da direcção da Casa do Concelho do Sabugal. Verificando que o nosso grande escritor não estava registado como associado, indaguei pela sua morada, que me foi facultada pelo Adelino Dias, antigo presidente da Casa, e comecei a expedir-lhe o jornal Sabugal, órgão informativo da associação.
Entretanto, encontrara nos escaparates o livro de Carlos Alberto Marques «A Bacia Hidrográfica do Côa», recentemente editado, com prefácio e notas de Pinharanda Gomes. Publiquei no boletim um pequeno texto acerca do livro, onde enalteci o papel do escritor de Quadrazais. Logo que o jornal foi remetido, recebi carta do Pinharanda, agradecendo a referência ao livro e ao seu nome e o envio regular do jornal, vindo em anexo um cheque com uma quantia para ajuda da Casa do Concelho. Sensibilizado, telefonei-lhe, e logo marcámos entrevista.
À hora aprazada, num dos primeiros dias de Janeiro de 1996, Pinharanda Gomes entrou na Casa em absoluta descontracção, de ar sorridente, mão estendida e falar desenvolto:
– Sou o Pinharanda, prazer em conhecê-lo!
Palavras de circunstância e logo, dirigindo-se aos que dobravam e etiquetavam a última edição do jornal:
– E este pessoal? Como se chamam, de onde são?
Depois conversámos longamente. Preocupava-me a falta de iniciativas de carácter cultural, e queria realizar algo por ocasião dos 700 anos do Foral do Sabugal.
– Tenho uma proposta. Ouça…
Puxou de uma caneta, pediu papel, e traçou, rápida e metodicamente, as linhas mestras do projecto de um congresso a realizar no Sabugal em Novembro desse ano. As datas, os nomes, os temas, os meios logísticos, tudo devidamente enquadrado e explicado. Uma capacidade de raciocínio e de exposição marcantes, uma objectividade invulgar.
Proposta elaborada, perguntou-me:
– Quando me contacta?
Estava baralhado. Argumentei que havia agora necessidade de elaborar um projecto, um orçamento, ver da disponibilidade financeira, arregimentar apoios, enviar um ofício à Câmara,…
– Muito bem, mas em 30 de Setembro tudo tem que estar acertado, e é melhor marcar já a próxima reunião.
Dali nasceria o Congresso Comemorativo do VII Centenário do Foral do Sabugal, realizado nos dias 9, 10 e 11 de Novembro de 1996, na sede do concelho.
Marcou-me a postura daquele homem simples, mas grande erudição. As ideias saíam-lhe fluentes, precisas e arrumadas, mostrando um enorme caudal de sabedoria.
Dali resultou uma grande amizade, solidificada com frequentes contactos e encontros. Um dia revelou-me, em confidência, o desejo de deixar os seus livros ao concelho do Sabugal. Depois de muitas conversas acerca do assunto, pediu-me que contactasse a Câmara em seu nome, para uma primeira abordagem.
Em Março de 2007 reuni com o presidente da Câmara do Sabugal, Manuel Rito, expondo-lhe a pretensão de Pinharanda Gomes e dando conta das suas condições, que se resumiam a quase nada: que os seus livros fiquem em sala própria e que estejam abertos à fruição pública.
As coisas andaram devagar, mas finalmente viu-se luz ao fundo do túnel, como de resto o Capeia Arraiana noticiou há alguns dias: o Sabugal vai de facto receber a biblioteca do seu filho ilustre e vai até criar-se o Centro de Estudos Pinharanda Gomes.
Um momento marcante para o concelho do Sabugal, que fica mais rico ao receber o espólio do escritor, que assim se vê reconhecido pela terra onde nasceu e de onde há longos anos partiu.
«Contraponto», opinião de Paulo Leitão Batista
leitaobatista@gmail.com