Continuando a viajar pelas páginas do interessante «Manual Político do Cidadão Português», obra escrita por Trindade Coelho em 1906, faremos agora referência à questão religiosa, na altura centrada na polémica reaparição do clero regular, após um período em que conventos e mosteiros haviam sido extintos.
No seu Manual Trindade Coelho fala-nos no colégio de Aldeia da Ponte, no concelho do Sabugal, a pretexto da questão religiosa. O dito colégio era na altura um dos que em Portugal, a coberto de se dedicar ao ensino e à beneficência, se mantinha em funções, com o beneplácito das autoridades.
Em 1834, pelo decreto de 28 de Maio, Joaquim António de Aguiar extinguira todos os conventos, mosteiros, colégios, hospícios e demais casas religiosas de todas as ordens regulares. Joaquim António de Aguiar ficaria conhecido por «Mata-Frades», por ter sido autor de tão radical legislação, inspirada na luta contra o jesuitismo, que se temia estar de novo a instalar-se em Portugal.
Porém em 18 de Abril de 1901 saiu um decreto de Hintze Ribeiro, que veio estabelecer a forma como se podiam constituir congregações religiosas, conquanto se dedicassem exclusivamente à instrução ou beneficência. Na decorrência da nova disposição legal voltaram a surgir conventos e mosteiros, mas tudo a coberto de se tratarem de congregações «docentes», que apenas tinham em vista ensinar.
Dentre as associações religiosas que surgiram com o decreto, Trindade Coelho enumera no seu Manual Político a «Associação do Colégio de Aldeia da Ponte», instalada numa aldeia raiana do concelho do Sabugal. A pretexto do ensino, muitas instituições refundaram o espírito jesuíta e isso também se terá passado em Aldeia da Ponte. Trindade Coelho cita mesmo uma carta, datada de 19 de Março de 1906, de um cidadão da aldeia que denunciava a situação: «Igreja aberta continuamente. Fanatismo em redor e consideração cá em cima, do sr. Arcebispo. O resto V. prevê». Outra carta, datada de 25 de Março do mesmo ano, rezava: «O recolhimento de Aldeia da Ponte contava há dois anos 90 e tantos alunos. Há tempos, para iludir a lei, foi-lhe dado o carácter de oficina, fazendo-se aquisição de máquinas».
Nova carta, de 23 de Março: «No recolhimento não há, desde há muito, oficinas, aprendizes, nem ensino propriamente dito. Há meia dúzia de padres estrangeiros, salientando-se o seu fanatismo. Tendo-se coberto com o véu do ensino, este mesmo já o puseram de parte. O instituto ficou o que era: um centro de missionários jesuítas.
O jesuitismo tem hoje na Guarda um dos seus focos mais activos, sendo por ele combatido sem trégua o clero secular da diocese».
Para um melhor conhecimento do processo do antigo colégio de Aldeia da Ponte poderá consultar-se a série de artigos dedicados ao tema por Esteves Carreirinha na coluna «Ecos da Aldeia».
plb
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