Escritor de afectos e de selectivos temas, Eduardo Sucena terá dedicado as suas principais obras à cultura de Lisboa.
Desde logo o volume Lisboa, o Fado e os Fadistas (1992) e esse que se considera o seu trabalho inevitável, o Dicionário da História de Lisboa. Esta foi a terra da sua vida após a que viveu a trabalhar em Angola. A Guarda, porém, sempre esteve na sua mente e no seu coração.
Filho de uma boa família de comerciantes de artigos religiosos, inicialmente situada no rés do chão da casa nº 17 da Rua Infante D. Henrique (no 1.º andar vivia o casal do farmacêutico sabugalense Albertino Teixeira e Isaura Freire Gomes Pinharanda) aquela casa passou de pois para a Rua Alves Roçadas. Em Lisboa tertuliava assiduamente com alguns amigos escolhidos, entre eles o Dr. João Bigotte Chorão e outros, como os colegas do grupo de amigos de Lisboa, a cujos corpos gerentes pertenceu.
Estava em vias de, finalmente, publicar o seu testamento espiritual a favor da Guarda quando, poucas semanas antes, já o livro do testamento se achava impresso e a data de apresentação na Guarda já marcada para o dia 17 de Fevereiro deste ano, a irmã morte o surpreendeu. Em todo o caso, a apresentação foi levada a efeito, tendo sido orador o amigo Dr. J. A. Alves Ambrósio, que teve a gentileza de me facultar o texto, melhor, o impressionante testemunho de vida e de cultura que leria naquela data.
Já obtive o livro A Guarda, a minha Montanha Mágica (Ed. Veja, 2016). O volume tem duas partes, na primeira sobressaindo As memórias sobre a paisagem social e urbana da Guarda nos meados do século XX. Na segunda parte, eleva-se o brilhante ensaio acerca do homem e escritor que foi Nuno de Montemor. Há outros temas, mas estes foram os que mais nos interessaram. De Nuno de Montemor releva um conhecimento rigoroso e afectivo, que depende da leitura dos livros e do conhecimento pessoal. Entre as novidades esclarece que Nuno de Montemor de facto não esteve em França como capelão na I Guerra, e revela a entrega do seu espólio ao lactário Dr. Proença da Guarda, sugerindo que este fosse transformado num centro de estudos da obra do escritor.
A descrição da Guarda, rua por rua, casas mais importantes uma a uma, as tertúlias, os cafés, as actividades económicas, as escolas, os professores, os médicos, os padres, as figuras típicas, enfim, um mundo de cor e de estuante seiva.
A consideração com que nos honrava levou-o a por o nosso nome entre os colaboradores do jornal A Cabra, que ele fundara e dirigira em 1946. Ora, nesse ano, o autor destas linhas tinha a idade de sete anos. Creio que confundiu com o meu primo José Gomes Pinharanda. Nada de mal. A descrição da Rua Marquês de Pombal dá um salto da mercearia Canotilho para um prédio novo e para a Veritas. Ora, antes disto havia o prédio da Pensão Alegria, onde, no rés do chão, se instalavam a casa de ferragens Vitória, o alfaiate Vinhas, o barbeiro Ferreirinha e, com mais espaço, a farmácia de Albertino Teixeira, onde se reunia a mais política das tertúlias boticárias da cidade.
Tudo muito bonito nesta pintura de Sucena.
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«Carta Dominical», por Jesué Pinharanda Gomes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Fevereiro de 2007 a Setembro de 2018)
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