O Capeia Arraiana esteve à fala com o Procurador-Geral da República, Fernando Pinto Monteiro, uma das importantes personalidades do Estado português. A conversa decorreu na Casa do Concelho do Sabugal, em Lisboa, durante um jantar de homenagem dos seus antigos alunos da UAL. A sua afirmação «Ainda hoje me lembro dos ninhos de pássaros nas árvores da escola do Sabugal» é inolvidável e merece o nosso destaque.
Fernando Pinto Monteiro, é natural da freguesia de Porto de Ovelha, no concelho de Almeida. Dividiu a sua infância e juventude entre a terra natal e o Sabugal onde os pais se instalaram quanto tinha quatro anos de idade. Recuperou e mantém a casa que os tios lhe deixaram na aldeia de Badamalos e onde vai sempre que pode para tratar do jardim.
Acedeu a ter connosco uma conversa descontraída numa noite de sábado na Casa do Concelho do Sabugal onde foi o convidado de honra no jantar dos finalistas do curso de Direito da Universidade Autónoma de Lisboa (UAL) a quem deu aulas até aceitar o convite para Procurador.
«O bucho é uma especialidade da Beira que eu muito aprecio. Não há enchidos como os do Sabugal ou, então, é o gosto da infância. Traz-me recordações da adolescência quando, com os meus irmãos, comíamos bucho em casa dos avós de Porto de Ovelha. São sabores únicos. É um petisco que já não saboreava há muito tempo», começou por nos dizer a propósito de ter sido surpreendido com um aperitivo de bucho arraiano no início do jantar.
– Já conhecia a Casa do Concelho do Sabugal?
– Convidaram-me por diversas ocasiões mas foi hoje a primeira vez que visitei a Casa. Vou levar comigo a inscrição de sócio que José Lucas, meu amigo de há muitos anos, me entregou. Se a vou preencher? É com muito gosto que serei sócio da Casa do Concelho do Sabugal.
Para Pinto Monteiro a noite foi de recordações, de relembrar amigos e conhecidos do Sabugal. «Tive a alegria de encontrar amigos da adolescência e de rever os meus alunos da UAL. É um conjunto de sensações que se completam. É raríssimo aceitar convites. Entro na Procuradoria às nove e meia da manhã e nunca saio antes das nove, nove e meia da noite de segunda a sábado. É uma função muito absorvente.»
– O cargo é muito diferente daquilo que imaginava?
– O Presidente Jorge Sampaio disse-me que sabia que o cargo era muito difícil e exigente. Estamos a atravessar uma fase atribulada porque a aplicação da legislação no nosso País sofreu grandes alterações e há muitas leis novas ou que foram revistas. O Procurador tem que se pronunciar com decisões correctas.
– Que recordações tem do Sabugal?
– A infância e a adolescência andam sempre comigo. Ainda hoje me lembro dos ninhos de pássaros que havia nas árvores na escola do Sabugal. O professor Cavaleiro era um homem extraordinário. Tinha uma alegria de vida contagiante. Adorava a vida. E a propósito de professores vou contar-lhe um episódio curioso. Estava na Procuradoria e a minha assistente veio dizer-me – «Está a falar na rádio a sua professora do Sabugal» – Mas eu nunca tive uma professora! Percebi que alguém resolveu passar-se por minha professora.
…Continua a recordar a sua juventude à beira do rio Côa e do castelo das cinco quinas.
– Somos quatro irmãos, mas só o mais novo nasceu no Sabugal. O António (Pinto Monteiro) é professor catedrático em Coimbra. É solicitado para dar muitos pareceres. Deve estar a chegar da China. O ano passado esteve em quatro continentes. Ainda hoje mantenho contacto com os meus amigos desse tempo. Fui, também, muito amigo do Fitz Quintela, irmão da pintora Helena Liz. Andámos no Liceu da Guarda e formou-se comigo em Lisboa.
[n.d.r. O jovem jurista do Sabugal, Fitz Quintela, foi o pai dos estatutos da Casa do Concelho do Sabugal em 1974 e faleceu tragicamente meses após a assinatura da escritura, baleado por um agente policial por alegadamente não ter parado numa operação de stop.]
No final do jantar enquanto discursava, o presidente da Casa, José Lucas, cometeu uma inconfidência que fez rir Pinto Monteiro: «Conheço o senhor Procurador desde a juventude, passámos férias juntos em Aldeia do Bispo e agarrámos os dois ao forcão, não porque fossemos muito corajosos, mas para agradar às chicas espanholas.»
Aproveitámos para lhe perguntar se ainda recordava esse feito. «É verdade. Agarrei ao forcão em Aldeia do Bispo quando tinha 15 ou 16 anos. Costumava passar oito dias em casa da família Mansos e, claro, acompanhava com os da minha idade. Já depois de formado, devia ter 22 ou 23 anos, passei férias em casa dos pais do Lucas e lembro-me que nesse ano fomos para as touradas de Fuenteguinaldo.»
– Na entrevista ao «Expresso» disse que não usava o cartão de crédito da Procuradoria e tentaram investigar a sua vida…
– Nunca me habituei a ser rico nem a ser pobre. Não tenho hábitos de rico. Gosto de pagar em dinheiro. Não uso cartões. O da Procuradoria está lá fechado num cofre. Dei aulas sem receber um tostão. Podem investigar-me à vontade. Ofereceram dinheiro a uma jornalista para tentar descobrir algum ilícito na minha vida. Se está a contar com esse dinheiro para comer vai morrer à fome.
A agradável conversa teve de terminar. O professor Pinto Monteiro começou a ser solicitado pelos seus alunos para dedicar e assinar as fitas de finalistas do curso de Direito da UAL.
O nosso agradecimento pela disponibilidade e simpatia do Procurador-Geral da República, Fernando Pinto Monteiro para com o Capeia Arraiana. Um beirão genuíno e um sabugalense que nos enche de orgulho.
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