Continuamos a transcrever excertos do caderno de apontamentos do Sr. Dr. Francisco Maria Manso, existente na Santa Casa da Misericórdia do Sabugal, onde constam pormenores interessantes acerca da edificação do Hospital do Sabugal.
Outubro de 1934
«Largo tempo sem escrever nestas memórias o seguimento das obras no hospital. Alguns factos se deram dignos de menção: Feita a petição ao Ministro das Obras Públicas para subsidiar as obras do Hospital, depois de muitos pedidos e bastante morosidade nos despachos e devido certamente ao muito interesse mostrado sempre Governador Civil Sr. Dr. A. Borges Pires, chegou enfim a notícia da comparticipação do Estado nas Obras, em cem contos!!! Preciso se torna executar trabalhos para receber esta verba, mas o recebimento há-de ser um facto, como um facto indiscutível há-de ser a sua conclusão e breve abertura ao desempenho da santa missão a que se destina.
6 de Fevereiro de 1938
O facto mais importante a relatar consiste no oferecimento pelo Sr. Pe. Joaquim Manuel Nabais Caldeira de todo o mobiliário do Hospital. A sua generosidade foi ainda até ao oferecimento do material cirúrgico para a sala de operações, consultório médico, etc…
Incumbido pelo Sr. Pe. J.M.N.C. de escolher o material cirúrgico, em ocasião que tive de ir a Lisboa, escolhi nos diferentes laboratórios o material que me pareceu necessário e depois do confronto de preços e qualidades organizei relações do indispensável para sala de operações, consultórios e enfermarias, relações que entreguei ao Sr. Pe. J.M.N.C.
O custo do material escolhido orçava por uns trinta contos e essa importância foi imediatamente posta à disposição para a compra da totalidade do material. Várias reuniões entre o Sr. Sousa Martins, o Sr. Pe. J.M.N.C. e eu, e consultas a casas fornecedoras, fizeram com que se não fizesse a encomenda na ocasião o que originou maior despesa na aquisição, devido à subida de preços nesses materiaes . Feita a encomenda, os caixotes abarrotando de utensílios de toda a ordem, foram colocados na enfermaria (da esquerda) e ali com um interesse admirável o Sr. Pe.J.M.N.C. assistiu à abertura e ele próprio guardou a chave do quarto onde foram guardados.
Se todos nós, se quasi todo o concelho trabalhou para a realização de uma obra que serve para mitigar o sofrimento humano, principalmente d’aqueles que ainda depois de doentes, são pobres…nenhum de nós pode merecer uma parcela de gratidão, dos vindouros, se compararmos o pouco que demos com o que tão generosa e modestamente soube dar essa formosíssima alma de benemérito que é o Sr. Pe. Joaquim Manuel N. Caldeira. Se sabe pregar a caridade porque a sua profissão assim o manda…sabe praticá-la, porque lhe nasce do coração. Não há na dádiva um fim político, um motivo de vaidade. Perante mim, mostrou o desejo que não se soubesse da oferta, não tem ambições políticas o Sr. Pe. J.M.N.C.
Mas se contentamento pode vir de uma boa acção, esse deve senti-lo o Sr. Pe. J. porque os ferros cirúrgicos oferecidos hão-de rasgar o corpo humano à procura das lesões que matam e que estirpadas fazem voltar à vida e dão alegria de viver. Nos leitos que ofereceu hão-de os pobres encontrar o que não tinham em suas casas,… conforto para tratar o seu mal e, à sua roda, carinho consolador, admirável e sempre bem vinda medicação para os que sofrem.
Podemos dizer deste homem que fez alguma coisa pela sua geração, porque aumentou o conforto, o bem-estar e a felicidade dos que sofrem.
Só os que trabalham para o bem da humanidade têm direito à consagração de todos.
Ser bom, ser honesto, não basta, é preciso ser útil aos nossos semelhantes, com dedicação, com interesse desprovido de egoísmo.»
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«Memórias do Castelo», crónica de Romeu Bispo
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