A primeira edição do romance «Maria Mim», de Nuno de Montemor, foi publicada em 1939. No ano anterior, Nuno de Montemor, que repartia a sua vida entre a Guarda e Lisboa (aqui, para tratar das edições dos seus escritos) passou por Quadrazais, onde nascera em 1881, embora os seus pais fossem de Pêga, para se documentar acerca da vida e da cultura aldeãs.
Imaginou um quadro social realista (o contrabando fronteiriço) no ambiente do cordão militar que, nos fins do século XIX foi instalado ao longo da Raia, para evitar o contágio da peste que assolava Castela. A presença do cordão em breve constituíu um obstáculo à vida económica dos povos raianos, que até aí beneficiavam do pouco interesse que o comércio fronteiriço, mesmo que ilegal, merecia do policiamento militar sob a protecção do liberalismo constitucional.
De facto, os povos, desde sempre praticantes do comércio transfronteiriço, mal sabiam que tal ultrapassava os seus consuetudinários direitos de passagem. Enfim, no cenário da pobreza e da ocupação militar, a história de um amor de perfil quase absurdo: a paixão mútua de um tenente do cordão e de uma quadrazenha enamorada, Maria Mim.
Quando o romance foi publicado, o movimento literário português recebia as primeiras lufadas do neo-realismo, ou do realismo socialista, que apostava no romance como veículo promotor do socialismo. «Maria Mim» não visou tal objectivo, mas concitou os leitores para o aspecto social, olhado de um ponto de vista cristão, num enredo que apela, não à revolta, mas à piedade. Sobretudo à piedade por pessoas e vida precária, de economia pobre, de horizontes sem horizonte. E à piedade por uma jovem que, inocente, acalentou no seio um amor impossível, mas ao qual não cedeu em termos físicos, chegando a ferir e a deixar cicatriz, no pulso do amado, quando este ousou exorbitar da sua fraqueza. E, de facto, «Maria Mim», um amor perfeito, viaja por todo o drama, como figura de pureza imaculada. Quase tragédia, o romance fecha com a heroína, abandonada pelo amor, adormecendo num tapete de relva do santuário de Nossa Senhora da Póvoa.
Belíssima peça literária e poética, o romance foi muito lido, tendo sido feitas três edições, a última das quais (parece haver agora uma quarta) há uns bons 40 anos. Há dias, indo a uma papelaria, para fotocopiar a capa do livro, logo a senhora que me atendeu, olhou e disse: «Eu li este livro. Era da minha sogra.»
Aliás, sem prejuízo da obra poética, este romance é a obra-prima de Nuno de Montemor – que constrói um jogo estético com os elementos do sofrimento, da morte e do amor.
«Carta Dominical» de Pinharanda Gomes
pinharandagomes@gmail.com
Bom dia.
Ando à procura deste romance “Maria Mim” há muito tempo! Ainda há publicações disponiveis para compra? Gostaria de adquirir, mas não sei se existe e qual a editora!? Se me puder ajudar agradeço!
Aguardo resposta.
Cumprimentos
Helena Cavaco