Sinto a escrita como hipótese de admitir pensamentos intersectados em sentires que embalado em vivências recheadas de argumentos e sensações. Escrever é, pois, uma regularidade minha que cumpro numa sucessividade de registos, apostos em brancuras motivadoras, vulgarmente chamadas folhas de papel.
Partir para o preenchimento da amplitude da página vazia é como complementar a alma com a mente. É cumprir a afinidade do encontro entre as palavras e o espírito. É assumir uma atitude capaz de rasgar o semblante dos dias ou, até, o descanso das noites.
Colocado perante a folha branca elimino receios, busco pistas e razões, corto silêncios interrompendo-os até ao limite da minha sugestão, até ao sobejar do último suspiro da minha caneta que deixo, por fim, pousada sobre a mesa de trabalho ou (quantas vezes!) sobre a mesinha de cabeceira. Aí ela repousará enquanto o sono cuidar de me preparar para novas labutas. E o dia seguinte terminará, ou não, com novos momentos de progresso na escrita em busca do puzzle final.
Ambas, caneta e folha, há muito se habituaram a esperar por mim, pacientemente, até que, num ou outro dia, num ou outro momento, se me abra a mente e o espírito.
Confesso que há alturas em que deixo de ter palavras e se me esvai a vontade de as transcrever. Mas, apesar dessa confessa e descontinua inspiração, não escrever é ainda pior. A vontade de parar é tão passageira quanto se torna inevitável a minha outra vontade de jorrar palavras.
Regresso, então, com alguma frequência, à escrita. Escrevo uma e outra vez, não apenas para me expressar, mas, para me expressar em frases brandas e em dizeres ternos com os quais me habituei aconchegar o que escrevo. É esta a minha maneira e é-me difícil, quase impossível, superar este agrado.
Escrevo, sim, por simplíssimo gosto, apenas por prazer, ainda que nem sempre publique. Escrevo, também, para me encontrar a mim próprio no labirinto dos caminhos da vida. A escrita ajuda-me a olhá-los e a seleccioná-los. E escrevo ainda… porque escrevo.
Eis, portanto, algumas das razões que me levam a escrever nalguns dias e nalgumas noites entre dias.
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«Terras do Jarmelo», crónica de Fernando Capelo
(Cronista no Capeia Arraiana desde Maio de 2011)
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É uma maravilha o que escreve, é um poema completo, um desfiar de novelos macios ao saber duma pena leve e obediente que me extasia. Obrigada Fernando
Amigo Capelo:
O que tenho lido dos teus artigos, mostra-me que tu não fazes parte da – doxa – dominante, dessa ditadura invisível da vulgaridade e da mediocridade. Continua assim, pensa livremente, só assim encontrarás a verdade, mas isso traz muitos problemas… Alguém disse : « não tens inimigos ? Como não ? Nunca disseste a verdade, nem nunca amaste a justiça ? ». Peço-te como amigo, sê Livre !
António Emídio
Caro FCapelo:
A sua escrita, mesmo quando apenas explica algumas das razões por que escreve, é algo que apetece ler. Por isso, para além de escrever porque gosta, eu acrescentaria – se é que lhe posso pedir isso – que deve escrever também por que os leitores, entre os quais me incluo, gostam do que escreve.
A sua escrita transmite sempre algo de novo, mesmo que seja para descrever coisas e sensações menos novas mas nem por isso menos belas.
Felizes podem considerar-se as palavras que escreve quando as aconchega umas com as outras e que acabam por formar as frases com que nos brinda.
Um abraço
JFernandes