No próximo fim-de-semana vá ao Casteleiro para a Festa da Caça. Nas notas finais desta peças, encontra forma de aceder ao Programa. Agora, é tempo de falar da torre da igreja do Casteleiro – uma aquisição do Povo da terra por troca com o seu direito de passagem por umas terras ali perto da mesma igreja. Uma história do que se passou por volta de 1950. Leia que vai gostar de saber…
A história que vou contar já foi escrita e publicada há uns anos. Mas vale a pena trazê-la aos leitores do «Capeia».
A construção da torre do Casteleiro tem uma história interessante por detrás. Uma situação mesmo à moda do antigamente em que um senhor abastado não se importa de oferecer uma obra cara desde que não lhe passem nas suas terras…
De facto, esta torre não existia até 1950. Até essa altura, no topo da Igreja Matriz, o que existia era um campanariozinho. Uma construção muito mais simples e mais baixinha. Construído no modelo que nesse tempo era habitual em todas as Freguesias. Um campanário como os que havia à data em que fora erigida a Igreja, no fim do século XIX (julgo que perto de 1890).
Um campanário pequeno e simples demais
O campanário, sem portas, tinha um só sino, como agora na torre, ao contrário do que se conhece de muitas terras: campanários com dois sinos.
No Casteleiro havia outro sino, mais pequeno, uma sineta, mas na Igreja Matriz original: a Capela do Espírito Santo, ao Reduto.
Um aparte: a função do sino numa aldeia era muito importante e não só por motivos religiosos mas também por razões que hoje diríamos de Protecção Civil: quando havia fogo (um incêndio), tocava-se o sino em forma rápida de alarme e era o alerta geral.
Por isso (ou melhor: também por isso), compreendo muito bem a grande festa que houve na aldeia e nos corações dos casteleirenses quando, nas vésperas da inauguração da torre nova, o Sr. José Carlos (Mendes Figueiredo), à data Presidente da Junta de Freguesia, escolheu e mandou colocar e experimentar o novo sino (o velho dever ter ido por troca).
O campanário original era tão baixinho e acessível, que os miúdos chegavam a ir para lá brincar. Às vezes até furavam as regras sagradas de não se tocar o sino na Sexta-Feira Santa – e levavam tareia por causa disso.
E acrescento uma nota imaginária, de carácter ecológico: se calhar, era tão baixinho que nem sequer atraía as cegonhas que depois, na minha meninice, nunca deixavam de nos visitar em cada primavera e instalar-se no alto da torre, ao pé do relógio. Coisa que hoje parece que já não fazem, julgo que por causa do aquecimento global – mas podem vir a fazer outra vez.
Uma torre maior
Dizem-me que sempre fora desejo do Povo ter uma torre maior, com mais dignidade. Uma torre que impusesse o respeito que a terra achava que merecia.
Mas uma torre dessas implicava muito dinheiro. Era preciso contratar quem a construísse. Esses pedreiros tinham de vir de fora. Maior a despesa.
Pois há 60 e tal anos, tornou-se realidade esse desejo do Povo da minha terra: a torre concretizou-se, por negociação feita na altura.
A coisa terá sido falada e negociada ainda no tempo do Senhor Padre Sapinho e acabou por se concretizar e ser inaugurada quando era ali Pároco o Senhor Padre Campos.
Uma torre oferecida por troca
Estava-se em 1950. Mas quem, como e porquê fez esta oferta da torre
Daniel Machado refere o essencial no seu livro «Casteleiro», a páginas 151-152: foi uma troca.
Parece que nem toda a gente terá estado de acordo, porque o velho campanário era uma relíquia. Mas a conversação fez-se e a torre construiu-se. E lá está ela, altiva e imponente, para os padrões da terra e da época, um orgulho para todos nós.
Mandaram-se vir os pedreiros de Alcains, trazidos pelo Sr. Venâncio, pedreiro que já vivia na terra.
O Povo foi acompanhando a obra magnífica que crescia dia-a-dia e a sua inauguração foi feita em dia de grande festa.
Direito de passagem
O que é que foi trocado? A coisa mais importante, pela qual se lutava e até se matava se «necessário» fosse: o direito de passagem.
A situação era a seguinte (para quem conhece): estão a ver toda aquela extensão de terras que vai desde as traseiras do Centro Cultural até à Ribeira? Pois isso tudo chama-se «o Alvarcão» e pertencia ao Senhor Manuelzinho Fortuna, que habitava na sua casa grande da rua da Igreja.
Mas essas terras tinham um grande senão: é que eram atravessadas pelo Povo para as pessoas acederem aos seus terrenos do outro lado dessa propriedade. Era um vai-vém constante: nesse tempo, toda a gente trabalhava no campo, toda a gente cultivava os seus bocadinhos todos.
Portanto, o Alvarcão era devassado, no entender do seu proprietário, que preferiu oferecer a torre a ter de se calar com a passagem permanente de tanta gente pelas suas terras.
A vereda de atravessamento entrava no local exacto onde hoje é o portão de acesso ao que foi um dos mais importantes lagares de azeite do Casteleiro.
Foi pois fechada a dita vereda, que mais parecia um caminho, foi colocado um portão e construído aquele grande muro alto, bem feito, que cerca o Alvarcão todo pelo caminho abaixo até à Ribeira e, depois, já mais baixo, ao longo da Ribeira, para jusante – digamos, na direcção da nascente da Ribeira…
Tudo isso, só possível por troca com a construção da nova torre, nos anos a seguir à 2.ª Guerra Mundial.
Um galo lá em cima…
E a torre até tinha um galo em cima, na rosa-dos-ventos – como toda a torre que se prezava em Portugal e algumas ainda têm… Não sei mesmo se não se podia pensar em repor esse adereço.
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Notas
1. No próximo fim-de-semana é tempo da Festa da Caça. Se puder, desloque-se ao Casteleiro e divirta-se. Veja o Programa… (Aqui.)
2. Consulte todos os dias «Serra d’Opa», gazeta regional no Facebook… (Aqui.)
3. Visite e faça-se membro do Grupo Aberto e Público do Facebook chamado «Descendentes do Concelho do Sabugal». É… (Aqui.)
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«A Minha Aldeia», crónica de José Carlos Mendes
(Cronista/Opinador no Capeia Arraiana desde Janeiro de 2011)
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