A doação da colecção de arte de António Piné a uma instituição sedeada em Lisboa, em detrimento de Pinhel, terra natal do coleccionador, diz bem do estado em que está o Interior em matéria de sensibilidade cultural.
O pinhelense António Piné, coleccionador de arte contemporânea cujo espólio está avaliado em cinco milhões de euros, doou a sua colecção à Associação Nacional de Farmácias. O legado reúne 140 obras de arte, incluindo quadros de Vieira da Silva, Picasso, Joaquim Rodrigues, Arpad Szènes, Júlio Pomar, Cargaleiro e Batarda, bem como uma escultura de Rui Chafes.
Ao que consta foi com muita mágoa que o coleccionador, farmacêutico de profissão, anunciou a sua decisão. Isto porque esperou 12 anos para que a Câmara Municipal de Pinhel, a quem pretendia doar a colecção, encontrasse um local para sua instalação. Farto de esperar, cansado da falta de sensibilidade da edilidade para a questão, e talvez ciente da verdade do adágio de que ninguém é profeta na sua própria terra, António Piné decidiu oferecer a obra a quem a valorize e dela se orgulhe.
A indiferença do edil de Pinhel para com o espólio artístico de António Piné é o exemplo do laxismo militante que importa combater para que as nossas terras tenham melhor futuro.
Esta história de Pinhel, concelho próximo do Sabugal, revela bem a falta de sensibilidade dos nossos autarcas para com as questões da cultura. Um festival de realejo, uma garraiada, um concurso de tunas, uma festa de comes e bebes, enchem-lhes melhor as medidas. Foi assim que a Bienal de Artes do Sabugal, uma iniciativa única na região, que na década de 1990 se realizou em três edições, teve o seu ocaso. O certame foi substituído pela festa da concertina, que entretanto também se finou.
Será tempo de se olhar para os valores da nossa terra, procurando uma acção concertada e estruturada que garanta a realização de iniciativas culturais de prestígio, revelando sensibilidade para o que de bom se produz nesse domínio.
«Contraponto», opinião de Paulo Leitão Batista
leitaobatista@gmail.com
Paulo
Relembras as Bienais, como é possível ter posto em causa o trabalho de Guy Ferreira?
Homem das Artes que trouxe para as Bienais trabalhos simples mas outros de um certo valor artístico!
Alguma vez se procurou saber o valor deste património?
Ao contrário de Pinhel, estas obras ainda se encontram na cidade de Sabugal…
Conheço o Sr. Piné vai para alguns anos. Convesámos horas infindáveis sobre arte contemporânea portuguesa e da sua colecção que de facto era muito interessante. Tive oportunidade de me deleitar com alguns quadros de artistas contemporâneos portuguesas da colecção deste meu amigo. Tinha umas peças interessantíssimas de todos os artistas que indicas, mas de me causar inveja era um Saura, que o meu amigo António Piné possuia. Remou contra a maré na Guarda com a galeria de arte que abriu, mas a insensibilidade e desprezo do público pelas artes plásticas, votou ao insucesso esta sua iniciativa. O seu relacionamento privilegiado com o Manuel de Brito, o maior galerista português do século XX, tambem ajudou a que o meu amigo António Piné consolidasse esta colecção. Em tempos comprei-lhe um carvão da Graça Morais, que com orgulho exibo numa das paredes da minha sala. A notícia apanhou-me assim de sopetão e desprevenido e apesar de o ter procurado ainda não consegui as explicações do meu amigo para este acto. Sabia que tinha interesse em doar este espólio para a sua terra que é Pinhel. É criminoso que este seu gesto não tenha tido acolhimento e o carinho que se exigia. Olha Paulo, a câmara socialista da Guarda tambem trocou uma peça do Rui Chafes alusiva ao 25 de Abril, por um “G” de muito mau gosto à entrada da cidade da Guarda. Consta-me que o grande Rui Chafes foi muito maltratado por esta gente. Com esta falta de sensibilidade, por parte dos políticos que nos governam é dificil sairmos deste marasmo.